Capítulo 17: Sombras.

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Eu acabei pegando no sono, mesmo que em um lugar desconfortável, e dormi parte da viagem. Acordei apenas quando a carroça parou em algum ponto. Olhei para Axel, vendo ele girar a safira verde entre os dedos.

—Porque paramos? —Questionei, tentando ver algo pelas frestas da lona. Podia ver que ja estava amanhecendo.

—Não sei se sabe, mas quem tá vivo precisa comer e fazer suas necessidades básicas. —Afirmou com sarcasmo e eu revirei os olhos.

—Não sei. Estou viva, mas nem sempre tinha algo pra comer ou um lugar para fazer minhas necessidades básicas. Então acho que sua frase não se encaixa pra todo mundo. —Retruquei e ele arqueou as sobrancelhas, virando o rosto sério para me encarar.

—Você é atrevida demais pro meu gosto. —Afirmou e eu soltei uma risada.

—Ainda bem que não vim ao mundo para te agradar. —Ironizei e ele estalou a língua em resposta.

—Vão descer? —Ouvi a voz masculina questionar e meu corpo se arrepiou. Me encolhi contra as caixas e vi Axel analisar minha reação com cuidado.

—Você quer alguma coisa? —Questionou e eu neguei com a cabeça. —Não está com fome?

—Não. —Menti, pois na verdade eu estava morrendo de fome. Mas não queria sair daquele lugar. Não até chegarmos na Cidade do Porto.

—Vamos ficar aqui mesmo. —Axel falou, auto o suficiente para o homem ouvir. Escutei seus passo se afastando da carroça e me ajeitei para olhar entre as frestas da lona. Pude ver que estávamos em um tipo de estalagem no meio da estrada.

—Acha que falta muito ainda? —Questionei e Axel não respondeu. Virei o rosto para olhar pra ele e me surpreendi ao ver que estava completamente sozinha ali. —Axel?

Levei um susto quando ele apareceu de novo, surgindo do meio das sombras. Ele me encarou, vendo que eu estava de olhos arregalados.

—O que você fez? —Perguntei e ele estendeu a mão pra mim, revelando uma maçã. Encarei a mão dele e depois seu rosto, vendo ele aguardar que eu a pegasse. —Onde conseguiu isso?

—Onde você acha? —Zombou. —Eu sei que está com fome. A viagem é longa e eu não quero que chegue desmaiada lá.

—Não se preocupe, estou acostumada a passar fome. —Afirmei, recusando a maçã que estava nas mãos dele. Escutei ele estalar a língua e então jogar ela no meu colo. —Você é muito arrogante.

—E você fresca demais pra quem já foi uma mendiga. —Provocou e eu segurei a maçã e a joguei em cima dele, fazendo ela bater com força na sua testa. Axel virou o rosto e passou a mão na testa, me encarando como se não acreditasse que eu havia feito aquilo. —Eu desafio você!

—A sua sorte é que eu não estou com a minha faca! —Afirmei com raiva. —Se não você levaria outra facada da mendiga aqui.

—Você certamente não teria chance de fazer isso. —Retrucou com ironia. —Eu tentei te ajudar e você só me machucou.

—Ah vai chorar, vai? —Zombei, fazendo uma voz de choro e vi os olhos cheios de fúria dele virem na minha direção. Eu sabia que talvez não deveria irritar um Portador das Sombras. Mas naquela altura da história, eu já não estava me importando com nada mais.

—Cuidado, Kayla. —Parei de sorrir quando as sombras dele tocaram a pele do meu pescoço e meu corpo se arrepiou, com a sensação que me invadiu. —Temos um caminho e tanto pela frente. Vai ter que me aguentar por muito tempo ainda.

—Tire elas daqui. —Pedi, um pouco ofegante com aquelas coisas deslizando por mim, como se estivessem fazendo carinho.

—Elas fazem parte de mim, mas tem consciência própria. Gostam de você. Não posso fazer nada em relação a isso. —Afirmou, me deixando surpresa.

—Como sabe que elas gostam de mim? —Questionei e ele suspirou, fechando os olhos e encostando a cabeça na caixa atrás dele.

—Elas costumam sussurrar coisas pra mim. Não entendo na maioria das vezes. Mas sempre que elas gostam de alguém, ficam em silêncio. E elas estão silenciosas desde o dia que você apareceu na floresta. —Explicou e eu abaixei os olhos até as sombras que agora rodeavam meu braço.

—E o que isso significa? —Indaguei, mas Axel ficou em silêncio. Engoli em seco, sentindo uma sensação diferente dentro de mim.

[...]

Desci da carroça, vendo a rua da Cidade do Porto movimentada. Muito diferente das vielas da Cidade dos Ossos. Aqui as ruas eram largas e as casas tinham um ar antigo. Haviam barraquinhas de venda por todos os lados e como eu imaginava, peixes a venda em cada canto.

Era exatamente isso que eu imaginava quando pensava em me mudar pra essa cidade. Um lugar melhor pra si viver. Olhei para Axel, quando ele parou ao meu lado e vi que as sombras dele não estavam a vista. Seu rosto estava contorcido em uma careta, como se a luz o incomodasse.

—Onde vamos agora? —Questionei e ele apontou em direção ao porto da cidade. —Vamos pegar um navio que vá até a Cidade Marítima. Melhor ficarmos longe da terra firme por enquanto. Se o príncipe queria sua ajuda pra conseguir a safira, então certamente o rei solar vai mandar gente até lá. —Axel me olhou. —Não quero correr o risco de encontrar com eles.

—Precisamos de moedas de ouro para conseguir entrar em um navio. —Falei e Axel revirou os olhos.

—Isso não é um problema pra mim. —Afirmou, começando a se afastar e não me dando alternativa a não ser segui-lo. Começando a andar no meio das pessoas na rua, vendo algumas criaturas mágicas perdidas entre elas.

—Você é rico? —Indaguei, enquanto tentava andar rápido para segui-lo, já que Axel estava praticamente correndo. —Como moedas de ouro podem não ser um problema pra você?

—Você faz perguntas demais. —Afirmou.

—E você não responde nenhuma delas. —Retruquei e ele estalou a língua. De novo ele ficou em silêncio e não respondeu minha pergunta. Cruzei os braços frustrada e vi ele abrir um sorriso, como se estivesse se divertindo com a minha irritação.

Essa seria uma longa viagem...



Continua...

Uma Conjuração de Magia / Vol. 1Where stories live. Discover now