Beleza Aprisionante - História dos Quatro Reinos

Capítulo 34

Charlotte resolveu voltar para seu quarto depois de ter conseguido se acalmar.

As palavras de Henrique ainda martelavam sua cabeça durante todo o caminho, porém ela não se arrependia nem um pouco de ter deixado as coisas claras para ele ou de ter recusado a proposta insistente de seu ex-melhor amigo.

Talvez a única coisa de que ela se arrependesse era de ter falado o que realmente sentia sobre Richard. Porém essa era uma informação necessária para que Henrique entendesse plenamente as motivações dela para preferir ficar aqui em vez de partir com ele.

Só que pensar sobre Richard ainda era doloroso e ambíguo na mente de Charlotte. Aquele homem era tão complexo que ela mal o compreendia. Ele a traíra para roubar o reino de Gelo e vingar a morte do pai, porém, agora que a tinha em suas mãos, a cada dia se tornava mais e mais gentil, e mais e mais curioso sobre o passado dela.

Por estar distraída pensando em Richard quando entrou em seu quarto, Charlotte nem se tocou de que havia alguém sentado em cima de sua cama.

No entanto, quando ateou fogo à lareira para se aquecer, as chamas amarelo-avermelhadas iluminaram o estranho a ponto de, quando o avistou com sua visão periférica, Charlotte ter um sobressalto e cair de bunda no chão.

- Ri-ri-richard? – Ela murmurou confusa, porque a pessoa iluminada tinha os mesmos cabelos castanho-avermelhados e olhos cor de mel que o rei do fogo.

Porém, a horrível cicatriz que cortava um dos olhos cor de mel do estranho fez Charlotte perceber que aquele não era Richard.

- Você é realmente a cópia cuspida e escarrada daquela vadia. Chega a ser repulsivo... – O homem comentou com olhos enojados e uma voz grave muito penetrante, cruzando os braços onde estava sentado na cama.

- Quem é você? – Charlotte perguntou num murmúrio horrorizado, tentando se levantar do chão com dificuldade e analisando as rotas de fuga até a porta que poderia usar sem passar perto da cama. Infelizmente não havia nenhuma.

- Até sua voz é parecida com a dela... – O homem disse com deboche, ignorando a pergunta de Charlotte – Como Leon tem mal gosto! E Richard também, já que está interessado nisso... – ele apontou para Charlotte com desprezo.

- Quem é você? O que você quer aqui? – Charlotte agora já estava de pé e tentou se recompor a um estado mínimo de dignidade, afinal um dia ela já havia sido uma rainha poderosa e não podia se deixar amedrontar tão facilmente por um estranho parecidíssimo com Richard, mesmo que não tivesse poderes ou armas para se proteger...

- Você é a última parte de Katherine que ainda teima em permanecer nesse mundo, tirando a atenção do meu amado de mim... – O homem disse com frieza, finalmente se levantando da cama e se aproximando da trêmula Charlotte com imponência, e ela realmente ficou amedrontada com aquela altura absurda daquele indivíduo – Mas hoje sua existência começará a ser apagada do universo por minhas mãos. Sinceramente, farei um favor a humanidade, principalmente ao meu amado e a meu filho, me livrando de você... E quero olhar em seus olhos enquanto você enfim morrer...

Charlotte nem percebeu quando levou um imenso soco no estômago que arrancou seu fôlego e a fez vomitar sangue pela boca.

Ela caiu no chão com uma imensa dificuldade de respirar, uma dor lancinante em sua barriga, como se milhares de facas afiadas estivessem a perfurando ao mesmo tempo, repetidas vezes.

O homem recitou algumas palavras em um dialeto antigo que Charlotte não compreendia muito bem e o local onde ele havia socado começou a brilhar com um tom verde do qual Charlotte já havia ouvido falar diversas vezes nos últimos dias. Quanto mais o ponto em sua barriga brilhava, mais dor Charlotte sentia, a ponto de ela começar a berrar e quase perder a consciência.

Mas antes de desmaiar, Charlotte percebeu que o homem a observava com claro desgosto no olhar.

- Ele também colocou feitiços protetores no seu corpo? Que irritante! Depois de anos de pesquisa para encontrar um feitiço forte o suficiente para transpor a regeneração absurda dessa criança... Maldito seja!

Charlotte começou a vomitar sangue por todo o chão enquanto convulsionava. Seu corpo parecia estar resistindo ao feitiço estranho conjurado sobre sua barriga, mas estranhamente só havia uma única luz verde no local. Tudo o que o homem fez foi chutar a barriga dela algumas vezes com uma brutalidade elegante muito absurda, como se quisesse descontar sua raiva em alguma coisa e ela fosse a melhor opção.

- Pode até ser que meu feitiço não funcione para te matar até amanhã como eu pretendia, como mais um dos meus presentinhos para ele além daquelas cidades dizimadas, mas é impossível que você se livre da maldição antes de se espalhar por todo o seu corpo. E quando isso acontecer, você finalmente deixará esse mundo para sempre, enfim deixando meu amado em paz para se preocupar com a própria felicidade e diversão... – O homem ajeitou o colarinho de sua roupa social e tirou um relógio do bolso para ver as horas – Esse feitiço de proteção que há em você só irá alongar seu sofrimento, mas não impedirá que você morra sabe... Se ele quiser te salvar, terá que vir pessoalmente... E ele jamais fará isso agora que todos estão em alerta pelo tal "exército misterioso", então se considere morta queridinha...

O homem encerrou com uma gargalhada e saiu andando a passos calmos daquele quarto, deixando uma inconsciente Charlotte jogada no chão próximo a lareira acesa.

No dia seguinte, quando acordou ainda no chão, Charlotte desejou de todo o coração ter alucinado tudo o que acontecera na madrugada. Contudo, uma imensa marca negra no meio de seu tórax com raízes que começavam a se espalhar por seu corpo fazia com que ela tivesse a triste certeza de que o que acontecera na noite passada não era nem de longe uma alucinação.

E o pior de tudo era que ela tinha completa certeza sobre quem era o homem que a atacou naquela madrugada...

- Não posso acreditar – Charlotte sussurrou horrorizada, baixando seu vestido de empregada para esconder a tal marca que começara a arder e se mexer como se estivesse viva, comendo sua carne e bebendo seu sangue – Albert está realmente vivo...