46 - Perseguição

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As flores carnívoras de Lilith apareciam de toda parte. Caiam em cima de nós, mordendo com bocas que, agora eu via, eram cheias de dentes. À medida que o ambiente ia ficando mais molhado e o chão lamacento, elas começaram a sumir.

Freei abruptamente, Gael quase me atropelando. Eu não precisei explicar porque eu havia parado. À nossa frente, um lagarto do tamanho de um leão, abriu duas barbatanas rajadas na lateral do pescoço e cuspiu. Uma gosma amarela acertou um tronco quando nos esquivamos. A madeira chiou, soltando fumaça. A gosma escorreu, pingando e derretendo as plantas em que tocava.

Gael me puxou, agora correndo à minha frente, me arrastando pelo braço. O bicho nos caçava, bradando enfurecidamente.

— Ele é... mais rápido... que a gente. — consegui dizer entre golfadas de ar.

O chão era pura lama. O bicho só parava de rugir para regurgitar ácido. Eu ouvia o chiado das plantas sendo dissolvidas. O fedor de enxofre voltou. Muito forte. Podre.

Fizemos uma curva fechada. O lagarto passou chiando. Gael arrancou uma planta roxa e despejou o líquido pútrido esverdeado sobre mim. Eu teria vomitado se não estivesse com tanto medo de morrer. Ele se banhou também e envolveu o meu corpo protetoramente com os braços. Ficamos imóveis.

O bicho voltou, farejando o chão em nosso rastro, seguindo direto até nós. Gael colocou a mão sobre minha boca e nariz, me impedindo de respirar. A criatura chegou perto. Perto demais. Eu preferi fechar os olhos. Gael me apertava, tentando impedir o chacoalhar do meu corpo. O bicho inspirou sobre o meu rosto e espirrou.

O cheiro pode do enxofre nos camuflou, então seus passos se afastaram. Eu abri os olhos temerosamente. Gael liberou minha respiração. O bicho ainda tentava encontrar nosso rastro para seguir.

Com uma agilidade incrível, Gael sacou o machado e a lâmina cortante do objeto se cravou com tudo nas costelas do lagarto. Com o cabo do machado sendo usado como alavanca e o auxílio de um pontapé vigoroso, Gael tombou o bicho de barriga para cima. O réptil guinchou e se contorceu. A ponta da espada encravando o pescoço na terra, silenciando o animal.

Um farfalhar e grasnados vieram de dentro da vegetação.

— Vamos embora. — falou com os olhos seguindo a direção dos sons e passou o machado para mim.

Seguimos, vigilantes e atentos ao nosso redor, cientes de que estávamos sendo seguidos. Ou eu deveria dizer perseguidos? Mas porque não estava atacando?

Se alguma coisa ia atacar a gente, que atacasse logo! Aquela ansiedade estava me assustando ainda mais!

À minha frente, saindo de trás de uma árvore, um lagarto bípede com uma esfera pontiaguda na cauda me encarou nos olhos. Mais um se mostrando visível alguns metros à frente. Três grasnados vindos de direções distintas atrás de mim e o grupo só estava aumentando. Retiro o que eu disse sobre ser atacada, prefiro a ansiedade.

Eu não sou uma guerreira, sou uma bailarina! Porque não trouxemos armas de verdade?! Pistolas, metralhadoras e granadas! Não, a gente tinha que lutar com facas! Aquilo era ridículo!

Os animais à frente avançaram sobre mim. Os sons de luta atrás me disseram que eu teria de me virar. O machado seguro com firmeza em minhas mãos suadas, golpeou a cabeça reptiliana num movimento lateral. O lagarto foi ao chão, mas não morreu.

Uma espada decepou uma cabeça antes que eu perdesse a minha. Gael acertou outro que se aproximou pela esquerda. O animal que eu tinha acertado no olho atacou de novo. Dessa vez acertei o pescoço. Ele caiu sangrando, mas outro já estava vindo tomar seu lugar. Descobri que sou muito melhor fugindo do que lutando.

Alma?! Onde você vai?

Quando dei por mim, estava correndo a toda velocidade. A criatura me puxou por trás e me arremessou. Eu caí rolando, a arma indo parar a alguns passos. Consegui me espichar e pegá-la num reflexo, me virando bem a tempo de colocá-la à minha frente. O réptil fechou a mandíbula sobre o machado.

Alma?! — ouvi o grito desesperado do Gael.

O machado tinha uma lâmina curvada em meia lua. Com a força da mordida do lagarto, a arma ficou espetada no céu da boca. O bicho sacudia a cabeça tentando soltar o objeto. Consegui me levantar, mas isso chamou sua atenção.

Num movimento veloz e circular ele brandiu a bola espinhosa contra mim. Me atirei ao chão. A cauda passou direto. A sombra daquele corpo se assomando foi tudo o que consegui ver antes de seu peso desabar com a boca aberta sobre mim. Gritei como nunca antes na vida. O peso do bicho me prendeu ao chão. Mas não estava me mordendo, nem me cortando com as garras. Mesmo assim eu continuei gritando, tentando desesperadamente me desvencilhar dele.

Gael puxou o corpo inerte, retirando dele uma espada coberta de sangue. Eu me levantei depressa e o caçador partiu para cima de mim como um touro enfurecido. Com o rosto a centímetros do meu ele não estava gritando, ele estava berrando!

— NUNCA, MAIS, FAÇA, ISSO! NUNCA MAIS!

— Desculpe.

— O que estava pensando?! Fugir para o meio do mato sozinha?! Que ideia excelente! Eu a chamei milhares de vezes e você não me respondeu! Eu não sabia onde você estava! Quase fiquei maluco!

A raiva cedendo dentro dos olhos de esmeralda e luz do sol. Ele me apertou com força contra seu peito, passando os braços sobre meus ombros. Eu o abracei de volta.

— Você fica perto de mim. Entendeu?

Assenti. Ele me deu um beijo, terno e gentil. A boca dele tinha um gosto tão bom e tão familiar. Parecia que tinha sido há séculos.

— Vem, vamos sair desse lugarzinho miserável. — Gael aumentou o tom de voz, como se estivesse falando para o mato e rosnou numa carranca: — Estou cansado e de mau-humor! E eu juro que vou comer a próxima coisa que tentar me morder!

 — Gael aumentou o tom de voz, como se estivesse falando para o mato e rosnou numa carranca: — Estou cansado e de mau-humor! E eu juro que vou comer a próxima coisa que tentar me morder!

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Olá a todos!

Já estão se preparando para o final dessa aventura? Semana que vem chegaremos, finalmente, até as brumas!

Espero que gostem! Nos vemos por lá, bjos.

Doce Pecado | 1Where stories live. Discover now