24 - O coração do caçador - Parte II

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Gael me explicou como os guardiões eram uma ameaça à existência do mundo natural. E a única forma de fechar o portal era através da morte de toda a linhagem guardiã.

Assassino. Gael Ávila tinha sido moldado para ser um assassino.

Ele me contou sobre o ódio ao qual cada caçador era ensinado a sentir. Eles eram ensinados a desprezar tanto a raça humana, como aos guardiões, pelo perigo que representavam.

Ele me falou como aprendeu que a única coisa importante para um caçador era a lealdade ao mundo natural. Protegê-lo, só isso importava. O propósito de todos os caçadores era assassinar uma linhagem inteira.

— Quando tudo o que você conhece é a lealdade ao ódio, isso se torna a sua verdade. — ele sussurrou.

Tudo o que ele já tinha feito, tinha feito acreditando que era o certo.

— Você não parece ser assim.

— Não pareço hoje. — ele sorriu triste e acariciou o meu rosto. — Eu conheci você. E isso mudou tudo. Você me mostrou outra verdade. Os humanos não são como eu pensava que seriam. Alguns realmente não prestem, como o seu amiguinho, John! — puro desprezo! — Mas a maioria vale a pena. E eu não sabia disso até encontrar você.

— Não é desse começo que eu me lembro. Você não gostava de mim!

— Bom... — ele passou a mão no cabelo e sorriu culpado. — Eu não sabia como reagir às sensações que você provocava. E isso me irritou. Quando eu vim para cá estava seguindo o rastro de um guardião, mas desde que pus os olhos em você... eu me distraí. Foi a primeira vez que não prestei atenção no que deveria, e sim no que eu queria. Eu me senti fraco. Isso me deixou com raiva. Eu estava sendo derrotado por aquela garota linda que enfeitiçava cada um dos meus sentidos. — ele franziu o cenho. — Mas que merda era aquela que estava acontecendo comigo? Eu me senti covarde, negando o meu próprio povo. Por que eu não podia simplesmente deixar você para trás? Eu precisava ver você. Ouvir você. Tocar em você, eu... adoro o seu cheiro, sabia?

Neguei debilmente, inebriada.

— Você tem cheiro de flor lavada na chuva. — ele baixou a cabeça e riu para si mesmo. — Eu queria saber... — me olhou por entre os cílios —, qual era o seu gosto.

Senti as bochechas corando e ele sorriu mais com esse efeito.

— E esse querer era... — ele procurou a definição certa. — completamente inadequado. Quanto mais eu tentava seguir em frente mais curioso eu ficava a seu respeito. Você se recusava a sair da minha cabeça, puella (menina). Eu me sentia um traidor, cada vez que via você passar. Tinha feito de você o motivo do meu amanhecer e você tinha se feito a minha agonia. Eu era culpado por querê-la, ciente de que jamais poderia tê-la. — Gael inspirou o ar ruidosamente. — E aí depois apenas... me deixei cair. Derrotado. Estava quebrando a promessa que fiz ao povo natural de protegê-lo, mas eu não podia simplesmente contar tudo a você. O que pensaria de mim? Se eu dissesse qualquer coisa... iria perdê-la. Então escolhi me calar. Sou fraco e covarde.

Palavras fortes para descrever a si mesmo.

— Foi a primeira vez que me senti culpado do sangue que carrego nas mãos. As pessoas se tornaram pessoas para mim. Então tudo o que aprendi... pareceu errado.

E o meu coração sangrou com a tristeza escrachada que vi no rosto dele.

— Nunca vou me perdoar. Nunca. Foi aí que percebi que eu era um monstro. Mas em casa me diziam que eu era um herói. E eu costumava acreditar. Eu não queria mais fazer aquilo. Queria pensar com a minha própria cabeça, tomar minhas próprias decisões. Eu queria viver. — ele riu debochadamente. — Eu queria ser um deles, um humano! Que irônico. Eu queria ser o que já tinha desprezado. Eu queria ser alguém com escolhas, alguém com futuro, alguém livre. — Gael pigarreou antes de continuar. — Isso me levou a um impasse. Ou eu assumia a minha responsabilidade e fazia o que me ensinaram ser o certo, ou me rebelava, virando as costas tudo que um dia jurei proteger.

Ele pegou o meu copo abandonado ainda pela metade, analisando o meu semblante.

— Como ainda estou sentado aqui com você... já sabe o que escolhi. — encerrou.

A minha cabeça girava. Um emaranhado grande demais de informações para digerir. Sentimentos para organizar.

— Isso faz de você um traidor. O que acontece agora? — perguntei.

— Eu não sei, Alma. Estou correndo o risco e pagando para ver.

Aquilo era tão errado. Matar aquelas pessoas era completamente errado, mas permitir que o mundo natural continuasse vulnerável também era. Naquela história não existiam violões, apenas medo e sobrevivência.

Os descendentes dos guardiões tinham o direito de viver, mas os naturais também tinham o direito de fechar aquele maldito portal. Se ao menos houvesse outra forma de fazer isso...

— Agora eu tenho uma pergunta para você. — Gael me observou com cuidado, tinha me mostrado tudo o que carregava na alma, era a minha vez de esclarecer as suas dúvidas. — Você é capaz de perdoar o meu passado?

Eu disse para vocês que escolheria o que eu precisava para sobreviver.

— Ainda estou sentada aqui com você, então... — os cantos da minha boca se curvaram de forma involuntária em um sorriso.

— Eu não mereço você. — e dava para ver como realmente acreditava nisso.

E assim ele me mostrou o coração do caçador. Gael não mentiu para mim. Ele realmente me contou a sua história e foi verdadeiro em tudo o que disse, ele só esqueceu de mencionar o detalhe sobre mim mesma que eu ainda não sabia. Ele só omitiu o pequeno grande detalhe de que era eu a guardiã que ele tinha ido matar.

 Ele só omitiu o pequeno grande detalhe de que era eu a guardiã que ele tinha ido matar

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Olá a todos! 

Que detalhe pequeno ele esqueceu de mencionar, não?! kkkkkkk Ai, vai dar m...

Bjos e ate mais!

Doce Pecado | 1Onde as histórias ganham vida. Descobre agora