DE AMIGO PARA NAMORADO - Desc...

Par BobbyEliot

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Aviso: Esse livro contém nudez, linguagem imprópria e cenas explicitamente sexuais não recomendada para menor... Plus

Livro de Rostos
Capítulo 1 - Negação
Capítulo 2 - Raiva
Capítulo 3 - Medo
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40 - Parte 1
Capítulo 40 - Parte 2
Pós Créditos
Entrevista
Talk Show
O (Tal do) Talk Show
Aviso

Introdução

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Par BobbyEliot

Eu não sei por onde começar, e nem sei o que dizer, por isso vai ser escrevendo mesmo que eu contarei como tudo aconteceu.

Há bastante tempo atrás.

Sou ruim com datas, me julguem.

Fui uma criança planejada, meus pais eram jovens quando se casaram, viviam bem e felizes, mas achavam que a casa estava muito vazia então decidiram que ter um bebê, para alegria dos meus avôs, e assim três meses depois do aniversário de quatro anos de casamento deles eu começava a crescer na barriga da minha mãe.

Cresci em meio a muito amor, carinho e afeto. Meu pai me ensinou a andar e minha mãe a falar, a primeira palavra que eu disse foi fome. Fui pra creche e não chorei no primeiro dia de aula, mas minha mãe e meus avós sim, muito.

Minha avó dizia que eu era uma criança especial e ainda traria muita alegria aquela família, só sei que eu aprontava muito, jogava todas as chupetas no quintal, abria a mamadeira e jogava o leite pela casa e meu esporte favorito era tirar a fralda e sair correndo pela casa.

Baby nudes, quem nunca?

Quando fiz seis anos meus pais resolveram que nos mudaríamos para um apartamento e lá passou a ser o nosso cantinho, estudei no mesmo colégio até ir para o ensino fundamental dois, depois troquei de escola.

No início daquele ano o filho do vizinho do andar debaixo foi morar com ele, Filipe.

Na época ele tinha onze anos de idade, como estávamos de férias fizemos amizade fácil, surpresa maior foi ele estarmos estudando na mesma escola e na mesma turma, fez o meu medo do "primeiro dia de aula numa escola nova" sumir.

E se formou aquela dupla. Nós éramos inseparáveis e estávamos sempre juntos, nos trabalhos, nos projetos e nas festas. Nessa época como estávamos mocinhos e brincávamos muito, lembro que Filipe ia a minha casa quase todo dia no final da tarde pra brincar.

- Filipe seu pai está aqui para te buscar - Minha mãe falou carinhosamente.

Estávamos os dois no chão jogando um jogo de corrida, embora Filipe fosse meu amigo e gostasse da maioria das coisas que eu gostava ele detestava jogo de futebol, então sempre acabávamos em algum game de corrida, luta, guerra ou qualquer outra coisa.

- Já vamos - Eu e ele respondemos juntos.

Minha mãe apenas riu e voltou para a sala, sabia muito bem como aquela cena terminaria porque nós sempre fazíamos a mesma coisa.

- Eduardo, acho melhor eu ir - Filipe falou preocupado.

- Seu pai não vai vir aqui, fica calmo, talvez ele desista e vá embora - Falei tentando ser convincente.

Alguns minutos se passaram.

- Filho se eu tiver que te chamar mais uma vez você não vem mais - O pai de Filipe falou com aquela voz meio grave.

Largamos o controle do vídeo game ao mesmo tempo.

- Tchau! - Filipe falou e se levantou.

- Tchau! - Falei com os olhos arregalados com o medo da hipótese dele não voltar. Mas uma coisa que eu aprendi é que o Filipe sempre voltava.

Depois de um tempo passamos a fazer os trabalhos de casa juntos, ele não gostava de matemática porque não lidava muito bem com as regras da matéria, mas quando se falava de história, geografia, ciências e arte Filipe se tornava um expert, gravava todas as datas e sabia a capital de todos os estados brasileiros além de possuir um verdadeiro fascínio por cobras e latas de tinta.

Naquele ano descobri que Filipe era inteligente e passei a admirá-lo por isso, mas ele não precisava saber né.

No ano sétimo uma menina passou a integrar nossa turma e se juntou á nossa dupla transformando-a num trio. Filipe tinha mania de dar apelido para as pessoas e nossa nova amiga virou Ritinha, que estava sempre de óculos e com seus longos cabelos negros soltos, sua mãe era daquelas super preocupadas e protetoras, mas depois que nossa nova amiga passou a andar conosco a mãe se tranquilizou um pouco. Eu e Filipe ainda vivíamos juntos para cima e para baixo, talvez até colados demais, mas diziam que era normal aos doze anos.

Se tornaram comuns as idas do meu amigo a minha casa aos fins de semana para jogar videogame, durava a tarde toda e só acabava no início da noite. Nesse ano  cresci um pouco em relação á Felipe, então passei a tirar sarro da cara dele por ser maior - o que na verdade eram apenas alguns poucos centímetros.

Descobri que o pai do meu amigo tinha um nome, era Allan, que naquele ano fez uma pequena comemoração no aniversário do filho em seu apartamento. De amigos do Filipe só havia eu e Ritinha, mas nós demos um jeito de nos divertir muito e naquela noite estava tudo liberado poderíamos fazer o que quiséssemos, pulamos, rimos, brincamos de correr pelo apartamento e todos nós tivemos dor de barriga no dia seguinte devido ao excesso de brigadeiro.

- Edu, Edu, quer comer bolo e doce lá em casa? - Filipe perguntou eufórico parado na porta do meu apartamento.

- Minha mãe vai me matar, e seu pai também - Falei já rindo da ideia dele.

- E daí? Já teremos comido mesmo - Meu amigo falou ajeitando a blusa de mangas longas.

Ele disse de uma forma que me fez ver que o castigo não ia ser tão ruim, que iria valer à pena ouvir as palavras chatas que meu pai falaria ou o gosto horrível do remédio para diminuir as idas ao banheiro, tinha algo nos olhos dele que me fazia acreditar cegamente em tudo que ele dizia.

- Tá bom, vamos - Falei pegando a chave e batendo a porta.

Pela primeira vez nós ficamos em recuperação, foi difícil e o pai de Filipe não nos deu trégua, disse que se nós brincamos e nos divertimos juntos agora passaríamos horas do dia estudando pra passar na prova. E assim foi, Filipe era bom na maioria das coisas que ele fazia e quando era desafiado ou questionado tornava-se incrivelmente melhor.

Naquele ano entrei para o time sub-14 na escolinha de futebol, era muito importante para mim porque agora os jogos não eram tão chatos e parados como nas categorias anteriores e eu tinha deixado de ser zagueiro - defesa - para ser ponta - atacante lateral -, o que me deixava muito feliz. Mesmo Filipe detestando futebol ele me ouvia falar o dia todo sobre o esporte e até dava palpite sobre minhas chuteiras.

- Falei com meu pai que seus pais não vão poder ir ao primeiro jogo do seu campeonato - Filipe comentou.

- Pois é cara, meus avós também não poderão ir, eles são apresentadores do bingo anual do bairro - Falei e ele morreu de rir, Filipe tinha algumas manias de gente velha e bingo era uma delas. Sério ele amava um bingo!

- Bingo - Ele repetia a palavra enquanto gargalhava - Mas sério - Falou mais sossegado - Eu vou, pedi ao meu pai e ele vai me levar, mas espero que você ganhe seu perna-de-pau.

- Caramba, sério? Mano que bom isso, você vai ver, vou marcar dois gols - Falei rindo para ele - Obrigado - Ele balançou a cabeça na afirmativa, passei meu braço pelo ombro dele e fomos andando pelo corredor da escola.

E não é que ele apareceu mesmo? Foi muito bom, meu time venceu de quatro a um e consegui fazer os dois gols, Filipe saiu praticamente sem voz da arquibancada de tanto gritar, aquilo me empolgou muito, naquele dia eu não tinha mãe nem pai para torcerem por mim como a maioria dos outros jogadores, contudo eu tinha um amigo!

Em outubro foi meu aniversário e mesmo com a presença dos meus primos, colegas do futebol e da escola eu só queria brincar e zoar com Filipe e Ritinha, a festa aconteceu na casa dos meus avós, foi muito boa, e depois de muita insistência e pedidos Allan deixou Filipe dormir na casa dos meus avós, foi divertidíssimo passar a noite com ele e acreditem nós ficamos jogando vídeo game até as quatro da manhã e o que era pra ser apenas uma noite se estendeu por todo o final de semana.

Naquele ano aprendi que Filipe era muito persistente e que a companhia dele era a melhor de todas.

Janeiro iniciou e eu percebi que nossas vidas mudariam, um turbilhão de emoções aconteceria ao longo dos doze meses, senti que seria assim, pois aquele ano começou diferente de todo os outros. Agora eu e Filipe podíamos brincar na rua em que meus avós moravam, nossos pais permitiram desde que fossemos e voltássemos juntos.

Na escola iríamos encarar o oitavo ano, as brincadeira passavam a ser diferentes, os assuntos, as roupas e as atividades também, as meninas não ficavam tão longe como antes, agora queríamos elas bem perto. Eu me sentia meio alienígena porque o Filipe sempre foi de ter muitas meninas perto dele.

- Cara, é esconde-esconde e a Fran pediu para eu me esconder com ela - Falei tremendo mais que ônibus em quebra-molas.

- Você sabe muito bem o que vai acontecer né? - Ele me falou com aqueles olhos grandes levemente amendoados.

- Não, eu sei que estou nervoso porque todo menino quando se esconde com uma menina volta todo bobo e nunca conta o que aconteceu - Falei na minha típica lerdeza.

- É porque eles beijam as meninas
Quando elas chamam um menino é porque querem beijá-lo, mas eles não podem contar depois - Ele falou tranquilamente.

- Como você sabe disso? - Perguntei surpreso.

- Elas me contaram e a Ritinha confirmou - Filipe respondeu - Se ajeita, olha está todo torto, da um jeito nesse cabelo - Falou enquanto me endireitava - Vai lá e boa sorte.

Naquele dia eu dei meu primeiro beijo, tinha treze anos e estava me sentindo o cara mais poderoso do mundo, dali pra frente eu só queria falar daquilo, reparava no corpo das meninas, conversava sacanagem, ficava dando cantada nelas e Filipe sempre ao meu lado, me dando força, ele tinha um jeito de fazer qualquer pessoa se sentir bem.

Não sei o que houve direito, mas teve um período que o Filipe ficava muito aéreo, era como se tivesse congelado,  não olhava para nada apenas parava a cabeça e ficava parado fitando algo, mas era como se não visse, como se fosse cego e também me lembro dele tirar muitas notas baixas.

- Ta tudo bem cara? - Perguntei aleatoriamente.

- Está sim, só preciso tomar alguma coisa - Filipe falou sentado no banco enquanto os outros alunos lotavam o pátio no recreio.

- Tipo o que? Água, suco? - Perguntei pensando que era sede.

- Um tiro -  Falou e começou a rir.

- Você é o melhor cara, tem que ser comediante - Respondi enquanto ria.

No meio do ano as coisas lá em casa ficaram apertadas e tivemos que fazer umas economias, meu pai decidiu que eu era grandinho e poderia ir e voltar pra escola sem o transporte, então eu passei a fazer o mesmo caminho que Filipe fazia, eu nunca conseguiria fazer aquilo sozinho, não sei como ele aprendeu, ele já ia e voltava sozinho há dois anos.

- Filipe você é "BV"? - Perguntei enquanto caminhávamos para a escola.

- O que é isso? - Indagou.

- Boca virgem, quem nunca beijou - Respondi.

- Sou sim - Falou com a tranquilidade de sempre.

- Como você consegue Filipe? Beijar é bom é uma delícia! Nossa você não imagina o quanto e desde aquele dia nas férias no início do ano eu já beijei três garotas diferentes - Falei eufórico com o peito estufado.

- Que bom Edu, estou bem tranquilo, quando eu tiver que beijar vai acontecer e você sabe o que eu quero né? - Ele falou rindo.

- O seu plano louco de mil novecentos e cinquenta? - Perguntei e ele balançou a cabeça na afirmativa, depois me deu um soco leve no ombro - Beijar depois de namorar, você é muito sonhador mesmo!

Naquele ano Filipe entrou numa espécie de escola de Arte, lá ele tinha aulas de teatro, música e dança. De tudo que ele fazia dançar era o que mais gostava e olha que eu sempre zoei ele por não ter ritmo nenhum, mas até que ele tinha molejo, fazia dança clássica e algumas outras também.

Quando o pessoal da nossa escola ficou sabendo acharam bem diferente, mas Filipe tratava aquilo como uma coisa tão comum que ninguém falava nada, no Festival de Cultura ele ajudou a montar a coreografia de quase todas as turmas do ensino fundamental, mas quando mostrou a apresentação de uma música que ele ia dançar sozinho pra professora de Educação Física ela vetou, todos sabiam que era inveja porque as coreografias que ele havia criado para as turmas eram incrivelmente melhores que as dela.

- Eu prometo que só me apresento novamente quando tiver quinze anos e estiver no ensino médio! - Filipe falou com aquele olhar vago e voz firme.

Ele disse isso no dia que a mulher vetou sua dança, mas no dia da apresentação ele estava lá para dar apoio á todas as turmas que havia coreografado.

- Tem certeza que não vai se apresentar conosco? - Perguntei antes de subir ao palco.

- Eu não vou, já sei que o terceiro ano vai ganhar mesmo, eles sempre ganham, e prometi que não ia dançar na escola - Filipe falou na maior naturalidade.

- Você anda tão pensativo cara - Eu disse quase depois de um ano inteiro de observação.

- Do que adianta ser o melhor nas apresentações e nas danças se não tem ninguém pra me ver? Meu pai está sempre na casa de algum amigo ou com alguma mulher e minha mãe - Ele bufou e abaixou à cabeça - Ela disse essa semana que não poderá vir na minha formatura ano que vem, acredita? Ela nunca pode nada porque está passado temporada em Tókio, Londres, França ou qualquer outro lugar.

O abracei e ele correspondeu, eu não sabia se Filipe só tinha quatorze anos como a maioria dos alunos da nossa turma, ele falava de coisas do futuro, faculdade, países e poetas, tinha muita amizade com a galera do ensino médio e se ele realmente tinha a mesma idade que eu era o pré-adolescente mais precoce que já vi.

Idiota como sempre eu subi para o palco e nem conversei com ele, a verdade é que Filipe sempre foi mais que um amigo para mim, ele era um irmão e fazia aquilo tão bem e tão natural que eu nem sabia como corresponder.

Naquele ano aprendi que Filipe era o meu melhor amigo!

Enfim chegou o tão esperado nono ano e nossa alegria não tinha tamanho, até que começaram as aulas de matemática e geometria, eu sinceramente não sei como Filipe passou na matéria, porque ele nunca copiava uma equação, durante essas aulas ele só desenhava.

A coisa ficou tensa quando um grupinho da sala começou a implicar com ele, eu não sabia bem o porquê, só sei que um dia eles começaram a brigar com o Filipe, Ritinha estava quase chorando e eu já estava possesso, só sei que um deles chamou a mãe do meu melhor amigo de: A mulher fantasma.

Eu sabia que aquilo o deixaria sem forças para dizer mais nada e depois só me lembro de ver o menino no chão e eu em cima dele, dando socos na cara meio, puxava-o pela gola da camisa e falava várias coisas para ele.

Só vi quando o inspetor veio e me tirou de cima dele, fui levado até coordenação. Eu não sei que língua era aquela que o Filipe tinha, mas sempre conseguia tudo o que queria dentro da escola, inclusive que eu não fosse suspenso e nem advertido.

- Você foi muito corajoso, obrigado - Falou meu melhor amigo.

- Eu? Você que tem coragem pra tudo, parece até que é dono das coisas - Falei e rimos.

Naquele ano comecei a namorar uma menina, Filipe não foi com a cara dela e isso acabou nos distanciando. Eu andava com ela e com seus amiguinhos, que eram amigos do garoto que eu havia batido na sala de aula.

Meu estilo mudou, estava mais reservado, meu rendimento caiu, matei aula algumas vezes, mentia para os meus pais, falava palavrão, tirava sarro das turmas inferiores e até arrumava briga com os garotos das escolas públicas.

Fazia tudo isso com todo mundo, menos com Filipe e Ritinha. Com ele era ainda pior porque ninguém tinha habilidade de interpretar o meu olhar daquela forma, eu não tinha mais coragem de olhar nos olhos dele.

- Você vai ficar até quando nessa sacanagem em? - Filipe falou me empurrando contra a parede do pequeno banheiro do terceiro andar.

- Ta louco, esse banheiro é individual, se alguém ver nós dois saindo juntos vai pensar besteira - Falei preocupado.

- Ninguém vai pensa nada, não se ouvirem o que eu tenho pra te dizer, primeiro que ser gay não tem a ver com besteira, besteira é o que você está fazendo - Começou ele.

- Filipe calma, eu não estou fazendo nada demais - Falei naturalmente.

- Nada demais? Você está faltando aula, se falta aula você não aprende, se não aprende não vai arrumar trabalho e se não arrumar trabalho não terá dinheiro aí sem dinheiro você vai roubar - Arregalei meus olhos - Se você rouba você mata, se você mata você mente e eu não estou aqui pra ir visitar amigo na cadeia por ser ladrão assassino mentiroso - Ele falou com os olhos cheios de lágrimas.

- Filipe - Pedi já impactado por suas palavras.

- Pensa bem o que você está fazendo com a sua vida! - Ele falou e saiu do banheiro.

Levaram algumas semanas, mas eu passei a andar menos com a galera barra pesada, não zoava mais as pessoas, falava menos palavrão e minha namorada me largou porque disse que eu era muito frouxo. Eu preferia ser um frouxo honesto e decente do que acabar na cadeia.

- Posso sentar aqui? - Perguntei olhando para Ritinha e Filipe.

- A mesa da gang de New York foi fechada pra perícia? - Ritinha falou me olhando com seus óculos.

- Não, é que um dos delinquentes pulou fora - Falei sentando a mesa e olhando pra Filipe.

- É bom ter você aqui de novo - Ele falou sorrindo.

Lembro que o irmão mais velho de Filipe era lutador, não morava com ele porque vivia competindo, mas sempre que estava de férias ou com bastante tempo livre aparecia para ficar uns dias com o pai é o irmão.

Foi num dia que teve reunião de pais e mestres, o irmão do Filipe que compareceu, nesse dia Ritinha o viu e disse que ele era o amor da vida dela.

- Filipe o seu irmão, é ele que eu quero, preciso dele!

- Ritinha o Rodrigo é lutador! - Filipe falou com um sorriso.

- Imagina a pegada! - Ela disse quase delirando - Lipe você é bonito amigo, olhos castanhos claros, esses cachos na cabeça, é magrinho e alto. Mas o seu irmão é o oposto, baixo, socado, barba, careca e forte.

- Até eu já entendi - Falei e todos nós rimos.

Eu e Filipe passamos a sair sempre juntos, ás vezes eram nos passeios da escola, outras marcávamos na sorveteria com a galera, íamos juntos ao cinema, pizzaria e aos mais variados lugares. Eu adorava ir aos churrascos dos amigos do Allan e o Filipe sempre gostava quando meus pais o convidavam para ir nos meus avós.

Outra coisa bem comum no nono ano são as festas de quinze anos ou baile de debutante - acho que é assim que se chama - pra vocês terem dimensão da quantidade de amigas que o Filipe tinha só de convites da escola ele recebeu nove e eu quatro, nem fazia questão, eu ia mais pra dizer não fazer desfeita, beber energético e conhecer mais meninas.

Filipe sempre era o rei da pista de dança, fazia amizade com todas as pessoas das festas, cumprimentava desde os recepcionistas até as bisavós das aniversariantes, era quase um Mister Simpatia, sempre teve "alma de artista".

No fim daquele ano tivemos nossa formatura, foi bem bonita e animada, as três turmas de nono ano se formaram no fim de dezembro, acabando com aquela agonia de estar no ensino fundamental nos levando a elite da escola, o ensino médio.

Ah se eu soubesse!

Naquele ano descobri que Filipe era um irmão para mim!

Entramos no ensino médio juntos aí o inferno todo começou a ser anunciado, quatro turmas, simulado, material de apoio, material didático incluso com preparatório e apenas vinte minutos de intervalo.

Bem vindos ao Purgatório!

Mas até que consegui resistir bem, aliás, todos nós, nosso barco poderia até balançar, mas não afundava, pois  nos últimos três anos Filipe era representante de turma e nos cobrava como uma mãe cobra os filhos, nossa turma sempre ganhava aqueles prêmios no fim do ano, era elogiada pelos professores e escolhida para carregar as bandeiras nos desfiles cívicos.

- Meu padrinho conhece o técnico do time de vôlei que vai jogar no estádio esse fim de semana, ta a fim de ir? - Filipe perguntou.

- Claro, mas então eu compro as coisas pra gente comer - Falei e ele revirou os olhos, aquilo significava para eu calar a boca, anos de amizade nos ensinam isso.

No carnaval eu e Filipe íamos para as festinhas de rua, eu gostava mesmo era de ir para a avenida na orla da praia, tinham vários shows e muitas meninas lindas, sortudo como só eu era sempre conseguia ficar com várias garotas, já o meu amigo ia para comer, pense em alguém que come, bebe e dança a noite toda, esse é Filipe.

Em alguns feriados aproveitávamos para ir ao clube juntos, eu que era associado por treinar futebol, mas de tanto fazer apresentações artísticas lá e de tanta gente que ele conhecia Filipe sempre entrava sem ser sócio, aliás, ele era a única pessoa a ter um crachá de "visitante exclusivo".

- Quer ir ao cinema? - Perguntei a ele que tomava sol na cadeira de praia.

- Estou sem dinheiro Edu, nem tem como - Filipe falou olhando a paisagem do clube.

- Eu pago, a entrada - Falei de dentro da piscina enquanto ajeitava meus negros cabelos - Tu já nasceu com essa pele bronzeada e vai ficar no sol? Ah não vai não sai daí e deixa o branco aqui pegar cor - Falei saindo da piscina enquanto ele dava muitas risadas.

Passou uma semana e nós fomos ao cinema, assistir um filme de ação que eu estava super empolgado para ver.

- Aqui está o seu bilhete e do seu namorado - A jovem senhora falou sorrindo.

- Obrigado, mas somos amigos - Respondi pegando os ingressos.

Quando olhei para Filipe ele não sabia onde enfiar a cara então nós começamos a rir, rimos na fila da sala de cinema, rimos enquanto estávamos entrando na sala  e ficamos rindo um pouco na poltrona.

- Cara a moça pensou que a gente era um casal - Falei achando graça.

- A gente é amigo há tanto tempo que muita gente deve pensar isso mesmo - Filipe respondeu.

- Verdade, é que a gente é muito brother - Falamos fazendo um cumprimento com as mãos.

O tempo passou e pasmem, Filipe conseguiu o que ele queria, começou a namorar uma menina na quinta-feira e só a beijou no domingo, eu zoei ele por só ter pedido o "BV" com dezesseis anos, não sei porque, mas o romance não durou muito.

- Cara acabou? - Perguntei quando encontrei com ele na saída do prédio.

- Sim, não dava mais, foram dois meses, bons até - Ele falou enquanto ajeitava a mochila nas costas.

- Mas por quê? - Perguntei sem o mínimo de sutileza.

- Porque não é justo eu ficar com uma pessoa quando na verdade gosto de outra, eu sabia disso desde o primeiro beijo que eu ela demos.

- Pelo menos ela te deixou com boa fama, as meninas que são amigas dela comentaram que você beija muito bem - Eu falei.

- Sabe que eu estudo muito e vejo muito filme né - Meu amigo falou e rimos.

No fim do ano Filipe foi ficando mais calado, quase não ria ou brincava, mas estava sempre com aquela cara de encantado, só o via assim quando falava de dança, agora ele estava numa turma mais avançada da escola artística então sempre me dizia que estava sem tempo.

O meu contato maior com Filipe era nos ensaios para a apresentação da Festa de cultura e ele não me dava muita atenção, sempre disse que nunca ia me dar atenção nos ensaios pra ninguém dizer que era favoritismo, também reparei que ele estava emagrecendo.

Eu detestava admitir mais ele estava um ou dois centímetros maior que eu, mas ao perceber isso tratei de intensificar meus treinos na academia pra ficar forte e a diferença de estatura não ser evidente.

- Eu vou jogar a final do campeonato anual sub-17, minha mãe vai estar na agência bancária e meu pai não conseguiu trocar o horário e nem folgar,  posso passar na tua casa depois do jogo e quem sabe a gente toma um sorvete, o que acha?

Filipe colocou a mão no meu ombro, me olhou e disse:

- Eu vou no jogo -  Sorri - E mesmo sabendo que seu time não está legal, mas vou torcer como se já fossem os campões.

Meu rosto se iluminou, o abracei e depois lhe ergui no ar, aquele cara era muito importante para mim, me acompanhou nos períodos mais importantes da minha vida.

E com a pontualidade inglesa que Filipe possuía ele estava lá meia hora antes da partida começar. Eu queria ficar conversando com ele, mas o próprio insistiu para eu ficar com o time e no fundo eu sabia que como sempre ele estava certo.

Meu time perdeu de um a zero, foi difícil, porém já sabíamos que aquilo iria acontecer, nossa campanha foi bem árdua e chegar à final já era uma vitória, no fim da partida Filipe me abraçou e falou um monte de coisas motivadoras que fiz questão de repetir para o time quando estávamos no vestiário. Quando saí do vestiário Filipe já tinha ido embora.

Fui até o apartamento dele. Nem lembro o que conversamos no curto caminho entre a porta e seu quarto, sei que ele estava chorando muito, sofrendo, eu não sabia o porquê, o via distante, emagrecendo discretamente, mas eu o conhecia então era fácil notar.

O abracei, mas depois de algum tempo quem chorava era eu. Estava arrasado por ter perdido a partida, eu era um dos atacantes, havia sido eleito centroavante, perder o jogo foi um fracasso sem fim. E mais uma vez quem me deu apoio e ombro foi Filipe, meu melhor amigo, meu irmão.

O ano terminou, no sufoco, mas passamos de série, pelo menos eu, Filipe e Ritinha, porque seis pessoas da nossa sala repetiram, era muito triste ver algumas pessoas ficando pelo caminho, a maioria dos alunos da nossa turma estudava junto desde o sexto ano.

Naquele ano descobri que eu amava Filipe, como um irmão!

Era a última semana das férias, na segunda-feira Filipe não quis ir ao cinema comigo, na terça inventou uma dor de barriga, no dia seguinte furou a ida na praia, quinta-feira ficou incomunicável e na sexta ele disse que não queria sair, mas confirmou a ida na festa do Yuri.

Eu me conformei. Mas para minha surpresa ele não iria comigo, meu pai sempre me levava para as festas e geralmente Filipe pegava carona conosco, mas ele não quis ir dessa vez.

A festa estava legal e cheia de jovens, não tinha cerveja, mas tinham muitas outras bebidas e a música era boa. Filipe se mantinha próximo a mim, eu bebi e comecei a dançar, quando vi uma garota me beijou e eu correspondi, acho que fiquei uns cinco minutos beijando-a. Fui comer um salgadinho e veio a ideia de contar para o meu melhor amigo meu êxito.

Foi aí que me dei conta que ele havia sumido. Não estava no andar debaixo, nem no de cima, no quintal, na garagem, liguei para ele e nada dele me atender, telefonei para o meu pai depois de algum tempo, que logo veio me buscar. Minha mãe falou que era tarde para eu ir ver se ele estava em casa, no dia seguinte eu poderia ir lá.

Acordei meio-dia, meia hora depois eu estava na porta do apartamento dele, Allan abriu a porta e coçou a cabeça, ele era um mulato - no meu ver ele era mulato, parecia filho de negro com branco, não tinha feições brutas, mas tinha uma cor morena -, alto e seu corpo era atleticamente forte, careca e usava cavanhaque, como estava de camiseta dava para ver as tatuagens em seus ombros, acho que ele iria fazer quarenta anos e aposto que na juventude deveria ter sido bem parecido com Will Smith.

- Fala garoto - O pai dele respondeu - Olha, se estiver atrás do Filipe ele não está.

Eu convivia há muitos anos com Allan e sabia quando ele mentia, pois era péssimo nisso.

- Allan, eu e você sabemos que Filipe está aí, ele chegou ontem de uma festa e dorme tanto quanto um urso, me deixa falar com ele - Pedi.

Allan riu e coçou os pelos do rosto.

- Entra vai, ele está no quarto - O homem falou pegando a carteira e o molho de chaves que estava sobre a mesa - Até mais - Ele falou saindo e batendo a porta.

Bati na porta do quarto do Filipe.

- Pai? - Ele perguntou.

- Não, Eduardo.

O silêncio instalou-se.

- Meu pai já foi?

Meu amigo perguntou como se já soubesse que Allan iria sair.

- Sim - Respondi.

- Entra - Ele falou.

Filipe tinha muitas manias, sendo as principais: limpeza e organização. Limpo o quarto dele estava, mas arrumado não e sempre que o quarto dele estava bagunçado ele não estava bem. Entrei e fechei a porta.

- Mano o que aconteceu aqui? - Perguntei.

- Estou com preguiça, se divertiu ontem? - Ele devolveu.

- Cara foi muito top, baladinha boa, altas minas, perdeu, foi mito - Falei.

Sim hoje eu me envergonho dessas palavras que eu falava.

- Percebi - Filipe levantou e falou como uma namorada irritada.

- Você está bem? - Indaguei.

- Eu tento não te atrapalhar, não bagunçar a sua vida, mas você complica tudo - Ele reclamou.

- Levou um toco cara? Ta na seca? - Perguntei rindo.

- Edu, tem algum tempo que as coisas mudaram.

Filipe falou e eu fiz uma careta confusa.

- O que está havendo? - Indaguei enquanto ajeitava minha camisa preta.

- Sempre tive como você melhor amigo, um irmão, mas tem algum tempo que tudo ficou diferente - Ele falou e eu ainda não entendia.

- Você consegue ser mais objetivo?

- Sim, consigo - Ele parecia irritado - Eu gosto de você Eduardo, fui embora ontem porque odiei te ver com aquela menina - Falou deixando o corpo cair na cadeira giratória que ficava próximo a escrivaninha.

Eu queria rir, era mentira, aquele cara já tinha me visto sem roupa, já vimos "pornô" um lado do outro, ele me aconselhava sobre as meninas, já compartilhamos a mesma cama, nunca houve qualquer sinal disso. Era mentira!

Mas ao julgar os cabelos encaracolados de Filipe parecendo um ninho de passarinho, sua camiseta e bermuda toda amassada, e, seus olhos que se concentravam em qualquer coisa menos em mim, podia ser verdade!

- Mano você ta falando sério? - Indaguei assustado.

- Por favor, não surta - Ele falou levantando.

- Cara, como assim, tu gosta de mim? Que treco é esse? - Perguntei aflito, mas sem querer saber a resposta.

- Edu tenta entender - Ele disse e virei o rosto.

- Você é louco?! Achou que eu ia ser o que? Seu namoradinho? - Indaguei debochando.

- Edu, se não quiser está tudo bem - Filipe falou pondo a mão no meu ombro e me afastei rápido.

- Se me encostar de novo eu vou te socar! - Quase gritei - Não me encosta!

- Cara somos amigos há muitos anos - Ele falou.

- Não me procura, você é louco, louco! - Saí do apartamento dele e bati a porta, logo depois entrei no elevador.

Minha cabeça estava a mil, eu pensava tantas coisas que não dava pra raciocinar. Voltei para casa e dormi não estava com muito sono então às quatro da tarde eu abri os olhos, comi e fui tentar navegar na internet.

Por acaso mexi no celular e vi que das dez fotos que eu havia tirado Filipe estava em seis delas, taquei o telefone longe, problema se ele era gay, eu não era.

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Galera obrigado por ler, quem gostou pode votar, é só clicar na estrelinha no canto superior - para os que leem por PC - ou na barra inferior - para os que leem pelo celular. Bjs!

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