Capítulo 31

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Nunca imaginei, que depois dos 20 anos, minha vida fosse ficar tão complicada. Sinceramente, eu só não me preocupei com isso, afinal, eu nunca quis sair de casa, tudo piorou quando eu dei meu primeiro passo, para fora das minhas fronteiras de proteção. Em apenas 1 semana, ou 1 mês, ou sabe lá a quanto tempo eu estou nessa confusão toda, eu já me tornei parte da vida de vários estranhos, fui ao hospital e fugi do mesmo, comi comidas novas que poderiam me matar, descobri que talvez minha mãe morra primeiro que eu e agora estou no carro de um senhor, que aparentemente é meu pai. 

 O fato dele se quer me encarar, deixa questionável nossa parentela. Infelizmente, o caminho do hospital até a psicologa que eu deveria ir, foi um silêncio assustador, meu celular estava descarregado, eu não conseguiria anotar nada para lembrar depois e duvido que o senhor Raul me desse alguma caneta e papel, afinal, ele nem acredita que tenho algum problema.

— Por que colou isso no seu celular? — Meu pai perguntou quebrando o silêncio, observando o papel com o nome celular, no meu J7 — É tão difícil assim, lembrar algo tão básico?

— Sei que não acredita em mim, mas dependo de anotações para sobreviver — Falei com a cabeça baixa, temendo a reação dele — Infelizmente tem sido assim, há anos...

— E esses anos todos, nunca foi a um psicologo? — Ele perguntou sério, mesmo escutando o que eu disse, sendo óbvio que eu não lembraria aquela informação — Enfim, estamos chegando, a clinica dela já fechou mas ela disse que atendia na casa dela, apenas dessa vez.

— É sua amiga? — Perguntei curioso, afinal, poderia ser alguma nova namorada dele — Espera... Eu conheço esse lugar... 

Observei, assim que o carro parou, que embora já estivesse escuro, aquela casa não me era estranha. Eu tinha quase certeza que já havia andado ali. Olhei mais a diante e vi uma mulher já esperando na porta, ela era alta parecia uma japonesa com olhos puxados e cabelo escuro bem liso. Estava sorrindo e acenando para mim, como se me conhecesse.

— Já viajei com esse casal, são bons amigos. E também moramos juntos por 2 anos nos Estados Unidos, enquanto eu fazia algumas pesquisas para a empresa que trabalhamos — Ele explicou trancando o carro e pegando umas coisas estranhas quadradas na parte de trás — Sem mais perguntas, vá cumprimenta-los e seja educado! 

— Olá Richard, quanto tempo! — Ela falou assim que subi a calçada, perdendo o sorriso ao notar minha reação assustada — Ah querido... Perdão. Você não lembra mais de mim, não é?

— Sinto muito... — Pedi olhando para meu pés, ela era muito gentil, pena que não tinha meus cadernos de anotações, eu poderia ao menos ler e fingir lembrar dela — Só por curiosidade, o que são aquelas coisas que ele vem trazendo?

— São malas — Ela respondeu observando junto comigo meu pai tirando várias das tais malas do carro — Você não lembra o nome desses objetos também?

— Só lembro o que anotei, seja no celular ou nos meus cadernos — Expliquei encarando meu pai indo até a casa do lado e entrando — Que lugar é aquele?

— Sua casa querido... — Ela falou triste percebendo que meu problema era sério — Era ali que você morava, antes dessa confusão toda.

Aquela noticia me deixou com as pernas pesadas, eu queria correr até aquele lugar, se ali era minha casa, então minha mãe morava ali. Eu queria tanto vê-la... Contudo, eu não poderia, desde o começo foi uma má ideia ela cuidar de mim sozinha, talvez nunca fez uma consulta ou se quer se preocupou com a própria saúde. O melhor que eu poderia fazer, era ficar distante, deixar meu pai resolver, mesmo que ele fosse um completo ignorante, eu só poderia contar com ele no momento.

— Não sei se seu pai lhe informou, mas sua mãe está doente — Ela informou e só então percebi que ela me observava até agora — Vocês terão que passar uns dias aqui, mas ela ficará bem, começou as consultas ontem e logo fará a cirurgia.

— Quem está cuidando dela? — Perguntei preocupado, já que sempre fomos só ela e eu — Aliás, que tipo de câncer ela tem?

— Seus avós chegaram ontem de viagem — Ela falou se virando e abrindo a porta — Vamos entrar, aqui está frio, explico melhor lá dentro.

Quando entrei me senti desconfortável, era sempre assim quando algo dentro de mim, alertava eu já ter estado naquele local, olhei para a sala gigante onde havia um piano em um canto, uma televisão gigante e um sofá do outro e uma escada no meio que levava ao segundo andar. Continuei andando e mais a frente havia uma cozinha com tanta coisa, que minha cabeça doeu só de tentar lembrar o nome de cada coisa que havia ali. Era vários objetos que ansiavam em minha mente por um nome, porém eu não lembrava.

Fiquei sem ar, já foi doloroso puxar a lembrança do nome das coisas da sala, na cozinha tudo me sufocava, corri mais adiante até passar pela porta de saída e chegar em um quintal. Havia poucas árvores, um objeto estranho que aparentemente, dava para sentar. Era horrível aquele sentimento, querer lembrar o nome de cada coisa e não poder, a cabeça doer como se fosse explodir, o coração apertar, as mãos formigarem, o corpo pesado... Eu precisava me acalmar.

— Tudo bem? — A moça que me atendeu na porta apareceu logo depois — Deve ser difícil estar em um ambiente novo, com tanta coisa nova, talvez jamais vista...

— Sei que é psicologa, mas penso que não pode me ajudar — Falei com lágrimas nos olhos — Isso tudo é muito frustante, é desesperador, é como se não houvesse mais solução pra mim e eu só estou esperando o dia que eu não acorde mais...

— Compreendo... Porém, não vai ser assim, não sei quanto a solução, mas eu posso ajudar a amenizar o seu problema — Ela explicou vindo até mim, colocou a mão na minha cabeça, movimentou subindo e descendo, e minha dor de cabeça diminuiu na hora, como se aquele pequeno gesto fosse tudo que eu precisava e talvez fosse — O verdadeiro problema, não é aquele que não tem solução, é quando você desiste, antes mesmo de tentar...

Suas palavras me tocaram de uma forma tão forte, que cai no chão de joelhos e comecei a chorar desesperadamente. Eu queria gritar e fiz, deixei sair tudo que doía até atualmente. Então ela me abraçou e eu fui me acalmando. Estava sendo curado, de 20 anos de angustia, da solidão por não ter alguém que realmente quisesse me ajudar, de um carinho que muitos tinham medo de oferecer, de se aproximar... De tantas dores, medos, tanta coisa que eu nem lembrava mais, que habitava dentro de mim.

Ganhei naquela noite, um abraço restaurador, que jamais havia sentido. Não que minha mãe, nunca tenha feito isso por mim, mas sempre que ela fazia, eu sentia que havia medo, havia culpa, havia um sentimento de que queria me ajudar, mas não sabia como. E isso me deixava com a consciência pesada... Todavia, naquela noite, aquela mulher não estava com pena, ela sentia de alguma forma, tudo que eu carregava em minhas costas e percebeu o que eu sempre quis... Apenas um abraço.

Perdoe os erros de português, espero que gostem do capítulo, até mais ❤

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