Capítulo 26

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Eu tenho algo muito irritante em mim, chamado timidez. Como eu sei que tenho isso? Minha mãe me contou hoje e isso me acompanhou minha vida inteira, eu nunca falei com garotas. Não era só pela perda de memória, segundo minha mãe, eu até tentei muitas vezes me aproximar de alguém, mas eu sempre soluçava, o coração ia de 10 a 100, eu suava como louco. Eu também sei disso, por que no meu celular tem um lembrete suplicando para eu me afastar de garotas e na descrição do lembrete há mais de 20 motivos. Eu sempre fui um cara muito estranho...

Tanto minha mãe, como eu, não entendemos por que eu conseguir conversar com Marry tão calmamente, talvez por que ela nem se parece com uma garota. Eu contei a minha mãe sobre Marry e a dona Teresa, ela gostou tanto da história que foi agradece-las e agora estou sozinho com Sammy, esperando que a qualquer segundo eu tenha uma crise de pânico de tão perto que ela está de mim. Ela diz que está tentando focar no melhor angulo do meu rosto.

— Então, já pensou no assunto do vídeo de hoje? — Sammy perguntou ajustando a filmadora sobre um suporte que ela trouxe — Prontinho. Que tal sobre os dias que passei na sua casa ou sobre a velhinha que você conheceu ou sobre você ter fugido hospital?

—  Vou falar sobre meus diário de bordo — Falei lembrando que seria bom deixar registrado que para lembrar, eu uso certas ajudas — Vamos lá, conte até 3, estou pronto!

"Olá Diário de Bordo, eu realmente acho que estou melhorando. Hoje conseguir lembrar onde guardava meus fones de ouvido, minha mãe não precisou procurar por eles ou acabar comprando novos por não achar os antigos. Eles estavam..."

— Foi assim que comecei meu dia, eu sempre anoto tudo no meu diário, na verdade são vários, eu tenho todos guardados em uma prateleira  — Falei olhando para a filmadora — Isso me ajuda a lembrar de como sobreviver, ah é... Foi nesse dia que Sammy passou a ficar uns dias lá em casa, ela pediu a minha mãe e eu não aceitei muito bem.

— Está ficando ótimo! — Ela falou animada — Conte como se sentiu quando descobriu que eu estava dormindo lá.

— Certo... — Falei pensativo tentando lembrar minhas palavras, não entendo ainda por que, mas na presença de Sammy, lembro certas coisas — Já sei! Lembrei, foi assim...

"As vezes fico pensando, será que apenas eu sinto quando algo deu errado? Sabe, embora a notícia não tenha chegado, ou você não tenha presenciado, dá pra sentir quando algo deu errado. Quando você pede para alguém fazer um favor e ela não faz. Ou tipo quando você pede para sua mãe resolver uma situação e ela não resolve. Acho que apenas eu sinto isso... Mas isso não importa no momento, o importante agora é o por que de ter uma estranha na minha sala, dormindo no meu sofá."

— Não lembro de exatamente tudo desse dia... — Falei forçando um pouco a mente — Mas eu sei que nesse dia ela falava com minha mãe...

"Sai correndo e subi as escadas. Mas fiquei alguns degraus acima ouvindo a conversa. Eu não queria conversar com a garota e nem com ninguém nessa terra, espero nunca precisar.
Eu tenho muito medo de conversar com as pessoas. Não há nada assustador em um diálogo, eu sei. E ter medo disso deve ser bobagem. Mas no mundo em que vivemos, nessa atualidade distorcida, conversar pode ser meio perigoso se você não tiver bons argumentos, caso tenha opinião contrária à outra pessoa, você pode se dar muito mal e acabar pior do que simplesmente ter ignorado ela."

— Vai dar conselhos também? — Sammy perguntou pausando o vídeo — Se conseguir com sua mãe, pede para ela trazer os diários, vai ajudar bastante.

— Sim, pedirei — Falei sorrindo — Obrigada pela ajuda e perdão o incomodo...

— Não se preocupe — Ela riu e guardou a filmadora — Esse é meu novo passa tempo! Sinto que aprenderei muito com você. Aliás, eu não tenho nada para fazer em casa para me distrair, isso ajuda a manter a mente ocupada, então, eu que agradeço...

— Mente ocupada? — Perguntei curioso por notar certo desanimo na voz de Sammy — Está com algum problema?

— Depressão — Ela falou indo até a janela, para pensar provavelmente, já que eu fiz o mesmo e o Doutor também — Eu tenho que ocupar a mente para não pensar em suicídio...

— Já ouvi essa palavra antes... — Falei tentando lembrar levantando da cama e procurando roupas para vestir — O que é isso mesmo?

— É quando as pessoas tentam se matar — Sammy falou e acabei soltando minha bolsa no chão assustado — Pois é... Eu tentei fazer isso...

— Por que?! Você nem é doente, não tem problemas, tem uma vida ótima — Falei chateado — Não entendo por que pessoas que tem oportunidade de viver, não aproveitam isso...

— Primeiro de tudo, não diga o que não sabe — Sammy falou irritada indo até mim e me empurrou na cama — Não tive e nem tenho uma vida boa... Segundo, não fale como se não pudesse aproveitar sua vida, eu já disse que te ajudava a viver e realizar seus sonhos.

 — Primeiro de tudo, eu não posso sair daqui — Falei levantando da cama, me abaixando para encarar Sammy nos olhos — Segundo, posso não saber nada sobre você, mas nada nesse mundo, nem um motivo, nem uma explicação, nem uma tese completa, seria suficiente para alguém ter a morte como opção.

— A morte é um escape — Sammy falou cruzando os braços e ficando triste — Há tantos problemas, tantas preocupações, tantos medos, tanta dor, angustia e sentimentos ruins perturbando nossa mente... Ás vezes morrer parece o melhor a se fazer pra ter paz...

— Pra ter paz, geralmente dormimos sabe? — Falei rindo, mas sabia que aquilo era algo sério, eu só não queria que ela ficasse triste de mais — Mas eu sei como se sente, é difícil dormir, se divertir, falar, pensar, existir... É complicado fazer muita coisa quando se está assim.

— O pior é que vozes ficam repetindo, "Se mate", "É a melhor opção" — Sammy falou com lágrimas nos olhos — É tentador sabe?

— Não é uma opção, muito menos a melhor delas... — Falei tentando vestir minha blusa de capuz. Eu não sabia se devia abraça-la, eu só era um estranho, mas parecia que ela precisava de um conforto — Como você disse, é um escape, não uma opção, há várias maneiras de resolver e silenciar nossas dores, se me permitir, posso mostrar como.

Sammy apenas acenou com a cabeça, me aproximei dela e tentei abraça-la. Eu não era muito bom nisso, afinal, não lembro se alguma vez na vida, eu tinha abraçado alguém. Sammy acabou me ajudando, ela me abraçou e precisei apenas pousar meus braços em suas costas. Eu não sabia como ajudar pessoas com depressão, mas entendia que abraços tinha um poder de cura gigantesco, por que era assim que dois corações se aproximavam e aqueciam um ao outro. 

Leiam, comentem, votem e corram pro próximo capítulo, por que ele está tooop ❤

Até o cair das folhas - Em RevisãoWhere stories live. Discover now