𝐗𝐕

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O dia seguinte amanheceu com uma leve neblina cobrindo os prédios altos de National City, e o som constante da cidade despertando parecia distante demais para alcançar o apartamento de Kara. Lá dentro, um novo tipo de silêncio reinava: o silêncio depois da confissão, depois do toque — e da interrupção.

Kara acordou com o cheiro de café e pão na chapa vindo da cozinha, os cabelos ainda bagunçados do travesseiro e a camisola torta, denunciando a noite maldormida. Mas, por algum milagre solar, ela estava de bom humor. Talvez fossem os hormônios. Talvez fosse o fato de que Lena ainda estava ali.

Ela se espreguiçou, acariciando a barriga com as duas mãos.

— Bom dia, meninas. Tentem não chutar muito hoje, ok? Mamãe quer ficar um tempo só curtindo o café... e a outra mamãe.

Como resposta, um chute duplo — sincronizado, como sempre.

Na cozinha, Lena estava de costas, o cabelo preso em um coque frouxo, vestindo a camisa azul que Kara usava para dormir (e que claramente não era dela). A cena era tão bonita, tão doméstica, que Kara teve vontade de chorar. Mas não chorou. Ainda.

— Você está cozinhando? — perguntou, rouca, da porta.

Lena virou-se com um sorriso torto e uma caneca fumegante nas mãos.

— Tentando. Com ajuda da inteligência artificial de Brainy e vídeos de receita da Sam. Chance de dar errado: 63%.

— Eu arrisco mesmo assim. — Kara caminhou até ela, tocando de leve o quadril de Lena ao passar para roubar um gole da caneca. — Hm. Café com leite e... mel?

— As meninas pareceram gostar do cheiro ontem.

— Ou você está só me mimando.

— Também. — Lena piscou.

Elas ficaram ali por um instante, em um silêncio confortável, apenas observando uma a outra como se o tempo tivesse desacelerado mais uma vez.

Mas, claro, esse tipo de paz não durava muito na vida de uma Super.

— KARAAAAA!

Era Alex. De novo.

— NÃO! — gritou Kara, escondendo o rosto nas mãos. — Juro que vou mudar de planeta!

Alex entrou apressada, jogando uma pasta cheia de papéis sobre a bancada. Atrás dela, Nia trazia uma bolsa térmica e uma expressão preocupada.

— Aconteceu alguma coisa? — perguntou Lena, já ficando alerta.

— Aconteceu que eu fui revisar os exames das meninas com a Nia e o Brainy, e... bom... talvez a gente precise de uma nova conversa sobre o que exatamente está crescendo aí dentro.

Kara congelou.

— Alex... não faz esse tom. Você só usa esse tom quando vai me contar que um alien me clonou ou que a Lillian Luthor voltou dos mortos com um plano de dominação mundial.

— Não é tão ruim quanto isso... mas é quase.

Lena puxou uma cadeira para Kara sentar.

— Fala logo, Alex.

— Aparentemente... os poderes das meninas estão se desenvolvendo em ritmos diferentes. E não são só kriptonianos.

— Eu já tinha sentido algo mágico — murmurou Lena. — Como uma energia diferente, principalmente quando uma delas fica mais agitada.

— Pois é — disse Nia. — Fiz uma projeção onírica, e... uma delas me mostrou um campo de flores flutuando no espaço. A outra, um eclipse se partindo ao meio. Elas são... intensas.

— Vocês estão querendo dizer que minhas filhas são... tipo, pequenas bombas mágicas voadoras? — Kara arregalou os olhos.

— Não bombas, exatamente — disse Alex. — Mas... poderosas. E sensíveis. Qualquer instabilidade emocional entre vocês duas... ativa reações nelas.

— Como assim?

— Tipo quando você ficou com ciúmes ontem, lembra? Os batimentos cardíacos delas triplicaram.

— Ah, meu Rao...

— E quando Lena tocou sua barriga com calma... elas pararam de brigar por espaço. — Nia sorriu. — Eu acho que elas já amam vocês. Mas também precisam de equilíbrio emocional.

Kara suspirou, se recostando.

— Então, basicamente, se a gente não se resolver logo, eu posso explodir um quarteirão com um suspiro?

— Exagero kriptoniano, mas sim — disse Alex, revirando os olhos. — Vocês duas precisam de um plano. De um ambiente estável.

Lena trocou um olhar rápido com Kara, e seus dedos se entrelaçaram.

— Eu tenho um plano.

Kara a olhou, surpresa.

— Tem?

— Sim. Eu fico. Me mudo de vez, assumo cada noite, cada desejo estranho, cada crise de choro... cada pedaço dessa bagunça maravilhosa. Se você me deixar.

Kara mordeu o lábio inferior, emocionada.

— Eu deixo.

Nia piscou rápido, Alex fingiu que não chorou, e Lena beijou a mão de Kara com uma reverência silenciosa que dizia mais do que qualquer promessa verbal.

— Ah, e sobre os desejos... — completou Lena, tentando mudar o clima — preparem-se, porque vamos ter que sair agora mesmo.

— Agora? — Alex franziu a testa. — Por quê?

— Porque a Kara quer sorvete de picles com bacon e cobertura de chantilly. E se não tiver, ela vai tentar voar pra Islândia pra buscar.

Kara assentiu com seriedade.

— A bebê da esquerda foi bem clara.

E com risos, caretas e uma nova missão, o grupo se preparou para sair — unidos, caóticos, mas cada vez mais certos de que estavam exatamente onde deveriam estar.

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G͟r͟a͟v͟i͟d͟e͟z͟ i͟n͟e͟s͟p͟e͟r͟a͟d͟a͟ ~͟ S͟u͟p͟e͟r͟c͟o͟r͟p͟ •͟ K͟a͟r͟l͟e͟n͟a͟Where stories live. Discover now