𝐕𝐈

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O dia seguinte amanheceu com o céu carregado, nuvens densas se agrupando sobre National City como se pressentissem que algo além da atmosfera estava prestes a ruir.

Kara acordou antes do sol, com o corpo suando frio e o coração acelerado. Não por um pesadelo, mas por uma inquietação silenciosa, profunda. Ela se sentou na cama devagar, levando a mão até a barriga. As gêmeas se moviam. Muito.

— Está tudo bem — ela murmurou, tentando acalmar não só a si mesma, mas as pequenas dentro de si. — Vocês estão seguras. Está tudo bem...

Mas não estava.

Em segundos, as lâmpadas do quarto começaram a piscar. Um estalo seco ecoou do banheiro e a torneira girou sozinha, jorrando água. O abajur explodiu. Um espelho se trincou do nada. Lena acordou com o som do vidro e se levantou num salto, os olhos arregalados.

— Kara?

Kara estava encolhida no centro da cama, com as mãos protegendo a barriga, como se isso pudesse impedir o que quer que estivesse acontecendo.

— Eu não sei o que está acontecendo… Eu… eu juro que não estou fazendo isso, Lena!

Lena correu até ela, ignorando os estilhaços no chão. Tocou sua testa, sentiu a pele quente e vibrando, como se uma corrente elétrica corresse sob a epiderme.

— Está tudo bem. Eu tô aqui. Respira comigo… — Lena tentou, mesmo com os quadros da parede começando a tremer atrás de si.

A porta do quarto se abriu com força, Alex já em alerta, arma de contenção em punho. Atrás dela, Brainy vinha digitando furiosamente em um dispositivo preso ao braço.

— Detectamos flutuações gravitacionais e energia elétrica instável vindo daqui — ele anunciou. — Kara, está tudo sob controle?

— Não! — Kara disse, a voz embargada. — Eu juro, não sou eu… São elas.

O olhar de Alex pousou na barriga saliente da irmã. Um arrepio percorreu sua espinha.

— Isso não é apenas uma reação kriptoniana hormonal… — ela murmurou, se aproximando. — Tem algo diferente aqui. Tem… outra energia.

Kara arfava, tentando não entrar em pânico. Lena, no entanto, permanecia calada. Estava pálida. Muito mais do que o normal.

— Lena? — Alex chamou, percebendo o silêncio dela. — O que foi?

Lena engoliu em seco. Olhou para Kara, depois para Alex.

— Eu… acho que sei o que está acontecendo.

Todos voltaram os olhos para ela.

— Quando… quando derrotamos Nyxly, eu prometi que nunca mais tocaria magia. Eu fechei aquele capítulo. Parei de praticar. Mas… — ela hesitou —, a magia não é algo que simplesmente desaparece. Ela faz parte de mim. Está no meu sangue. E se o DNA usado no experimento… se foi mesmo o meu… então…

Kara arregalou os olhos.

— Então… você acha que… as meninas são metade kriptonianas e… metade bruxas?

Lena assentiu devagar.

— Não bruxas como em contos de fada. Mas sim, com uma herança mágica. E agora, com seu corpo vulnerável e os hormônios alienígenas acelerando tudo… talvez essa magia esteja se manifestando. Por elas.

— Elas estão tentando se comunicar? — Alex perguntou, assombrada.

— Ou se proteger — disse Lena, se ajoelhando novamente diante de Kara. — Pode ser uma reação a algo que sentem. Medo, desconforto, emoção… talvez até o meu próprio medo esteja afetando isso. A magia responde à intenção e ao coração. Se elas herdaram isso de mim, então…

Nesse instante, uma cadeira se arrastou sozinha do outro lado da sala.

Kara soltou um pequeno grito.

— Lena, eu… eu tô com medo.

Lena tomou as mãos dela nas suas, ignorando os estalos ao redor, a estática que fazia seus cabelos flutuarem levemente.

— Olha pra mim. Kara, olha pra mim. — Os olhos verdes a fixaram com firmeza. — Você não está sozinha. Eu vou te ajudar a entender isso. Nós vamos proteger elas. E se a magia passou mesmo para elas, então… vamos lidar com isso. Como uma família.

Kara assentiu, trêmula, e, pela primeira vez, olhou para a própria barriga com uma nova percepção: aquelas meninas não eram só suas filhas. Eram algo totalmente novo. Algo que talvez nunca tivesse existido antes.

No fim daquela tarde, quando os efeitos pareceram diminuir — depois que Brainy ativou um campo neutralizador ao redor do apartamento —, Kara estava deitada no sofá, flutuando alguns centímetros acima do estofado, mesmo sem perceber. Lena lia um antigo grimório escondido entre os livros de física teórica. Alex organizava anotações no canto, tentando rastrear padrões.

— Se for mesmo magia — disse Alex —, não há protocolo DEO que se aplique aqui. Isso… isso é além de qualquer coisa que enfrentamos.

— Não além do que podemos enfrentar — Lena rebateu, com mais firmeza do que ela mesma esperava.

Kara abriu os olhos, oscilando entre o cansaço e um sorriso tênue.

— Vocês vão mesmo ficar?

Alex parou o que fazia e caminhou até ela, inclinando-se para beijar sua testa.

— Até o fim.

Lena sentou-se ao seu lado e pousou a mão sobre sua barriga. Fechou os olhos. Um leve calor surgiu sob sua pele, um brilho tênue que só ela sentia.

— Liv. Maddie. — Ela sussurrou. — Vocês não precisam se defender da gente. Estamos aqui pra cuidar de vocês.

E então, como uma resposta, Kara sentiu — não apenas fisicamente, mas como uma presença em sua mente — um pequeno toque. Quente. Curioso. Amoroso.

Ela sorriu, os olhos marejando.

— Elas ouviram. Eu senti… Lena, eu senti.

E naquele silêncio cheio de magia e emoção, algo sagrado se selou. A linhagem Luthor e a Casa de El se uniam não apenas pelo caos, pela dor, ou pela ciência. Mas pela força de algo que transcende explicações: amor, sangue e legado.

Ali, naquele apartamento flutuando entre a razão e o mistério, nascia uma nova história.

Uma que o mundo ainda não estava pronto para entender.

Mas elas estavam prontas para viver.

Juntas.

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G͟r͟a͟v͟i͟d͟e͟z͟ i͟n͟e͟s͟p͟e͟r͟a͟d͟a͟ ~͟ S͟u͟p͟e͟r͟c͟o͟r͟p͟ •͟ K͟a͟r͟l͟e͟n͟a͟Where stories live. Discover now