Capítulo um: noite esquisita

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Olhava para o teto do quarto envolta em pensamento, não muito agradáveis, enquanto escutava seus pais brigando a poucos metros.
Isso já havia se tornado comum, o que não é nem um pouco normal e saudável, mas ela não podia fazer nada além de escutar, mesmo se não quisesse.
Na verdade, ela podia, tinha a possibilidade de usar seu fono de ouvido e colocar no volume máximo sua música favorita. Mas apesar disso, ela sempre preferiu escutar. Fingia não saber o motivo, porque ele era doloroso demais pra acreditar, mas ela sabia a verdade.

O silêncio agora pairava sobre o lugar, o que era mais assustador que o barulho. Preferiu não interferir.
Foi até sua mesa e decidiu colocar seus fones de ouvido. Só agora percebera que estava chovendo, quando olhou para a janela à sua direita. A chuva sempre a acalmou nos seus dias de tempestades.
- Que irônico. - Disse pra si mesma. Voltou para o seu computador e colocou alguma coisa para assistir e passar o tempo.

O quarto estava inteiramente pintado de lilás. Suas colchas de cama eram brancas, um ar de tranquilidade era o que tinha aquele cômodo, por isso quase nunca se dava o trabalho de sair de lá.
Seus cabelos de cor castanho escuro estavam um pouco emaranhados por causa do vento que entrava pela janela. Sua pele parda havia sido herdada de sua mãe.
Seus olhos estavam pesados agora, tinha acordado cedo para a aula. Sem nem sequer conseguir assistir aos quinze minutos do vídeo, que passava na tela do computador, Aurora adormeceu.

•°•

Era por volta das duas da manhã quando acordou. Ainda atordoada, Aurora se levantava enquanto colocava a mão em seu pescoço, onde sentia uma pequena dor pela forma que havia dormido.
Deu alguns passos e bateu de cara em uma parede invisível.
Caiu no chão e olhou para sua frente onde não viu nada. Pensou que estivesse sonhando, então se levantou e andou para frente de novo, o que não foi nenhuma surpresa ela bater com a testa no mesmo lugar.
- Que porra é essa?! - Sussurrou para si mesma antes de dar alguns passos para trás.
Começou a estender sua mão, mas antes que pudesse alcançar, a parede se quebrou e a puxou para dentro.

Sentiu sob seu corpo algo macio e rígido, suas mãos agora tocavam o que parecia ser um chão de terra. Ainda tonta pela batida, levantou sua cabeça e tomou um susto quando viu um homem debaixo de seu corpo.

- O que você está fazendo embaixo de mim? - Ela, que agora estava com a cabeça um pouco levantada, via bem seu rosto. O que a fez pensar por alguns instantes que ele era muito bonito.

- Eu que pergunto! O que você está fazendo em cima de mim? - Sua voz estava meio rouca, talvez porque Aurora estivesse precionando seu peito.

Ela levanta e com um olhar de espanto se dá conta de que não está mais em seu quarto.
- Como diabos eu vim parar aqui? - Perguntava enquanto esfregava suas mãos umas nas outras para limpar a terra que havia nelas.

- Talvez por aquela parede mágica? - Seu tom de voz demonstrava uma certa raiva. Ele, que agora olhava para sua mão que tinha um corte um pouco profundo, tinha em seu rosto uma expressão de curiosidade, com suas sobrancelhas arqueadas e um olhar de mistério.
Aqueles olhos acinzentados escondiam alguma coisa que seria impossível de saber só o observando, foi aí que Aurora percebeu que ele viria a ser muito mais interessante do que parecia.

- Isso parece estar... Doendo. - Sua voz soou um pouco tímida, o que fez ela se perguntar o porquê disso.

- Não está.

- Pare de ser tão grosseiro.

- Bom, não é a sua mão que foi atravessada por um caco de vidro que sumiu de forma estranha. - Retrucou, agora com uma voz mais calma, mas ainda parecia ser um "grosseiro educado".
- Então pare de ser irritante e me deixe te ajudar. - Aurora se aproximou dele e puxou a capa que Levi usava, nela havia estampado asas, que ao ver, logo Aurora se sentiu curiosa.

- Espero que não se importe. - Antes que ele pudesse lhe perguntar o motivo, ela rasgou de uma vez só o pano verde manchado pelo que parecia ser sangue.
O baixinho a olhou nos olhos logo em seguida, o que a fez sentir um arrepio na espinha.

•Aurora.

Ter aqueles olhos acinzentados olhando para mim, me faz questionar a todo momento se não estou fazendo algo de errado. Sua postura o faz parecer um soldado, seu uniforme deixa isso cada vez mais evidente. Agora que me aproximei mais dele, vejo algum tipo de cinto usado para segurar... Espadas? E que negócio é esse preso em sua cintura?

Tento me acalmar um pouco.
Enrrolo sobre sua mão o tecido verde um pouco sujo, imagino por causa da terra que a algum tempo era onde estávamos. Dou um nó o mais forte que posso, e me pergunto se não foi forte o suficiente já que ele não demonstrou nenhuma expressão.
- Obrigado. - A frieza em sua voz me assusta um pouco, agora que vejo em que posição estou.
- Como você chegou aqui? Que pergunta idiota. Mas enfim, consegue explicar como isso aconteceu? - Ele continuou.

- Não faço a mínima ideia. - Respondo, me recordando agora da parede invisível. - Pode me dizer onde estou?

- Em shiganshina. - Ele faz uma pausa.
- Vi seus bichinhos de pelúcia, uma... Gracinha. - Seu tom sarcástico não era o que eu esperava dele a um tempo atrás. Sinto aos poucos meu rosto queimar e deduzo que estou vermelha. - Aliás, o que era aquele negócio em cima da sua mesa? Um quadrado pequeno, parecia uma pintura que estava se mexendo.

- Você quis dizer meu computador? - A curiosidade em seus olhos ficava cada vez mais iminente.

- E o que seria isso?

- Você está brincando comigo, certo?

- ...

- Ai meu Deus. Onde eu vim parar? Em que ano estou? - Agora mais que tudo estava questionando a minha própria sanidade.

- Não enche meu saco, pirralha. Vai dizer que você é do futuro? Bom, essas suas roupas são realmente esquisitas.

- Isso é um pijama, seu idiota. - Uma raiva surge em seu rosto, e naquele momento percebo que ninguém, com toda certeza, teria ousado falar assim com ele.
Em uma fração de segundos estava atrás de mim com uma das suas espadas presas em meu pescoço. Tento puxá-las com minhas mãos, o que foi completamente em vão, e ainda consigo alguns cortes. Ele era muito mais forte que eu, dava pra sentir os músculos do seu peitoral rígidos contra minhas costas. Percebo agora que não deveria ter questionado sua real força só pela sua aparência, na verdade pela altura.

- Não fale assim comigo, já matei muita gente por menos.

- Desculpe. - Falo por impulso, e só percebo depois o quão humilhante está sendo.

- Então só precisa de uma lâmina no pescoço para a pirralha ficar mansinha?

- E quem não ficaria "mansinha" com uma lâmina no pescoço? - Ele me solta e consigo sentir um pouco do meu sangue escorrer pelo pescoço.
- Me chame de capitão Levi, ou só de Levi. Não faz diferença, mas as pessoas costumam ter o respeito e me chamar pela primeira opção. - Sua fala deixa claro que não devo chamá-lo só por Levi.

- Penso que "idiota baixinho" combina muito melhor com você. - Dou uma pausa apenas para ver sua expressão, o que não tenho sucesso. - Pode me chamar de Aurora.

Ele vira as costas e vai em direção ao cavalo, que só percebo agora sua presença. Me sinto um pouco triste por não ter conseguido atingi-lo.
- Penso que "pirralha" combina melhor com você. - Com um único salto, Levi sobe no cavalo e me estende sua mão.

Estilhaçados Pelo Tempo Where stories live. Discover now