Esta Contaminado

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O dia seguinte veio com surpresas, sem que esperasse, foi informada que o imperador autorizou sua volta para o castelo de Sintra, além disso uma grande quantia em ouro, tecidos e especiarias de além do mar lhe foram entregues como presente, pensou por mais de uma hora enquanto encarava as caixas, não fazia sentido algum, mas em algum momento começaram a parecer algum tipo de compensação. Não seria impossível que o presente fosse um disfarce, algo como "Pegue e desapareça daqui com esse bebê, é uma desonra ter essa criança na família imperial", entretanto não foram esses acontecimentos que mais a abalaram. O sol já estava alto quando a carruagem do ducado Wharton finalmente estava pronta para partir, com tanto alvoroço James não poderia não saber onde ela estaria e poderia encontrar rápido, sorriu com o pensamento enquanto se dirigia para fora, caminhando devagar e graciosamente.

— Há algo incomodando a senhorita?— Freya perguntou logo atrás, Naiáde parou, percebendo que não havia contado nada a menina, mas ela estava agindo como se soubesse já a vários meses.

— Não, está tudo bem, só achei estranho. Ontem sua Majestade não permitiu que eu voltasse.— contou, o rosto de Freya havia melhorado muito, quando voltou a Belfort a situação dela era lamentável, não que passara dificuldade ou algo do tipo, mas não parecia diferente de alguém que já estava morto a dias. Ela sempre se preocupava, tanto que já era comum, parte da rotina.— Eu não me desculpei o suficiente com você. Eu te preocupei muito não é?— questionou com o coração envolvido em sentimentos, saudade, tristeza, amor.

— A senhorita fez o que precisava, assim como eu.— disse docemente e sorriu, ela não deu uma palavra de indignação, nenhuma repreensão.

— Você realmente deveria ser livre, minha irmã.— comentou baixo, se a conhecia bem a menina não aceitaria, esta não era corruptível.

— Mas a senhorita estaria perdida sem mim, tenho certeza.— respondeu com ar superior e riu de súbito, era verdade.

— Tem razão.— sussurrou melancólica, aliviada e culpada, Freya estaria com ela, mesmo que não pudesse ficar em Belfort, que James não cumprisse sua promessa ou que terminasse seus dias como a mãe de um filho bastardo que fora abandonada a própria sorte, ainda teria sua irmã.
Continuaram caminhando juntas, o dia estava realmente agradável, perfeito para uma sessão de treinamento com o arco, se deu conta do pensamento e de quanto tempo fazia desde a última vez que sequer tocou na arma, nem havia pensado nisso nos últimos dias. Notou um movimento repentino entre as folhas quando passaram pelo Jardim Real e ficou intrigada, tocou no braço de Freya e sinalizou para onde ia para que ela a seguisse, então desviou do caminho de mármore para o de pedra e então o de grama.
Ao longe viu uma figura alta e imponente com roupas elegantes e escuras, ombros largos e braços fortes visíveis mesmo sob as camadas de tecido e cabelos cor de cobre que reluziam os raios do sol, seu coração errou uma batida e as pernas fraquejaram apenas com o pensamento, era ele, não poderia ser outro, mas o que estava fazendo parado no meio do jardim?
Continuou se aproximando, temerosa mas em completo silêncio, quase podia tocá-lo quando entendeu a situação, primeiro viu a barra do vestido, depois cachos de cabelo amarelo dourado.

— Sua Alteza, não sabe quanta falta me fez. Eu estive tão triste.— lamentou a loira odiosa, o corpo de Naiáde travou e não pôde se aproximar mais.— Me deixou sozinha por tantos meses, primeiro na guerra e agora nessa missão em Cargia, nem mesmo me procurou no intervalo das duas coisas. Não mereço tanta crueldade.— continuou, Naiáde olhou fixamente, por um instante os olhos de Ashley visaram os seus e um sorriso venenoso se formou mas se esvaiu tão rápido quanto veio.

— Os deveres não podem ser deixados para depois, senhorita Lewis, tenho certeza que entende sendo filha de uma família aristocrata.— comentou ele, o tom da voz pareceu diferente, era dele mas não se lembrava de tê-lo escutado falando de tal forma. A atitude mesquinha não impressionou, não estava preocupada com a segurança dele, só com a sua ausência.

— Sim, é claro. Seus assuntos demandam sua atenção, Alteza, entretanto mesmo um homem responsável tem necessidades, é natural.— começou, a malícia na voz estridente da mulher fez o arrependimento se instalar, deu meia volta e estava prestes a se afastar quando ela continuou.— Me visite como antes Alteza, tenho certeza que não havia uma só mulher em Cargia capaz de satisfaze-lo como eu posso. Lhe darei prazer como a muito tenho feito.— completou, o estômago revirou novamente, mas seu peito pesou desta vez acompanhando o mal estar que se apoderava do restante do corpo. Sabia que James não era iniciante neste tipo de assunto, sabia bem mas mesmo assim aquelas palavras a perfuraram como adagas.

— Vou esquecer que ouvi tais palavras e peço que não volte a repeti-las.— respondeu frio, mas antes que as palavras pudessem tranquilizar Naiáde, Ashley atacou novamente. Foi rápido, o corpo de chocou contra o de James e as bocas se encontram, as mãos delicadas da mulher envolveram seus ombros e o conjunto se completou quando Naiáde viu a cena depois de se virar. A garganta fechou de imediato e um som engasgado escapou por entre os lábios, alto o suficiente para que o homem olhasse imediatamente para trás. Segurou a lágrima com todas as forças, sorriu e se curvou numa reverência.

— Vida longa a Vossa Alteza Real.— disse sem emoção.— Meus cumprimentos, Lady Lewis.— dirigiu-se a mulher que agora ostentava uma face corada e um olhar falso de surpresa.

— Bom dia, senhorita. Por favor, peço que não apareça tão subitamente no futuro, isso é uma completa falta de modos.— repreendeu Ashley, Naiáde sorriu.

— É claro, eu lamento pela intromissão. Achei sensato cumprimentar, sua Alteza Real é um conhecido que estimo muito. Mas não tinha a intenção de atrapalhar, vou me retirar, senhorita, Alteza, com licença.— disse sem ânimo para questionar e se virou para sair sem olhar nos olhos castanhos que tanto gostava.

— Espere.— pediu James com a intenção de segui-la mas teve o braço agarrado por Ashley e parou para que seus movimentos não a derrubassem.

— Alteza, deixe que ela vá, deveria estar descansando, depois de cair dura no meio da festa do chá da princesa Suzana. Pobrezinha, deve ter aborrecido muito a princesa depois de ter estragado um evento tão importante.— continuou provocando, Naiáde sorriu fraca se voltando para o casal, encarou o local onde a loira segurava e rangeu os dentes de irritação. Que cadela ousada era ela, e vazia de bom senso. Mesmo que o imperador houvesse garantido que encontrariam o responsável, ninguém tinha sido punido ainda, mas a mulher a sua frente nem mesmo disfarçava a cara de satisfação pela situação.

— O que aconteceu?— perguntou confuso, Naiáde se lembrou do dia que visitaram Otto, da dedicação que James mostrou quando prometeu que mataria todos que ela quisesse que morressem.

— Eu não sei ao certo, estava quente naquele dia, ouvi que a senhorita tem uma saúde frágil.— explicou Ashley com uma careta.

— Alteza, a senhorita foi envenenada. Ela percebeu que ia desmaiar e tentou sair da festa mas não conseguiu chegar na porta a tempo.— disse Freya apressada, curvada em reverência. James olhou assutado.

— Que criada insolente, como ousa se intrometer?— bradou a mulher, Naiáde revidou os olhos de desgosto.— Ela tem que ser punida imediatamente.— completou dando um passo a frente e levantou a mão, Naiáde tomou a frente e levantou o olhar em resposta.

— Lady Lewis, Freya não é uma criada e a senhorita não tem autoridade nenhuma para dar ordens a ela ou a qualquer um aqui, e muito menos tem o direito de punir a minha dama de companhia, saiba seu lugar.— disse com frieza.— Já estou recuperada, Vossa Alteza, agradeço pela preocupação.— completou educada, queria desesperadamente que ele a parasse, que a segurasse e acariciasse seu rosto como costumava mas estava contaminado pelo perfume de Ashley.— Tenho certeza que tem assuntos importantes com Lady Lewis, irei me retirar imediatamente.— disse e então voltou a virar as costas e caminhou de volta para seu caminho original, com o coração tão partido quanto sua dignidade.

A FILHA DO GENERAL Where stories live. Discover now