Eu Sinto Muito

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Observou a casa por entre as árvores antes de ousar entrar, não podia simplesmente bater na porta e dizer porquê estava alí. A mansão Duzzani era modesta em tamanho comparada as outras, mas grande o suficiente para se perder lá dentro e vigiada o suficiente para tornar a entrada clandestina muito difícil mas sem dúvida era divertido.

— Não está se divertindo demais com isso? É sua casa, quem saberia entrar e sair dela melhor do que você?— disse Athos tirando Naiáde da sua empolgação.

— Estraga prazeres. Se ia ficar me incomodando não deveria nem ter vindo.— exclamou irritada, mas voltou o olhar para os portões outra vez, estava movimentada e era um evento que não costumava acontecer, só se lembrava da casa movimentada assim nos dias em que sua cunhada recebia visitas das amigas próximas.— Acho que vai dar certo. Os criados e Liana vão estar distraídos, eu entro; busco o Tarso e saio, simples.— disse baixo, como se tivesse armado um grande plano.

— Eu sou um oficial do general Otto, posso ir pelos fundos até o celeiro e pegar o cavalo. Se perguntarem digo que o general mandou.— respondeu impaciente e Naiáde socou o braço.— Por que está assim? Que bicho mordeu você?

— Isso está mais chato do que as festas do chá da Liana.— resmungou derrotada.— Vamos logo então, mas eu vou com você. Tenho que ver a Lucille.— completou se levantando do seu esconderijo no pé de uma árvore e bateu a poeira das roupas antes de seguir Athos até a entrada dos fundos da mansão.
A organização da casa era simples, escolha da sua mãe, havia o alojamento dos criados na ala norte, o celeiro na parte oeste e a casa principal ocupava a ala sul e leste, toda a área livre era composta por jardins e gazebos ornamentados.
Caminhou ao lado de Athos até a entrada dos fundos e ficou em silêncio enquanto passavam pelo guarda, o homem estava certo, a presença dele tirou qualquer dificuldade e ninguém os havia parado até chegar no alojamento.
Passaram discretamente sem serem notados pelo grupo de mulheres reunidas e conversando no jardim, foram vistos mas nenhuma delas prestaria atenção em algum criado ou soldado que andasse pela casa, aos olhos daquelas mulheres, não valia a pena perder tempo com os servos.

— Eu soube que conseguiu, deve estar satisfeita agora Liana.— disse uma, Naiáde reconheceu como uma das irmãs de sua cunhada, Célia.

— Eu estou sim, as vezes nem acredito no quão eficaz foi.— respondeu ela.

— Do que estão falando?— outra perguntou.

— Liana me confidenciou uma vez que não estava mais suportando a irmã do general Otto, eu sugeri que ela acusasse aquelazinha de algum crime mas ela fez pior.— começou interrompendo a frase com um riso carregado de veneno.— Ela mandou a menina invadir o acampamento do exército e ela foi, coitada.

— Bom, parecia uma boa idéia, eu derramei duas lágrimas e fingi estar preocupada com a saúde do meu filho, ela nem pensou duas vezes antes de montar o cavalo e partir.— respondeu, Naiáde conhecia a voz, era Liana mas ao mesmo tempo era como se nunca tivesse ouvido antes, aquela mulher não parecia a boa e tímida esposa do irmão que a tratava como irmã.— Achei que ela seria pega e punida, ou violentada, mas ela acabou chamando a atenção do exército rival e foi mandada para ser concubina em Belfort. Coitadinha, deve estar trabalhando duro.— completou ela, Naiáde baixou a cabeça em completa decepção, a boca secou e todo o ar parecia ter se tornado fumaça, dor física era sempre preferível a ter o coração partido dessa forma.

— Que cruel, é bem a sua cara.— respondeu uma delas rindo, Naiáde continuou andando enquanto as vozes se tornavam distantes e abafadas, haviam menos pessoas para proteger agora mas a lista ainda estava bem cheia. Assim que chegou no alojamento olhou ao redor e procurou um pouco antes de ver a figura de costas, lavando legumes numa bacia e sentiu o coração aquecer.
Lucille já havia passado dos 50 e tinha longos cabelos que ficavam avermelhados quando o sol os tocava, era pequena e tinha um pouco de gordura aqui e alí, era linda. Se lembrou de quando perdeu a mãe, era em volta de Lucille que passava seus braços e chorava, era aquela mulher que se sentava com ela e a consolava sem nunca diminuir sua dor ou dizer para ser forte.

A FILHA DO GENERAL Where stories live. Discover now