Conversa Franca

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James

James suspirou depois que a calmaria se instalou ao seu redor, por muito pouco, não tomou Naiáde, mas como iria conseguir o afeto da moça se a atacasse?
Depois que a entregou ao seu pai e garantiu que não havia feito nada além de acompanhá-la numa caminhada, foi direto até o estábulo onde o par de cavalos estavam. Comendo grama fresca, descansando depois da jornada.

— O que estamos fazendo Orion?— murmurou para o cavalo enquanto afagava a cabeça do animal, pensando nos próximos dias porém mais preocupado com o amanhã. Vez ou outra, o pensamento voltava a mulher, não que estivesse arrependido, nem poderia, mas não sabia quando poderia tocá-la outra vez. Encarou o companheiro que não lhe deu atenção e continuou a comer, irritando-se por seus pensamentos não lhe deixarem ter paz.— Se não me ajudar vou transformar você em carne seca.— ameaçou antes de puxar uma das orelhas de Orion e voltar para a casa de Bernard.
Por um lado, estava aliviado por estar perto de Naiáde, mas incomodado, visto que não ficaria sem alguma vigilância tão cedo, o próprio homem havia garantido que estaria alerta. Suspirou de cansaço quando entrou no pequeno quarto reservado para ele, simples mas de alguma forma, aconchegante. Tirou  as botas, deixando-as nos pés da cama, desabotoou o casaco e tirou em seguida, mas não se atreveu a abusar, visto que estava como hóspede, não sabia como seria acordar no dia seguinte, então por via das dúvidas, dormiria pronto pra batalha.
      

Não precisou de muito para que acordasse na manhã seguinte, graças ao treinamento padrão de soldado, até a menor perturbação era um possível perigo, ouviu batidas na porta e pouco depois, uma voz feminina avisar que o desjejum estava pronto

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Não precisou de muito para que acordasse na manhã seguinte, graças ao treinamento padrão de soldado, até a menor perturbação era um possível perigo, ouviu batidas na porta e pouco depois, uma voz feminina avisar que o desjejum estava pronto.
Se levantou rápido, depois do sono pesado e completamente sem sonhos, nem mesmo sabia que estava tão cansado, mas se sentia pronto agora, alerta e renovado.
Uma mulher por volta dos 50, com cabelos grisalhos e um sorriso nervoso entrou na sala pouco depois e Bernard apareceu logo em seguida, James cumprimentou o general e encarou a mesa, surpreendendo-se, esperava que o pai da moça o trataria com desconfiança e descortesia, mas a mesa farta e o ambiente calmo mostravam uma situação completamente diferente, era acolhedor.

— Espero que tenha descansado bem, senhor Laurent.— cumprimentou o velho, James assentiu, olhou ao redor mas não encontrou sinal nenhum de Naiáde, talvez a moça ainda estivesse descansando.— Ela não está.— completou Bernard, James engasgou com o pedaço de pão que mastigava.

— Como disse?— questionou.

— Minha filha, ela não está. Acordou com o cantar do galo e se juntou aos soldados de ronda no treinamento matinal. A essa hora já deve estar montando algum dos cavalos, soube que Otto não liberou o pequeno Tarso para ela.— disse ele sério, constante e calmo, como se não houvesse um imenso motivo para nervosismo, mas havia para James.

— Peço que me dê licença general, preciso acompanhá-la onde...— disse mas foi interrompido antes que pudesse terminar.

— Não há motivo para isso, se acalme. Sinto que devo ter uma conversa franca com o senhor antes disso. Não se preocupe com ela, está segura, com soldados leais a quem eu me sinto tranquilo em confiar minha própria vida.— começou obrigando James a se sentar novamente e continuar comendo mesmo que o apetite já tivesse sumido desde o susto.

— Tem minha total atenção general Duzzani.— disse ele.

— Bernard. Essa formalidade é cansativa. Pois bem, presumo que sendo quem é tenha entendimento sobre o curso que a guerra entre Cargia e Belfort deveria tomar.

— Está certo.— concordou ele.— O contraste é muito grande, Belfort está mais apta para vencer, os soldados estão em maior número e estão melhor preparados para uma situação como essa. Deve se considerar também que boa parte do exército principal já pereceu na última batalha.— completou como havia ouvido da sereia dias antes.

— Eu concordo. Mas, mesmo que eu não morra de amores por Cargia, há pessoas lá a quem prezo, e outras que gostaria de ver se revirando em pura dor e desespero. Não negarei o que minha menina me pedir, mas para isso, terei que contar com sua ajuda.— continuou ele, a mulher voltou a entrar na sala carregando um bule e serviu chá nas xícaras brancas antes de sorrir e se retirar.

— Desde que não me impeça de cuidar dela ou de ser leal ao meu país, serei o quão útil for possível.

— Ótimo, ótimo. Vossa Alteza, minha filha está com sangue nas mãos, sangue sujo de homens desprezíveis que mereceram o fim que tiveram.— começou Bernard, James não sabia como mas ele parecia saber cada detalhe sobre o ocorrido no caminho, talvez fosse o tal Athos, ou talvez a sereia, não importava, ainda nutria raiva da situação de qualquer maneira.— Mas, não é o que quero para ela, nunca quis. Mesmo que ela seja o melhor soldado que eu já treinei, não quero que essa mancha escureça sua alma como escureceu a minha. Então, lhe darei minha ajuda e confiarei minha filha a você se garantir que ela não volte a sujar as mãos, se proteje-la quando estiver fora do meu alcance.— impôs o general, James piscou antes que a mente entendesse a situação e assentiu outra vez. Nunca foi de sua vontade também que ela matasse aqueles homens, mas estava grato pela ajuda, todavia, cuidar dela já era uma tarefa que vinha realizando a um mês, e era tão ou mais difícil que cuidar de um esquadrão de soldados, mas estava disposto.

— Eu estou de acordo, aceito suas condições mas primeiro, já que está depositando sua confiança em mim preciso ser honesto e confessar algo realmente grave. Entenderei se repensar ou se decidir que não sou digno de confiança.— começou, Bernard balançou a cabeça em concordância e James prosseguiu.— O motivo para a senhorita Duzzani ter sido enviada para Belfort, foi um pedido egoísta vindo de mim. Eu a vi, coincidentemente, quando me infiltrei no exército inimigo e me escondi na tenda do general Otto. Depois de uma reunião estratégica entre os comandantes foi decidido que matar os generais cargianos seria um bom passo para desestabilizar os soldados, pelo menos temporariamente. Eu fui o primeiro me oferecer, já que também sou um dos melhores soldados, mas antes que o general entrasse na tenda, a senhorita Duzzani entrou. Ela deixou uma carta e roubou um pedaço de bolo, foi o suficiente para me impedir de matar seu irmão e recuar meu exército, é mais um dos segredos que tenho guardado dela.— completou, levantou os olhos para encarar o homem mas sua expressão não parecia surpresa. Não estava irritado, pelo contrário, parecia completamente ciente dos fatos.

— Então devo agradecê-lo por tirar Naiáde daquele país antes que o pior acontecesse.— riu o homem, James o encarou confuso.— A essa altura já a conhece o bastante para saber, em Cargia ela acabaria ou casada com um nobre desprezível ou queimada na fogueira por traição. Lá, basta que uma mulher seja mais rebelde que as outras para que seja apedrejada e queimada.— completou chocando James que o olhou com surpresa.

— Parece uma medida muito extrema.— murmurou baixo.

— É sim, porém há muitos fatores assim que podem ser a causa da morte de uma mulher, ser mais inteligente, não ceder as vontades de um homem ou não se comportar de forma submissa. Naiáde está mais segura em Belfort.— declarou ele, James suspirou, sabia que na maioria do continente, as mulheres tinham menos liberdade mas não conhecia a atrocidade cometida em Cargia.— Sinceramente sinto pesar pelas jovens que não podem se defender como a minha menina pode.

— Como permitiu que sua família fosse construída num lugar assim?— questionou, sentia nojo daquele país.

— Eu não soube a princípio, e quando ficou claro minhas raízes já estavam profundas. Tudo que pude fazer foi criar uma filha inteligente e guardar minha mulher com minha própria vida. Minha família não tem sangue cargiano, Vossa Alteza, eu sou do norte, da quase extinta Phelaris, o berço da legião fantasma.— disse antes de terminar o chá da xícara e se levantou.— Estamos entendidos, reunirei meus homens de confiança as 10 horas, aqui mesmo e veremos se eles participarão dessa missão, creio que irão precisar de um bom discurso. Pode ir, siga a rua principal até o posto de observação leste, há um campo aberto bom para treinamento de arquearia montada, Naiáde deve estar lá. A propósito, ela parecia muito envergonhada esta manhã, tente tranquilizá-la se for conveniente.— completou o velho e saiu da sala, James ficou por alguns segundos, tentando descobrir se ouviu direito o que o general havia dito. Legião fantasma? Os mais hostis e mortais mercenários que já pisaram na terra?

A FILHA DO GENERAL Where stories live. Discover now