Capítulo 65

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Marisa Vilarela

-- Alô - falei.

-- Olá princesa... - sua voz era áspera, seu tom amedrontador, minha pele arrepiou ao som de sua voz.

-- Quem é? - falei cuidadosamente, embora assustada.

-- Não me conhece docinho? - e ele gargalhou e em algum momento fiquei atormentada.

-- Não!

Ele desligou e eu fiquei boba olhando o celular sem pensar ou fazer qualquer coisa até ouvir a voz de Roberta.

-- O que houve Marisa?

-- Eu não sei, não entendi direito.

-- Está bem! Vai entender. - revirou os olhos e continuou com seus afazeres.

...

O dia amanheceu e seria diferente do que eu estava começando a me acostumar, nos arrumamos para a faculdade e eu sabia que depois eu teria que correr atrás de um novo emprego.

Na faculdade foi tudo igual, aulas, distração, conversas parciais durante as aulas, e todas aquelas bobagens do dia a dia de um estudante.
Roberta estava abatida, poucas vezes pude ver seu sorriso a manhã inteira e quando finalmente soou o último sinal, ela foi para e eu, saí por aí procurando trabalho.

Depois de muito tempo andando de um lugar para o outro, resolvi voltar para casa, já passava das 05h da tarde e estava exausta, embora não tenha conseguido nada de útil, aquele exercício me fez lembrar do meu primeiro ano na cidade de Maputo, de como sofri, de como foram difíceis as coisas para mim e em algum momento essas lembranças me levaram a minha já falecida mãe.

Estava com saudades, eu desejava poder ter ela de volta.

Cheguei a casa e os rapazes estavam ausentes, a casa estava minimamente arrumada tendo em conta que a secretária teria sido despedida, fui até a cozinha para ver se havia comida feita, não foi nenhuma surpresa constatar que não tinha, eu teria de fazer o jantar.

Fui até o quarto me trocar, me surpreendi com a imagem de Roberta jogada sobre a cama gemendo e rebolando com o rosto vermelho e as mãos no abdômen.

-- O que foi? Cólicas? - perguntei exibindo um largo sorriso no rosto.

-- Porque está sorrindo? - me olhou brava.

-- Me divirto muito quando você está com cólicas. - brinquei.

-- Sua idiota! - jogou um travesseiro na minha direção e falhou, Roberta se jogou de bruços sobre a cama e gemeu alto -- saí daqui.

-- Sim chefe - respondi com humor, me troquei e então saí para fazer o jantar.

Preparei uma refeição rápida e fácil, já estava muito tarde e estava com muita fome. Os rapazes chegaram 20 minutos depois das 08h, Rony também chegou cedo, e até às 09h estávamos todos juntos a volta da mesa de jantar.

-- Como vocês estão? - disse Rony quebrando o silêncio estranho e constrangedor durante o jantar. -- estão tão quietos! - obsservou.

Raramente nos sentavamos os cinco a mesa para o jantar, ou melhor, para refeição alguma. Eram todos muito ocupados e ausentes, e na maioria das vezes a figura mais ausente era o Rony. A pesar de tudo, sempre tivemos paz e tranquilidade em casa, os irmãos de Roberta eram muito fofos e sempre animados, Rony também era um homem interessado, preocupado, muito conversador e divertido, na medida certa.

Mas nessa última noite as coisas estavam diferentes, não havia muita alegria na sala, além da decepção amorosa que minha amiga vinha enfrentando, havia ainda essa crise económica que nos aflingia.

-- O jantar está ótimo! - comentou Guilherme, noutra tentativa de quebrar o silêncio. -- esta de parabéns Marisa.

-- É verdade - concordou Pedro. -- não fazia ideia de que era tão boa cozinheira.

-- Obrigada - não consegui evitar sorrir com os comentários.

-- Obrigado Marisa, por estar aqui quando mais precisamos - disse Rony com um pouco de humor em suas palavras.

-- É Marisa - disse Roberta num tom de deboche fazendo todo mundo olhar para ela -- o que foi? - indagou com desdém retribuindo os olhares.

E ninguém mais se pronunciou até o final do jantar, arrumei tudo, lavei a louça e só depois pude ir ao quarto para descansar.

-- O que foi aquilo durante o jantar, Roberta? - eu já estava acomodada em minha cama, do lado da dela.

-- Desculpa Marisa, você sabe que estou péssima... Sem querer eu descontei em você.

-- Tudo bem! - resolvi deixar para lá, realmente não era o melhor momento para minha amiga, eu fui obrigada a entender sua situação. -- bom descanso, espero que melhore logo. - apaguei a luz do abajur e me permiti dormir.

-- Obrigada amiga. - foi a última coisa que ouvi naquela noite.

...

O alarme tocou na manhã seguinte, a mesma hora de sempre. A pesar de ter dormido, eu não estava descansada mas tinha esse compromisso comigo mesma, minha formação era importante e eu não poderia desistir dela, lutei com a preguiça pela manhã e me levantei para me arrumar.

-- Roberta, não vai levantar? - olhei para cama onde ela se deitada e minha amiga continuava dormindo como se nada fosse.

Fez-se silêncio, e eu fiquei preocupada, em quase três anos de amizade, nunca tinha visto Roberta tão cabisbaixa. Me sentei do seu lado na cama e tentei acordá-la até ouvir uma resposta.

-- O que foi Marisa? Eu não quero sair daqui. - Roberta pegou em sua coberta e se cobriu por inteiro.

-- Você não pode ficar assim! - ouvi ela chorar. -- Roberta, por favor.

-- Eu não quero Marisa, vá embora.

Eu quis permanecer ali, eu realmente quis cuidar dela mas eu nada podia fazer além de ir a faculdade, me partiu o coração sair e deixar ela lá sozinha e naquele estado.

Resolvi voltar mais cedo da faculdade para saber como minha amiga estava, fui até o quarto vê-la e estava dormindo tranquilamente, me aproveitei disso e arrumei e limpei a casa, fiz o almoço, o jantar e só depois disso tirei um tempo para estudar, peguei no celular para ver as horas e havia lá uma nova mensagem.

"Minha princesa, você jura que não me conhece? Eu vou ficar ofendido assim, e você não sabe o quanto eu detesto me sentir assim." 

Li a mensagem e apaguei de seguida sem responder, fiquei tão assustada e senti meu corpo todo arrepiar.

Quem estará fazendo isso, porque será?

MARISA - A CamareiraWhere stories live. Discover now