Gringa Grudenta - (Catradora)

By BriasRibeiro

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Ágata Catrina Macieira, ou Catra é uma jovem talentosa meio-campista brasileira que acaba de ser contratada p... More

Novo país
A menina lisa e a goleadora
Loira odonto do caralho
Após a queda
Gringa gata tatuada
Barreiras da língua (NÃO ESSA LÍNGUA)
O casamento do meu irmão
Vazando informações das linhas inimigas
Nova canária
Portugal
A concentração de Adora
I love you
Armadilha para abelhas
A inquebrável She-Ra de Etéria
Zona do Medo
Primeiros contatos
CAPÍTULO EXTRA - Um olhar sobre a República de Etéria...
Intromissão purpurinada
A revanche
O que sou para você?
CAPÍTULO EXTRA - Os povos nativos de Etéria
Duas gatinhas brincando
Noite de prêmios e videogames
Curiosidade
De volta para casa
Arrependimentos
The First Ones
CAPÍTULO EXTRA - as divisões administrativas de Etéria
Você é como ela
Eu sou uma idiota
Futuro do pretérito
CAPÍTULO EXTRA - o futebol em Etéria
Desejo
Desejo, parte 2
Eu quero surfar nas ondas do seu corpo
"Princesa", mas em português
Também te amo
Magicat
Epílogo
O frio de Zurique (CAPÍTULO BÔNUS)
O calor de Zurique (CAPÍTULO BÔNUS)
Que seja eterno enquanto durar.

Olhos oblíquos de cigana dissimulada

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By BriasRibeiro


Após o jogo contra a Alwin United no dia anterior, Scorpia e algumas das jogadoras haviam ido comemorar a bela vitória – e o primeiro gol de Catra – num karaokê. Embora Catra tenha ficado meio decepcionada de não encontrar nada dos Racionais, do Chico Buarque, Cássia Eller, e muito menos algum dos seus proibidão no sistema do estabelecimento, fora uma noite bastante divertida. Scorpia a fez cantar um dueto de algum pop gringo com ela, e a total falta de noção de Catra de que raio de música era aquela ou como deveria cantar aquela letra em gringuês fez com que a nota das duas fosse lá pra baixo, mas havia sido divertido de qualquer forma. Na metade da música, elas desistiram de tentar cantar direito e começaram a fazer palhaçadas, arrancando risadas de suas companheiras.

Já eram quase duas da madrugada quando as garotas voltaram ao hotel, e oito da manhã quando o ônibus da Red Horde de volta para a capital saía no dia seguinte. O cansaço do jogo e da noite ainda atingem Catra quando ela se senta em sua poltrona, ao lado de Lonnie, e a inclina o máximo que pode para continuar dormindo.
- Good night – ela murmura para a companheira – wake me up inside. Bright Moon.

Ela se lembra de um trecho da música de Evanescence que falava sobre acordar a cantora. Sua intenção é pedir que Lonnie a acorde quando chegarem, e em vez disso ela deixa a ponta com cara de confusa. Catra põe os fones de ouvido e dorme quase imediatamente.

A garota sente que não dorme nem uma hora quando é acordada por alguém cutucando seu ombro. E ela está certa, Alwin não fica nem a cem quilômetros de Bright Moon.
- Hmm... qual é, me deixa dormir Entrapta... – ela resmunga, e Lonnie a cutuca com mais força. Catra abre os olhos e se lembra onde está – ah tá. Foi mal aí, mana.

Catra pega sua mochila debaixo da cadeira e desce do ônibus atrás de Lonnie. Não vê Scorpia do lado de fora, então espera.

Observar o ambiente traz uma certa sensação de solidão e deslocamento, para Catra. Ela vê Netossa ir toda sorridente até o carro onde aquela sua esposa dos cabelos rosas a espera, um sorriso tão grande quanto o da esposa, e ambas vão embora juntas. Outras jogadoras também são recebidas por pessoas que Catra supõe que sejam familiares, esposas, maridos, amigos. Aquelas que não têm ninguém, dirigem-se aos seus próprios carros, vão embora sozinhas, independentes. É o caso de Octavia e da treinadora Weaver.

Algo chama sua atenção. Lonnie, que saíra logo a sua frente, é recebida por um garoto baixinho e loirinho e outro bem alto, de cabelos tingidos de verde, e embora esteja guinchando de felicidade ao ver os dois – e conforme Catra nota, ela dá um selinho em cada – ela não diz uma palavra, em vez disso gesticulando para eles, que gesticulam de volta.

Não é a mesma linguagem de sinais com a qual Catra está familiarizada. Por mais que ela tente prestar atenção, não consegue entender o que está sendo dito. "Ué, os gringo tem uma língua de sinais diferente?", ela se pergunta. A garota continua observando a interação, aos poucos desistindo de entender aquela linguagem de sinais gringa e passando a fazer teorias da razão pela qual Lonnie teria beijado ambos os rapazes. "Teoria da branca de neve, por que só ter um se eu posso ter sete?", ela canta mentalmente, e ri baixinho.

Seu coração aperta. Ela sente falta de voltar para uma casa onde ao menos é capaz de se comunicar decentemente com as pessoas, do sorriso amoroso de sua mãe e de sua irmãzinha, da admiração de seus irmãos. Por mais que não sinta falta de nenhuma das suas ex, sente falta de ter alguém que a ame assim, da ideia de ter um relacionamento assim. Sente falta de suas colegas do São José com quem conseguia se entrosar facilmente, dos seus amigos da comunidade. Não que Scorpia e Perfuma não sejam gentis, mas... simplesmente não é a mesma coisa. Ela sente quase como se fosse uma "café-com-leite" por aqui. Como se as pessoas só fossem gentis com ela e apenas a poupassem do mundo real, dos adultos, por ela ser uma estrangeira. Por não falar inglês. Por ser dependente, como uma criança.
- Hey, Wild Cat – Scorpia é a última a sair do ônibus. Ela agarra Catra pela cabeça e a puxa para um meio-abraço – já falei que aquele seu gol foi incrível, não falei?
- Incredible. Yes, I'm incredible – concorda Catra, arrancando risadinhas de Scorpia. As duas vão até o carro da centroavante e logo estão em casa, que parece vazia ao chegarem – want to play videogame? – a brasileira convida. Scorpia sorri como quem se desculpa por algo.
- Oh, na verdade... eu tenho compromisso daqui a pouco, uma sessão de autógrafos numa das lojas do clube.

Catra não entende bem o que é dito, mas a julgar pela expressão da colega, sabe que está sendo rejeitada. Ela gesticula um "não se preocupe" e vai se sentar no sofá com o celular. "Faz tanto tempo que eu não saio com alguém", pensa, reparando em como mal deu atenção à sua vida social desde que chegou em Etéria: entre os treinos muito mais puxados da Red Horde do que o que estava habituada, a terapia de reabilitação, as aulas de inglês e o mero fato de ainda estar tentando se adaptar a um país estrangeiro têm a feito negligenciar essa parte de si.

Catra decide baixar o tinder. E decide que nunca vai contar pra ninguém que um dia tomou essa decisão. Mas numa cidade tão grande quanto Bright Moon, deve ter algumas garotas com quem ela conseguiria se comunicar, certo?

Ela seleciona algumas das suas melhores fotos e decide tentar escrever sua bio, mesmo que em inglês, como forma de praticar.

Ágata Catrina Macieira, 19 anos
Trabalha em Red Horde Athletics
Mora em Bright Moon City

hi my name is Catra, I am profissionall football player from brazil
my english is bad sorry
i play to the red horde
lesbian
i dont drink alcool

Ela olha por cima do ombro ás vezes para ver se Scorpia não saiu do quarto e está espiando sua tela. Não acha que seja do feitio de Scorpia ficar espiando os outros, mas já está envergonhada o suficiente de ter baixado tinder e não quer que ninguém descubra sobre isso. A maioria das garotas tem suas bios escritas em inglês – isso as que ao menos têm algo escrito na bio – forçando Catra a gastar seus conhecimentos na língua, até que por fim ela desiste e passa a arrastar pra direita ou esquerda baseado apenas na aparência das garotas. Ela para num rosto conhecido de cabelos rosas, rindo baixinho.
- E aí, Glitter – por curiosidade, decide ler a bio da garota.

Glimmer Moon, 22 anos
A 6 quilômetros de você
Trabalha em Royal Grayskull
Estuda em Bright Moon University
Mora em Bright Moon City

1,56, I might be small but my heart is big Ù.Ú
Horny shorty >.>
pls for the love of the goddess dont ask me "why am i here", everyone knows the answer ( ._.)
Professional soccer player :o
Bright Moon University student, physical education major >:3
Proud bisexual <3
#GOROYALGRAYSKULL \O/
Send me cat and doggo pics pls :3
If u gimme food I'm instantly in love with u :p
Antifascist – feminist
TRANS PEOPLE ARE FUCKING VALID!

Surpreendendo a si mesma, Catra consegue entender praticamente tudo. Algo sobre ter um coração grande, jogadora profissional de futebol, alguma coisa de universidade e educação física, bissexual, "vai Royal Grayskull", alguma coisa de gatos, alguma coisa de comida e amor, antifascista, feminista, "pessoas trans são válidas". Catra reflete por longos momentos se deve dar like na garota. Ela não faz realmente o seu tipo, mas poderia ser alguém legal para conversar. Algumas coisas em comum já têm pelo menos: antifascistas, jogadoras de futebol, "pessoas trans são válidas". "Tá, beleza", ela acaba cedendo a si mesma e arrasta para a direita uma foto de Glitter de biquíni sensualizando para a câmera junto de um cara que Catra reconhece como Bow, ambos ao lado de uma piscina, com Glitter segurando uma latinha de cerveja numa das mãos e usando óculos escuros.

Catra continua passando alguns perfis, quase todos em inglês, arrastando uns para a direita e outros para esquerda sem que nenhum realmente se destaque, até que uma garota chama sua atenção.

Melina Santángel, 18 anos
A 2 quilômetros de você
Trabalha em The Grasshopper
Mora em Bright Moon City

¡Hola!
Chica Mexicana livin' da dream in Bright Moon! Or trying...

E a foto de uma garota de pele castanho-claro, similar ao tom de pele de Catra, longos cabelos castanhos e sedosos, corpo magro, um sorriso de canto de boca malicioso combinado a... como era aquela frase que sua professora de português sempre repetia sobre aquele livro que ela deveria ter lido no terceiro ano, mas não leu? "Olhos oblíquos de cigana dissimulada". Ela nunca conseguiu entender o que isso queria dizer, mas se tivesse que descrever o olhar dessa garota de uma forma, seria assim. Por mais que não faça ideia do que a palavra "oblíquo" significa ou o que sejam "olhos de cigana". Ela veste saia branca leve, camisa decotada com mangas bufantes, salto alto negro, e tem um dos braços cobertos por tatuagens que fazem Catra pensar em cobras desenhadas num estilo tribal.

"Ela fala espanhol", pensa Catra, excitada com a ideia de poder se comunicar mais facilmente com alguém, e dá uma olhada nas outras fotos. "E é gata e estilosa pra caralho". Ela não tem dúvidas e desliza para a direita, e no momento seguinte ela ouve Scorpia saindo do quarto. Ela vem com um sorrisinho todo animado para a colega brasileira.
- Ei, eu falei com a minha empresária sobre, você quer vir comigo?! – Catra apenas encara a outra, sem ter a menor ideia do que foi dito. Repara em suas roupas: não veste sua jaqueta de treino e bermuda casuais, em vez disso tem o rosto todo maquiado e usa um elegante vestido negro – a sessão de autógrafos, Catra! Você, quer, vir, comigo?
-
Onde?
- É uma... loja oficial da Red Horde, no Royal Mall Center – ela explica – é um centro comercial, Catra!
- Um "mal"? Quê? – a expressão de Catra é cada vez mais confusa – a gente tá indo pra algum desenho animado enfrentar o mal? Num saquei não...
- Loja – Scorpia mantém o linguajar mais simples possível para ver se a outra entende – loja de futebol. Sessão de autógrafos. Você, quer, vir?
- Orogréf séchom? – a brasileira estranha – que que é orogréf? What is orogréf?

Por fim, Catra acaba aceitando acompanhar a outra, por mais que não saiba exatamente o que está acontecendo. Scorpia ainda tenta fazer a amiga usar alguma coisa mais elegante, mas não encontra nada do tipo no meio das roupas da outra: somente uma coleção interminável de moletons, jaquetas, bermudas, bonés, toucas, regatas, camisas de futebol e tênis esportivos, e quando tenta convencê-la a experimentar um vestido de Perfuma para ver se serviria, Catra se recusa terminantemente a provar o vestido. Por fim, Scorpia desiste e permite que Catra use suas roupas casuais: regata larga e branca, touca e bermuda cinzas, tênis esportivo da Nike preto.
- Ah, você vai adorar isso, gatinha! – Scorpia dirige o carro feliz da vida, enquanto Catra distraidamente observa a paisagem pela janela.
- Aham. Okay.

As duas chegam ao que Catra reconhece como um shopping, e ela segue Scorpia pelos corredores do shopping, curiosa com onde estão indo. Por fim, chegam a uma loja no segundo andar, onde uma pequena multidão se aglomera. Catra logo reconhece o escudo da Red Horde no letreiro da loja e várias pessoas no meio da aglomeração usando as camisas vermelhas do time.
- Oloco – a brasileira deixa escapar, enquanto passa com Scorpia pela multidão que, ao perceber sua presença, começam a enchê-la de perguntas, gritinhos agudos de fãs desesperados, flashes de fotos. Catra passeia os olhos admirada pela multidão, e logo começa a escutar seu próprio nome ser berrado também. Não entende muito do que dizem além disso, e duvida que entenderia se estivessem falando português, mas não pode evitar um sorrisinho metido e um sentimento de "sou foda pra caralho". Após conseguirem atravessar a multidão, Catra e Scorpia adentram uma loja.

A loja da Red Horde tem as paredes externas pintadas em vinho e branco, e as internas são vermelhas, vinho e branco, com um enorme escudo do time nas paredes do fundo, cabides com diversas camisas da equipe por todos os lados, bolas de futebol, bandeiras, luvas de goleiro, entre outros produtos. Na parede à esquerda, Catra nota uma enorme pintura de Netossa, Scorpia e Lonnie, com Netossa no primeiro plano, pisando numa bola, olhar no horizonte e pose heroica, e Scorpia e Lonnie logo atrás dela, como se a estivessem seguindo, e o cenário é uma enorme torcida num estádio. Na parede oposta, Catra se surpreende com o que vê: parece uma versão 20 anos mais nova da treinadora Weaver, usando uma versão levemente diferente da camisa que possuem hoje, um número 7 estampado no shorts, olhando para o lado com uma expressão calma e estoica. Catra nunca havia pensado nisso, mas faz sentido que a treinadora Weaver seja uma ex-jogadora. E aparentemente, uma ex-jogadora importante o suficiente para ganhar uma pintura própria e solitária nas paredes da loja. Um tanto embasbacada, ela cutuca o ombro de Scorpia e aponta para a pintura.
- Oh, hm. Você não sabia, não é? – comenta Scorpia, sinalizando para que Catra a siga. As duas vão até uma pequena mesa com duas confortáveis poltronas preparadas e sentam-se uma ao lado da outra. Scorpia pesquisa algo em seu celular e então mostra para Catra uma foto de Shadow Weaver usando uma versão antiga do uniforme da seleção Eteriana: camisa branca com detalhes amarelos, vermelho, meias amarelas com detalhes vermelhos – ela é uma lenda do futebol por aqui. Foi parte do Quarteto Fantástico de Etéria que ganhou tudo nos anos 90.

Catra não entende muito do que é dito. O fato de ter uma multidão barulhenta do lado de fora e um cara de terno parado à sua frente falando alguma coisa para essa multidão num microfone dificultam ainda mais a sua capacidade de compreensão e concentração. A brasileira encara a companheira eteriana com os olhos vazios por vários segundos, e finalmente diz:
- I don't understand nothing – Scorpia dá um sorrisinho para a amiga e bagunça sua touca.
- Eu explico em casa, Wild Cat.

Apesar de terminar o dia com as mãos doendo de tanto escrever, é divertido. Catra nunca havia participado de uma sessão de autógrafos antes, e embora não entenda metade do que os fãs dizem, sente-se orgulhosa de si mesma. Vê vários torcedores usando a camisa com o número 23 e o seu nome nas costas, algumas até na versão secundária da camisa do time, que é branca em vez de vermelha e ela mesma nunca usou num jogo oficial. Uma garota de uns 15 anos a desafiara para um campeonato de embaixadinhas – algo que ela demorou para compreender, mas do qual foi incrivelmente divertido participar, já que ela pôde se exibir com toda a sua técnica e ganhar aplausos até mesmo do homem de terno com cara de chato que organizava o evento – e vários fãs pediram por fotos com ela e Scorpia.

Ela se sente admirada, satisfeita, reconhecida. Jogou apenas dois jogos oficiais pela Red Horde e já possui essa legião de torcedores a apoiando. Se lembra de quando costumavam ser apenas seus colegas da escola, seus amigos da comunidade. Se pergunta se eles estão orgulhosos, vendo onde ela está chegando quando tudo que ela mesma esperava para a própria vida era trabalhar como faxineira por 50 anos e ganhar um salário mínimo de aposentadoria.

Ao final do evento, quando o último fã finalmente vai embora, Catra se levanta e se alonga, aliviada por finalmente ter acabado, morrendo de cansaço e doida para se mexer um pouco. Pelo canto dos olhos, ela vê Scorpia no caixa gesticulando para ela.
- Ei, Catra! Vem cá! – Catra obedece e quando está quase alcançando a amiga, é recebida por uma camisa sendo jogada de surpresa na sua cara.
- Quéqueisso, que falta de educação – Catra reclama em tom de brincadeira, tirando a camisa da cara e passando seus olhos por ela. É uma camisa vermelha da Red Horde, bastante padrão – huh. E aí?
- Olha atrás – Scorpia gesticula para que ela vire a camisa. Catra demora um pouco para entender o gesto. Do outro lado, ela encontra seu nome escrito em caixa alta com o seu número 23.
- Porra mano, muito daora – elogia ela, dobrando a camisa cuidadosamente e tornando a colocar no balcão. Scorpia pega a camisa e devolve nos braços da amiga.
- É um presente, boba. É sua agora.
-
Cê tá me dando? You are dando me? Pera, to me? Como que fala "dando" nessa caralha?
- Você por acaso não saberia como falar "presente" em português, saberia? – Scorpia pergunta ao homem do caixa, rindo. O homem nega com a cabeça e a garota decide apelar para a sua velha estratégia de usar o google tradutor.
- Então you really are dando to me – conclui Catra, com um sorriso metido e pendurando sua camisa nova no ombro.

No caminho de volta para casa, Catra checa seu tinder. Várias das garotas haviam retribuído seu like durante essas horas em que esteve ocupada, mas a maioria delas não enviou mensagem. Não vê Glimmer na lista. Vê a tal da garota mexicana, no entanto. Catra não hesita em mandar mensagem. Por um lapso, começa escrevendo em português, então apaga e troca para espanhol. Ou melhor, portunhol.

Ágata Catrina

hola chica hermosa

cuemo estás

Para a surpresa de Catra, uma resposta começa a ser digitada quase imediatamente.

Melina

Muy bien, gracias!

Y tu, como estas mi hermosita?

Ágata Catrina

estoy bien

yo no falo espanhol

Melina

You mean hablo?

Want to speak English?

Ágata Catrina

english bad too

espanhol mas facil

no se preocupas puedemos falar asi mesmo

Melina

Jajajajajaja

You're cute

Estoy trabajando ahora

Quieres una bebida?

Soy una barman en el Grasshopper

Oh espera, no bebes alcohol ¿verdad?

Ágata Catrina

no se preocupas

yo puedo beber refrigerante

Melina

¿Refrigerante?

Catra checa onde fica esse tal de "Grasshopper" e realmente não é longe de casa.
- Hey, Scorpia – chama Catra, mostrando a tela do celular com o endereço do local.
- Ah! Você quer ir lá? Podemos ir!
-
Valeu.
- Mas e aí, que ideia é essa do nada? Achei que você não bebia!

Catra não tem a menor ideia do que foi dito, então apenas encara Scorpia longamente. Ao perceber, Scorpia suspira e sorri, achando graça no comportamento da amiga.
- Por que, você quer, ir lá?
- Want? Querer? – se pergunta Catra – o porquê de eu querer ir pra lá? Huh... – Catra abre o perfil do tinder de Melina e mostra para Scorpia.
- Ooooh! – Scorpia parece um tanto surpresa, mas assente em aprovação – ela é bonita. Então, é um encontro, é? – provoca Scorpia.
- "Date"? Huh... 2 de março de 2020, como fala isso em inglês...? – ela se pergunta, já digitando no google tradutor e colocando para Scorpia ouvir. A platinada encara a brasileira surpresa e começa a rir. Catra não entende a razão.

Ágata Catrina

mi amiga estais me levando para el bar

Melina

C'ya hottie ;*

"Mano, quê?", Catra se pergunta, confusa com a última mensagem da garota. Simplesmente não consegue imaginar o que "c'ya" pode querer dizer, ou ainda o que ela quis dizer com "hottie". A única coisa que vem à sua mente ao pensar na palavra são os dogões que comia na lanchonete na frente da escola, na época do ensino médio. Já "c'ya", não tem teoria alguma.

Scorpia deixa Catra na frente do estabelecimento, um bar muito maior e mais chique do que Catra imaginara. Não se parece nem um pouco com o boteco da sua comunidade natal, e sim com algo saído de um filme de Hollywood. Aquelas coisas que só são reais na cabeça dos gringos. "Talvez realmente seja real para os gringos", Catra pensa, assombrada.

A fachada é consideravelmente grande, com paredes pintadas em verde e castanho, como se simulassem madeira. Uma placa similar a essas de tavernas de filmes de fantasia pende logo acima da porta, com um desenho estilizado de um gafanhoto ao lado do nome do local, e há uma grande vidraça de cada lado da grande porta de madeira, deixando o interior fino de mesas e cadeiras de madeira escura, lustres, tapeçarias e quadros de aparência cara, todo à mostra. Catra suspira, um tanto insegura de entrar num lugar chique desses, e junta coragem para empurrar aquele portal digno de mansão.

O local se encontra relativamente vazio, com alguns funcionários vestidos em camisas sociais brancas com coletes e calças negras e sapatos polidos, e uns poucos clientes espalhados pelas mesas do local, boa parte deles vestido em roupas que faz Catra associá-los a um bando de burguesinhos ou playboys. Pelo canto dos olhos, Catra localiza um lance de escadas que leva a um segundo andar.

Um dos funcionários vem até ela, falando aquela língua que ela não entende. Ele sorri gentilmente, espera que ela respondesse algo.
- Ah não mano, mais um maluco falando gringuês comigo – resmunga Catra – Melina? Where Melina?

Sem perder o sorriso, homem faz sinal para que ela o siga, atravessa todo o salão e entra numa parte dos fundos um pouco mais privada, com paredes vermelhas e mesas e cadeiras numa madeira ainda mais escuras que da sala anterior, apenas uma mesa ocupada por dois homens de meia-idade de terno conversando baixinho e bebendo algo de uma garrafa chique que Catra supõe ser uma daquelas bebidas que valem mais que a casa da sua mãe. O funcionário que guiara Catra aponta na direção de um balcão onde duas bartenders conversam, uma branca, loira e alta, e a outra, Catra logo reconhece como Melinda, usando aquele mesmo uniforme de camisa branca e colete que as outras, com uma gravatinha borboleta vermelha que cai incrivelmente bem nela.
- Valeu aí, chapa. Thanks – ela agradece e caminha até o balcão, exibindo seu melhor sorriso de sapatão pronta pro combate. As duas bartenders param o que estão fazendo e lançam olhares para Catra que a fazem pensar nessas líderes de torcida de filme. A loira cochicha algo no ouvido de Melina, que ri baixinho e tenta tampar a boca, para depois empurrar a garota enquanto grita um "oh my God shut up!", deixando Catra orgulhosa por entender exatamente o que foi dito. Melina se aproxima do balcão ao mesmo tempo que a brasileira se senta num dos banquinhos. Quem assiste a cena poderia muito bem acreditar que se trata apenas de uma bartender indo atender uma nova cliente.
- Bem-vinda ao The Grasshopper – Melina a cumprimenta num espanhol sensual e passa a língua lentamente pelos lábios, como se estivesse prestes a comer algo apetitoso. Catra gosta da provocação. Apoia um dos braços na bancada e finge analisar o cardápio na parede atrás dela – gostaria de beber algo?
- Essa boca aí sabe só pra falar gringuês? Ou sabe dar uns beijo também? – flerta Catra, arrancando risadinhas da outra.
- E onde você gostaria de beijar? – a mulher pergunta cheia de malícia, apoiando-se no balcão e aproximando um pouco mais o rosto do de Catra. Nesse ponto, ela duvida que um espectador ainda acredite se tratar meramente de um atendimento comum, e calmamente passeia seus olhos pelos arredores. Os dois caras de meia-idade não dão a menor atenção à sua interação, então ela torna a encarar Melina e oferece um sorrisinho malicioso.
- Cê num tá trabalhando agora, não? – provoca, fazendo a outra rir e jogar o corpo pra trás – vamo lá, me sirva. Traz um guaraná e uma coxinha.
- Fazer o quê?
- Um guaraná e uma coxinha, fia. Anda, é pra hoje.
- Um o quê?! – ela continua sem entender.

A bartender loira esconde o riso atrás das duas.
- Ah não, mano. Que sacanagem. Vai dizer que aqui na gringolândia também não tem nem coxinha nem guaraná? – Melina dá um sorrisinho amarelo – pô, véi. Tem noção que eu não comi UM pastel de feira desde que cheguei?
- Vou propor algo – começa Melina, tornando àquele sorriso de líder de torcida – eu te faço um drinque, não-alcoólico, e você me conta um pouco sobre você. Que tal?
- Claro – Catra devolve aquele olhar de interesse malicioso dela com um sorrisinho de canto de boca.

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