37 - Solidão

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É claro que isso era o menor de um problema: CG dono do morro e Natacha fora da minha vista!
Finalmente eu podia encher a cara e dar trabalho pra alguém, mas minha cabeça tava a milhão e ainda pensava na filha da puta daquela delegada escrota. As coisas que ela fez comigo me fazia embrulhar o estômago, fodia meu psicológico por isso eu sou obrigado a pensar em outra coisa.

- Cadê a chave do fusca do Gentil? - Rato me olhou curioso.

- Última vez que eu vi tava la em cima na lojinha. - alguém comentou e eu consenti.

O Rato sabia que eu tinha alguma ideia genial na cabeça mas vamos confessar que eu só tinha ideia merda.
No caminho para a lojinha, peguei aquele antigo celular (que a delegada me deu) e disquei seu número.
Chamou algumas vezes e logo caiu na postal.
Entrei na loja, que era a antiga casa do Patrick, peguei a chave do carro do nosso querido Gentil, uma Taurus carregada e escrevi uma breve mensagem e enviei para a delegada.

"precisamos ter uma conversa bem seria, doutora

pessoalmente
att; playboy"

Liguei o carro, encostei a cabeça no volante e agarrei o velho cordão da minha mãe.
De onde ela estivesse, ela sabia que eu tava me metendo em encrenca mas também sabia que era por ela. Enquanto meu pai, de onde estivesse também, estaria muito bravo por eu ser um ferrado sem juízo.
Depois de uma oração de dez minutos, conferi o porta-luvas e encontrei uma paranga de maconha, juntei com minha seda blunt e desci o morro com o beck pra fora e som estralando.
Fui parado pelo Rato quase no fim do morro, que se enfiou na frente do carro.

- Quer minha ajuda? - escorou o braço na janela. Enquanto eu congelei o olhar no volante. - Eu tô bolado contigo mas nós é irmão, tamo aqui um pelo outro. Não é?

- É. - engoli a saliva e soltei a respiração. - Tamo junto sempre, Rato. - encarei ele. - Mas eu tenho que fazer isso sozinho, mano... Eu não sei se eu volto de onde eu to indo.

Rato abaixou a cabeça e ficou apenas o som fazendo barulho mas o silêncio entre nós dois reinou.

- Playboy, eu amo você, mano e se alguma fita acontecer... - ele me olhou com profundidade. - Eu te vingo, menor.

Apertei sua mão e recebi um beijo na cabeça, logo pensei no meu pai.
Liguei novamente o carro e voltei a descer o morro.
No fim da favela o celular apitou, ja puxei o freio de mão e agarrei o celular com tudo.

"se você aparecer no meu caminho, eu te mato
Sandra"

O ódio em mim reascendeu mas eu precisava falar umas coisas na cara dela.

"a gente fala por bem, ou por mal, vou deixar você escolher essa vez"

Acabei fumando aquela maconha tão de pressa que quase não deu brisa, depois de quatro minutos ela respondeu com um endereço, imediatamente coloquei no GPS e fui a caminho da desgraça.
O caminho foi tranquilo, passei pela mesma rua quatro vezes pra conferir se não tinha nenhuma pegadinha mas o carro dela estava lá.
Os vidros fechados me agoniavam, jamais saberia se somente ela estaria ali.

"to aqui"

Respirei fundo.
Havia estacionado o carro no fim da rua, ainda estava ligado caso desse algo errado.
Eu confesso, não saber o que estava fazendo, era um misto de arrepio no cóccix que lambia do rego até meu pescoço, foda não saber o que vem daquela mulher.
Minha arma secreta era a minha amiga de cintura, aposto que por essa a Sandra também não esperava.

"pode subir no ap, quarto 29
Sandra"

Se quer saber, eu já não sei se tem nome essa minha atitude de bosta, talvez isso seja solidão. Sei lá, depender de alguém que te amassou (literalmente) e mentiu, é uma dependência meio psicopata...
Mas confesso, ela não saia da minha cabeça, se era ódio ou amor eu não sei, mas essa era a terceira coisa que fodia com meu psicológico.

Antes de sair do carro, conferi a arma na cintura e a estabilidade emocional, poucas coisas estavam "ok" naquele fim de tarde.
Atravessei a rua vagarosamente e adentrei no prédio de cor clara.
Fui mais ou menos recebido pelo vigilante, que logo notou minhas tatuagens e, provavelmente, me julgou até a morte. Por fim, mostrou o elevador e disse o andar certinho.
De frente àquela porta imensa amadeirada, me veio um calafrio que tomou a espinha, como se fizesse muito frio e eu estivesse peladinho!
Toquei a pequena campainha, bem rápido, capaz que foi difícil ouvir, mal cheguei e já queria cair fora.
Nem deu tempo de gostar disso, já tinha me arrependido quando mandei aquela sms.

A porta abriu, aquela desgraçada estava linda como sempre, com um tom de pecado e meio malévola...
Confessar que ela me trazia bons pensamentos era um erro, isso eu tinha que guardar pra mim.
Em segundos, assim que meu olho bateu no dela, houve um flashback! Algo bem maluco aconteceu dentro da minha calça jeans apertada, que parecia ficar menor de acordo com as memórias.
Ah, quem dera se aquela Blazer falasse!

- Você tem dez minutos. - a voz dela saiu rouca e logo cortou minha brisa.

Entrei no apartamento, pequeno porém aconchegante e com cheiro de guardado. Talvez ela não abrisse muito as janelas daquele troço, minha sinusite já começou a falar mais alto.
Por conta e risco, andei nos cômodos procurando alguém, vai que ela não estivesse ali sozinha e tudo aquilo fosse armação. Pois é, fiquei traumatizado da última vez...
Enquanto ela nem se deu o trabalho de me seguir pra ver o que eu faria nos cômodos, apenas se sentou no sofá e esperou com paciência.

- Espero que realmente esteja sozinha aqui, delegada. - soltei a respiração e me sentei em outro sofá. Nossa aproximação nesse momento poderia dar em coisas estranhas.

- Eu não tenho seu tempo, Playboy. - cruzou os dedos ao mesmo tempo que cruzou as pernas, me encarou firmemente.

- Primeiro, eu quero saber o que eu fui pra você. - ela arqueou a sobrancelha direita. - Você me usou igual fez com o Patrick?

- O que?! - ela riu. - Por favor, Playboy... Você sabe que o Patrick era bem mais inteligente, ele sabia o que eu queria, não precisei usar ninguém.

Essa parte dela eu não conhecia... Confesso que gostei mais dessa, faz um pouco de jus ao cargo que ocupa.
Mesmo assim, essa menina má precisava de uma lição.

- Então você fodeu com ele por livre e espontânea vontade? - dei meu melhor sorriso, aquele debochado, que guardei por meses.

- Era só isso ou mais alguma coisa? - percebi sua impaciência.

- Tem outra coisa... Tu disse que foi o Dylon que matou minha mãe, mas eu já não sei mais. - neguei com a cabeça. - Eu entendo suas palavras mas não consigo ver verdade nelas. Fico me perguntando o que o Dylon viu em você, não acredito que ele tenha visto algo além de beleza. - levantei do sofá. - Você fede, Sandra. Você fede muito mais do que eu, meu dinheiro e toda aquela favela inteira, com anos de sujeira. Fede de longe.

- Você veio de longe, na minha casa pra me confrontar? - ela se levantou também. - Não me faz te silenciar pra vida toda, eu cansei de te dar chances.

EU VIM DA RUA - MC Kevin (Kevin Bueno)Where stories live. Discover now