57 - Desabafo

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Transamos pela casa inteira, foi um domingo complicado e incansável.
Eu estava desprevenido quando Camila se deitou ao meu lado na cama e disse que estava pronta pra saber um segredo quente sobre mim.

- Pode contar... É sua vez agora. - afofou o travesseiro ao meu lado.

- Que curiosa. Não deu nem tempo de descansar. - ela revirou os olhos e me cutucou como se fosse pra eu dizer algo depressa. - Tá... Deixa eu ver...

O que eu podia falar pra ela? O que eu podia falar que não assustaria ela por completo?

- Bom, Felipe... Você já sabe. Dezenove anos, morava no RJ, na baixada... E meus pais não estão vivos. - ela me olhava assustada agora. - Pois é, sou só eu. Sem filhos, sem avós e sem netos.

- Meus sentimentos... - seu olhar ficou vago.

- Tudo bem, eu já sou de boa com isso. - alisei seu braço, já que estava virado de lado pra ela.

O clima ficou diferente, parecia que ela sentia pena de mim e isso me incomodou um pouco, confesso.

- Tá com fome? - sussurrei e ela voltou a me olhar em seguida concordou com a cabeça. - Vamos dar um jeito nisso.

Pedimos um lanche e sentamos no sofá assistindo televisão, era estranho fazer isso, eu nunca tinha feito metade dessas coisas. Chegou um tempo que até batia um certo desconforto, eu fiquei meio perdido, essa era a verdade.
Durante esse tempo, descobrimos coisas um sobre o outro e foi interessante pra gente conseguir se conhecer um pouquinho melhor.

Camila era dona de uma loja de roupas, morava com a mãe e o pai, filha única mas não parecia ser daquelas mimadas que tinha tudo na mão, muito pelo contrário. Também soube que tinha feito faculdade de ADM e que ela tinha vinte e quatro anos, já teve um relacionamento antigo desde os dezesseis anos mas era muito bem resolvida com isso, ela não quis entrar em detalhes mas pelo o que entendi houve uma traição da parte do cara.
Parecia uma menina pacata de uma cidade do interior, aquelas inteligentes e quentes ao mesmo tempo, fiquei curioso...

- Fico feliz da sua vida ter sido assim, você teve oportunidades, seus pais são cabeças e te deram apoio, estão aqui ainda, né. Isso conta muito.

- Eu te entendo, Felipe... Sei que foi difícil pra você, não consigo imaginar as coisas que você passou.

- É, mas isso é passado. Eu tô pronto pra recomeçar de novo, tô aqui nessa vida nova pra provar isso pra mim mesmo. Tô dando meu melhor, papo reto.

- Eu sei que sim. - ela deu um sorriso em forma de consolo. - Quero poder acompanhar esses passos de pertinho. - eu sorri de volta.

- Valeu pela força. - ela segurou em minha mãe, fazendo um carinho bom mas o foda foi que não desviou os olhos do meu.

Ficamos uns segundos daquele jeito, um encarando o outro numa eternidade curta.
Sei que eu me apego fácil, sei que isso era perigoso, toda essa carícia e conversa... Puta que me pariu, em. Vou tentar não cair em tentação de me apaixonar e estragar tudo outra vez.
Ela me beijou, com uma boca macia e um gosto diferente, foi um beijo diferente. Parecia algo mais...

- Então... - arranhei a garganta. - Eu tenho que dormir... Amanhã é cedo.

- Não, claro. - ajeitou o cabelo e se afastou. - Eu também tenho que ir. - se levantou e foi juntando suas roupas, entrando no banheiro - Amanhã é cedo pra nós dois.

A porta bateu.
Revirei os olhos e mordi o travesseiro.

- Mas que burro! - sussurrei.

Ela demorou uma eternidade no banheiro, devia estar falando o mesmo pra si mas quando saiu, tivemos que parecer normais e adultos.
Levei ela até o portão e me despedi com um selinho e um aceno rápido, até vê-la partir com o carro.
Arfei.

- Meu Deus, Felipe... - neguei com a cabeça e bati o portão.

Entrei pra casa encabulado com o furo que dei, de mãos na cintura e sobrancelhas erguidas.
Será que ela ia voltar depois dessa?
Era a única coisa que martelava na minha cabecinha de camarão.
Na real, eu tava era com medo de sentir o que eu senti pela Natacha e depois pela Sandra, esse seria meu eterno karma. Não podia negar que Camila parecia realmente ser diferente mas não quero arriscar minha nova vida, batia um desespero a ponto de achar que tudo iria por água a baixo e eu ficaria só de novo.
Melhor não. Deixa ela lá.

Bolei um beck enquanto me organizava pra dormir, coloquei um som e deixei a janela aberta, pude me deitar com calma e com o cinzeiro em mãos. Apoiei o braço atrás da cabeça e encarei o teto escuro, eu sabia bem que não ia conseguir dormir.
Peguei o celular e encarei por alguns segundos antes de procurar alguma rede social de Bruna, estava pronto pra encontrar qualquer coisa relacionada a Sandra mas simplesmente não tinha nada, era como se ela tivesse sumido na neblina também...
Rato estava lá, em várias fotos no seu feed, inclusive se casando.
Quase chorei só de ver, a felicidade no rosto dele era imensa.
CG estava namorando e parecia um blogueiro famoso, vários seguidores e fotos no feed bonitas, sempre com a morena ao lado.
Fiquei feliz de saber que nosso plano tinha funcionado!

Sorri por alguns segundos mas em seguida meu olho marejou.
Não sei dizer com exatidão o que eu senti, só sei que fui uma mistura e eu me peguei chorando pela primeira vez de saudade... Só não sabia de quem.

EU VIM DA RUA - MC Kevin (Kevin Bueno)Where stories live. Discover now