35 - Decidir Custa Caro

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- Quê? - seu corpo não pareceu executar a mensagem com clareza e ela se levantou totalmente desordenada. - Você tá me dizendo que... Que você sempre soube disso? Por isso a gente é amigo?

- Não! - levantei e espalmei a mão sinalizando em negação. - Eu te conheci primeiro! Na escola, lembra?

- Lembro, claro. - ela parecia analisar a situação com calma.

- Depois eu conheci sua mãe. - ela grunhiu tentando entender. - E por último o seu pai.

- Cara, a gente ama você. Meu pai te ama, Felipe. Porra! - mordeu o lábio e colocou as duas mãos na cabeça.

- Bruna. - segurei seus braços. - Você não tá deixando eu falar. - ela me encarava com a respiração desordenada. - Ei, me escuta! Senta, por favor...

- Tá! - respirou fundo e sentou-se na cama.

- O cara que me apresentou a rua, foi o Patrick. - pronto, a Bruna ia surtar. - Foi seu tio. - prendi os lábios.

- Caralho, Felipe... - eu não sei o motivo, mas ela começou a chorar.

- Bruna, eu não vou matar seu pai, nem nada parecido... Eu entendo ele. - puta que pariu, que mentira. - Mas a sua mãe, ela matou seu tio.

- Você não tá falando a verdade? - balancei a cabeça positivamente. - Ai minha nossa. Faz todo sentido isso...

- Como assim? - ergui a sobrancelha.

- Meu tio dava muito trabalho, você não sabe... Nossa, que bagunça. - se jogou de costas na cama e respirou fundo.

- Bruna, tem mais uma coisa... - ela se levantou e me encarou de novo. - Eu sou o frente do morro. Eu assumi o lugar do Patrick... A favela é minha, sua mãe é delegada então...

- O que? E o Rato? - ela transpirava.

- O Rato... Ele é bom, não desiste dele. Ele é velho. - eu ri pra descontrair. - Tá mais que na hora dele sair disso.

- Eu vou tentar entender isso tudo... Eu juro. - fechou os olhos devagar.

Eu abracei ela, firme. De verdade eu gostava muito dessa garota.
Torcia pra tudo dar certo, independente se eu ficasse pra assistir o enredo dessa história.
Destranquei a porta e ela me acompanhou até o portão.
Não houve mais troca de palavras e eu achava que tudo estava em paz, ainda não sei dizer se foi certo ou errado.
Doía saber que a Bruna tava nisso agora, mas pelo menos eu não precisava confrontar mais a Sandra, agora ela iria vir até mim quando Bruna confrontasse sua mãe.
Pedi pra que mantivesse segredo pro Dylon, era muito importante ele não me odiar a essa altura do campeonato.
Eu vou me contentar com o ódio apenas da Sandra, pra mim tava ótimo!

- Mano, eu tive que contar... Esse momento vai valer muito a pena, a Sandra vem e a gente derruba ela. - Rato estava putaço.

- Porra, ai tu me fode. - passou a mão na cabeça agoniando. - Quer me fuder, me beija.

- Rato, a Bruna não desistiu de você. Ela vai ligar! Confia, papo reto.

Parecia que Deus me escutava, ou alguém, só não sei se era do andar debaixo ou de cima... Mas assim que profetizei, o celular do Rato tocou e pela respiração de alívio puder perceber que era a Bruna.
Ele saiu da casa com o Nextel na orelha, parecia triste mas animado dela ter ligado.
Agora meu segundo passo era destruir cada porco corrupto daquela favela, eu tinha certeza que ia conseguir.
Na favela o aviso foi pra morador ficar em casa, fechar tudo e é agora que esses filhas da puta vão escolher um só lado.

Ser polícia ou ser cria da favela.

- Eu não quero saber, tá ligado? - resmunguei. - Eu te fiz a porra de uma pergunta, não enrola não!

O silêncio reinou. CG estava jogado na poltrona, com um baseado aceso entre os dedos, cerrava os olhos no policial esperando uma resposta também.
Naquela semana, eu estava um trapo, pensando em tudo e querendo milhões de respostas. A minha vida tava do avesso e eu não sabia mais qual era o lado certo!

- Não sei... Juro! - aqueles olhos eram de piedade mas, caralho, eu sou ou não o chefe do morro?!

- Meu Deus, Cesar! - respirei fundo e soquei a porta. - Eu preciso saber quem é o frente dessa porra.

Quem é o filha da puta que fechou com o Patrick? Eu quero esse desgraçado morto, eu quero cortar o mal pela raiz, inferno!
Meus dedos estavam formigando por conta da adrenalina, quero dizer... Não era eu quem apontava a arma pra cabeça dele, o Rato era o certo pra isso. Se fosse eu, capaz que já tinha puxado o gatilho.

- Cesar... Tá vendo essa arma? - apontei pro Rato. - Se você não me falar quem é... Eu sei que você sabe! - ele me encarava com a respiração ofegante, o suor escorria pela testa. - Se você não me falar... - repeti pra frisar, né! - Eu vou enfiar essa pistola no seu cu e você vai parecer uma pipoca, tudo torto.

CG riu cortando o clima e eu acompanhei, em seguida o Rato.
Estávamos realmente rindo, não sei o que eu tava pensando em ameaçar alguém assim.
Sentei no chão de tanto rir, enquanto isso a brisa do CG tinha ficado mais forte.
Fala sério, eu tenho quilos de bosta na cabeça.
Foi quando Cesar começou a rir também.

- Tá rindo do que, idiota? - Rato perguntou e encostou a boca da arma em sua cabeça. - A gente tá rindo mas ele tá falando sério! - CG concordou com a cabeça e eu me levantei.

- Quero soltar você, Cesar... Pra isso, você tem que me ajudar a te ajudar.

Ele prendeu os olhos firmes. Parecia que finalmente ia sair alguma coisa daquela boca de túmulo!
Soltou a respiração de uma vez só mas eu também estava tão exausto quanto ele.
Parece mais fácil interrogar as pessoas nos filmes, eles cortam um dedo e pronto, tá lá a resposta.
Preferi deixar ele com todos os dedos mesmo que ele nunca mais fosse usar suas mãos.

- A delegada... Eu sei que ela tá metida nisso faz tempo mas eu não sei com quem.

A espinha gelou. O maxilar travou e o Rato sabia que era verdade.
CG saiu da sala bufando tão alto que parecia uma manada vindo.
Retomei o raciocínio e precisava interrogar Sandra, nada melhor do que a própria corrupta falar as verdades sobre tudo.
Matar o Patrick, tudo bem! Ele até que merecia... Mas agora, quem me garante que o Dylon não é o culpado de tudo?

- Parabéns, Cesar! Tu foi promovido a coronel! - ele respirou fundo. - Mas algum coronel que já esteja morto. - virei a boca de lado. - A gente se encontra do outro lado.

Rato disparou, bem no meio da sua cabeça, fazendo voar todo aquele sangue. Antes do disparo, virei a cara pra janela e observei o céu naquele dia.
Todo disparo me assustava, meus tímpanos não aguentavam tal barulho.
O foda é que eu estava com raiva, e a gente com raiva, desgraça a vida de qualquer filho da puta.

EU VIM DA RUA - MC Kevin (Kevin Bueno)Where stories live. Discover now