Capítulo Trinta e Oito

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Capítulo Trinta e Oito

Após desenhar delicadamente a forma da lua crescente com a tinta negra no centro de sua testa, em homenagem a despedida à Lydia kan Una, Mia Norwood endireitou seu corpo diante ao espelho, e deixou um longo suspiro afugentar-se de seus lábios. Os desenhos sobre a face que contornavam suas sobrancelhas, e as tatuagens ao longo do corpo mostravam alguém inteiramente diferente de quem ela conhecera. Não era mais capaz de ver a princesa Amélia, não se vestia mais como ela, não agia mais como ela, não pensava mais como ela. Diante ao seu reflexo via uma guerreira Kadawgi, filha do Sol e da Lua, a Comandante Eklissi. Porém, somente naquele preciso momento, Mia foi capaz de compreender: não importava o traje ou a armadura que usasse, independente de quem fosse, seu coração permanecia humano, sujeito as piores dores por tornar a perder alguém.

Segurou as lágrimas ardentes que escalaram até seus olhos, não deveria chorar. Não poderia, Lydia fizera seu sacrifício em nome da causa. A decisão tomada pelo bem comum dos povos, por isso Mia apenas deveria se conformar e honrá-la. Mesmo que seu coração doesse profundamente com a relação materna que nunca poderiam ter.

Estava profundamente perdida nos seus pensamentos e somente notou a presença de Lucky Berbatov quando este já estava atrás de si. Vestia negro, e assim como ela, possuía diversas tatuagens pelo corpo, com o desenho do sol pairando na sua testa. Ela abaixou o olhar desnorteado, retomando seus movimentos esforçados e alcançou o jaspe vermelho sobre a penteadeira, colocando-o em volta do pescoço.

– Apenas mais alguns instantes – ela pediu, deixando escapar uma grande massa de ar pela boca.

– Leve o tempo que precisar – Berbatov murmurou, fitando-lhe com aqueles protetores olhos amarelados, cheios de remorso, um olhar que soubera reconhecer desde a primeira viagem juntos. – Ninguém pretende começar sem você.

Ela aquiesceu, selando os lábios.

O ladrão estudou o quarto, com um olhar desnorteado, e sentou-se sobre a cama, observando-a através o espelho.

– Eu sei que me mantive quieto – ele arfou, numa voz pesarosa, repleta de culpa e raiva. – Porém eu sinto que minhas palavras não serão capazes de consertar nada... Eu sinto muito... Sinto muito ser incapaz de evitar tantas mortes, e sinto muito por você perder tantas pessoas... Sinto muito pelo que fiz, por não ter controlado minhas emoções e ter resultado naquilo...

– Isso não é sua culpa, não é de ninguém – Mia suspirou, com uma grande pressão no peito, fazendo o esforço de manter a sua voz límpida. – Depois de tudo que você descobriu, somente uma pessoa sem coração conseguiria manter sangue frio num momento como aquele. O que fizemos foi arriscado, porém necessário. Guerras exigem sacrifícios, e Lydia quis fazer o dela. Não há nada que ninguém poderia fazer.

Berbatov se aproximou colocando as mãos sobre seu maxilar e arqueando o rosto dela para ele.

– Você não precisa fazer isso... Não na minha frente. Não estamos falando de comandante para comandante, está falando comigo, de ladrão para princesa... Vocês estavam mais próximas que antes, e ela era sua verdadeira mãe, Mia – pronunciou cada palavra com cautela, observando seus olhos marejados.

– E ela se foi – ela respondeu sem ar, numa voz embargada. – Assim como Cirelli, meus pais, Rosa... Eu não quero começar a contar corpos, e terminar por sentir o peso dessas perdas porque eu tenho medo de não saber continuar... Por isso, eu me foco no que ainda tenho, você, meus irmãos, e um povo inteiro que me cerca e acredita em mim. Uma causa e uma guerra, que devo travar para provar que todos que foram, não foi em vão. Era o que Lydia iria querer, foco, não lamurio.

Ceres - O Retorno Da Escuridão [LIVRO 3 - COMPLETO]Waar verhalen tot leven komen. Ontdek het nu