Audiência - Parte I

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Calça social preta, camisa de mangas meticulosamente passada, sapatos lustrados, cabelos bem penteados. A imagem física de Ethan Jones escondia com facilidade o coração em caos que ele tentava conter dentro do peito. 

Na sala de estar, Ayvan chorava, Ayden resmungava em inquietação e Ethan sabia que Candance teria um dia difícil. A moça havia se disponibilizado para cuidar dos gêmeos durante o dia, a audiência certamente demoraria um pouco, e Ethan estava grato pela ajuda dela. 

Em seu coração, ele queria acreditar que voltaria para casa com um sorriso no rosto e os ombros mais leves tendo deixado para trás a preocupação de perder a guarda dos filhos. Mas uma voz em sua mente, uma vozinha irritante e assustadora tentava sussurrar para ele que não teria ninguém o esperando para um beijo de boa noite quando ele voltasse para casa. A voz que soava bastante parecida com o medo, gritava em seu subconsciente que estes poderiam ser seus últimos minutos tendo Ayden e Ayvan em sua vida, que na manhã seguinte ele poderia acordar sozinho em um casa grande, mas pequena demais para conter o tamanho de sua solidão, de sua dor. 

O choro soou mais alto, seus pensamentos imediatamente indo em direção à voz de seus filhos. Passos lentos, um pé após o outro, toda a concentração possível. Ethan chegou na sala de estar e como se sentindo a presença daquele por quem eles chamavam, Ayden e Ayvan calaram-se. O silêncio fez Ethan pensar que Candance ouviria as batidas frenéticas de seu coração descompassado, mas a moça apenas lançou um sorriso de encorajamento a ele. 

"Vem Ethan, faz sua mágica com esses dois e depois vá de uma vez, não pode se atrasar." Ela disse e ele assentiu sem muito entusiasmo. Sua mente gritava para ele entrar no carro do lado de fora, pegar seus filhos e desaparecer para longe o suficiente, para um lugar onde ninguém jamais tentaria tirá-los dele. Ethan suspirou. 

"Vamos te esperar pro jantar." Ele sabia o que Candance estava fazendo, usando de palavras cuidadosamente escolhidas de forma a tentar fazê-lo acreditar que a casa não estaria vazia esperando sua volta. Seus filhos estariam ali, sua família intacta. Ele assentiu. 

"Hey buddies." A emoção fez a voz dele soar esganiçada, como se uma mão forte apertasse sua garganta prendendo toda a emoção que ele tentava manter sob controle. Ayden sorriu, Ayvan levou uma das mãos até o rosto do pai, e com carinho tocou naquele em quem ambos confiavam sem reservas. "Sejam bonzinhos e não enlouqueçam demais a tia Candy." Um sorriso triste agraciava o rosto dele. Um gesto simples que mostrava esperança. "Papai volta daqui a pouco." A esperança de que eles ainda seriam uma família no final do dia. "Amo vocês." Um soluço de pura emoção soou e Ethan não conteve uma lágrima solitária que caiu de um de seus olhos. Candance tentava sem sucesso conter as lágrimas que escorriam apressadas pelo seu rosto marcado pelo mesmo medo que assolava o coração de Ethan. "Obrigado por tudo, Candy." Ele beijou a testa dela em um gesto que buscava dar aos dois um pouquinho mais de força para continuar. Ficaria tudo bem, era o que ambos tentavam se convencer a acreditar. 

O caminho até o fórum pareceu passar mais rápido do que Ethan gostaria. Adam esperava ao lado de Donna, parados na porta da recepção. O silêncio carregado que sempre rodeava os dois fez Ethan se sentir ainda mais desconfortável quando se aproximou, e ele não teve força de vontade o suficiente para conjurar nem mesmo um pequeno sorriso na direção deles. 

Adam sentiu o coração apertar ao notar a expressão do filho. Ethan parecia cansado, carregando nos ombros o peso do mundo e aflito além de qualquer comparação. O jovem rapaz à sua frente não se parecia em nada com o sempre confiante Ethan Jones que ele via caminhar com altivez pelo campus da faculdade. Seu filho parecia ter envelhecido nos últimos dias os anos que ele ainda não havia vivido, toda a sua juventude ofuscada pelo medo de ter sua razão de viver arrancada de si tão de repente. Sem palavras, pai e filho encaravam-se de frente, vendo nos olhos um do outro os sentimentos dos quais nenhum deles jamais falaria em voz alta. Era medo, tristeza, insegurança e uma pitada quase esquecida de esperança. 

Reason (Real #2)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora