Aquilo Que Nos Define - Kelly Wilson

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O silêncio não a incomodava mais. 

Desde às três da madrugada, Kelly Wilson estava acordada. Suada e envolta em lençóis emaranhados, ela havia despertado para encarar o silêncio vazio de uma casa que ela não sabia como se convenceria a chamar de lar. Os livros jaziam intocados ao seu lado. O relógio se recusava a bater com mais rapidez. O silêncio então, se tornou o único a lhe oferecer alguma companhia. 

"Você tem tanto pela frente filha, não desperdice tempo pensando no que poderia ter sido feito. Vá e faça o que é preciso fazer."

O conselho de sua mãe parecia gritar em sua mente. Os remédios no armário do banheiro eram um convite tentador. 

Não!

Kelly Wilson se levantou da cama quando o ponteiro no relógio marcou seis da manhã. O banho rápido a fez abrir os olhos e encarar a sua volta com mais clareza. Estava viva, tinha um trabalho, um teto descente e saúde. Quando as depressivas horas da madrugada davam lugar para o sol pouco brilhante do lado de fora, Kelly se sentia ingrata

Se vestindo sem pressa ela conseguiu gastar o tempo de sobra que tinha até que fosse a hora de ir para o trabalho. O caminho até o escritório era curto, as ruas eram habitadas por pessoas que não encaravam nada além daquilo que estava diretamente à sua frente. Kelly se sentiu acolhida. Em meio à multidão de faces desconhecidas, ela deixava de se sentir tão perdida

"O que gostaria, senhora?" A moça da padaria não lhe deu bom dia. Ela não se importava. Ditando seu pedido mecanicamente, ela se sentou para esperar. Não havia muita conversa sendo feito entre os ocupantes do lugar. O silêncio era quebrado apenas por alguns cumprimentos raros e pedidos ditados abruptamente. De repente, o olhar de todos se voltou para a porta. Ela observou quando um rapaz entrou no estabelecimento. Cabelos molhados faziam algumas gotas de água escorrerem pelo pescoço dele. Nos braços, ele trazia desajeitadamente uma criança, que soltava risinhos de diversão toda vez que o rapaz tentava ajeitar o aperto precário que mantinha o bebê em seu colo. No carrinho, claramente feito para carregar duas crianças, ele empurrava um segundo bebê adormecido e uma mochila preta. Quando o rapaz se abaixou para pegar um biscoito, o bebê antes adormecido começou a resmungar. O jovem imediatamente usou um dos pés para sacudir o carrinho e fazer a criança voltar a dormir. Tão rápido quanto ele entrou no local, ele saiu. Com um carrinho que carregava um bebê, uma mochila e um saco de biscoitos. Nas mãos um suco e outro bebê. Ele fechou a porta. O silêncio retornou. Kelly quis correr para fora dali e implorar ao rapaz para que voltasse. Para trazer de volta a sensação de vida que ele carregava consigo. 

Ela continuou sentada exatamente onde estava. Seu pedido foi entregue, ela se levantou e saiu. De volta à multidão ela se deixou passar despercebida. 

"Identificação, senhora?" A recepcionista do escritório a perguntou assim que ela chegou. Não era conhecida o suficiente para poder entrar sem mostrar um crachá. 

'Kelly L. Wilson - Assistente Social 0032'  Eram os dizerem do papel branco envolto em plástico que ela carrega na bolsa. A recepcionista assentiu e a desejou um bom dia. Ela apenas continuou o seu caminho. 

O escritório estéril a recebeu com a mesma frieza que ela se apresentava ao mundo. Sentando-se na cadeira rotatória, ela retirou um embrulho de jornal mal enrolado de dentro da bolsa. A mulher de sorriso fácil e o homem de olhos gentis a encaravam por de trás do vidro que adornava o bonito porta retrato. 

"Feliz aniversário Kelly! Essa foto é para você não conseguir nunca se livrar da gente." Lindsay Wilson disse entregando o bonito porta retrato nas mãos da filha.

"E ter a chance de levar um pouco da minha beleza sempre com você, sabe como é, filha, seu velho pai ainda arranca uns suspiros das mocinhas." Osborn Wilson a direcionou uma piscadela divertida. 

"Agora não vai ter jeito, vamos estar com você onde quer que esteja." Kelly sorriu.

Era o último presente que havia ganhado dos pais. Ela carregava o porta retrato para onde fosse, era sua âncora, seu lembrete para nunca desistir. O segundo embrulho revelava, no entanto, o motivo maior de Kelly se obrigar a levantar da cama todos os dias e se obrigar, mesmo depois de tanto tempo, a encarar um mundo que a fazia temê-lo a cada nova rasteira que a vida lhe dava. 

"Pare com isso Keith, você sabe o que eles diriam se pudessem te ver agora!" Kelly gritava exasperada encarando o rapaz à sua frente. 

"Eles não estão aqui para me dizer o que fazer não é, Kelly? Lembra? Eles nos deixaram." O adolescente largou o cigarro por um segundo para dizer tais palavras. 

"Eles morreram Keith, não foi escolha deles nos deixar. Você é que é ingrato de mais para aproveitar a chance de viver que está tendo. Chance essa que eles nao tiveram." Kelly deu as costas ao único que lhe importava, para que ele não visse as lágrimas que manchavam seu rosto. 

Seu irmão agora já não era mais um adolescente imaturo de tendências sombrias. Ela havia dado o melhor de si para mostrar a ele o mesmo caminho que seus pais a haviam ensinado a seguir. Se deixando sorrir por um segundo, Kelly apreciou seu próprio trabalho em orientar o único irmão durante a fase mais difícil da vida de ambos. Keith Wilson agora seguia carreira militar. Queria ela ter tido alguém para lhe oferecer o mesmo tipo de apoio.

"A gente vai rodar o mundo até achar um lugar onde você vai ser feliz de novo Kelly, eu prometo." O bonito jovem a encarava com um sorriso nos lábios e uma expressão consoladora. 

"Nem que seja no Alasca?" Ela lhe sorriu, se apegando ao mínimo resquício de esperança que ela se deixava alimentar. 

"Até o fim do mundo, baby!" 

E Kelly se deixou pensar que a vida a estava dando uma segunda chance. Até que ela se viu encarando de frente o significado de promessas vazias. 

"Me solta Carter! Me deixa ir, por favor." O desespero na voz dela ainda morava em seu coração. 

"Droga Kelly, o que você tá' fazendo aqui?"  Ele a encarava como se a implorasse para voltar no tempo, para bater na porta, para esquecer o que ela havia visto. 

"Não me procure mais." E então ela deu as costas.

E então, poucos meses depois de deixar para trás toda e qualquer perspectiva de futuro, Kelly Wilson suspirou profundamente, se ajeitando na grande cadeira de seu pequeno escritório em Londres. 

Keith estava bem, havia achado um caminho descente para seguir sua própria vida. Brian Carter era só mais um fantasma que a atormentava em suas noites mal dormidas. Um eco de um passado que ela havia deixado para trás, deliberadamente, quando saiu dos Estados Unidos. Seus pais estavam mortos, descansando eternamente em meio à paz. Agora era sua vez. 

Encarando o ultimo porta retrato em suas mãos, ela sorriu. A foto dela mesma, alguns anos mais nova a sorriu de volta. Ela calmamente retirou a foto da moldura e acrescentou à decoração de sua mesa, um porta retrato vazio. Seria seu lembrete diário de que daqui para frente, ela faria novas lembranças. Kelly Wilson estava cansada de deixar as memórias do passado destruírem sua perspectiva de futuro. A próxima fotografia a ocupar a moldura vazia em sua mesa, seria uma marca de sua nova vida. 

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E então?!

Amores, esse capítulo veio para mostrar a vocês um pedacinho da história que moldou a personalidade da nossa protagonista, okay?!

Capítulo chato e meio pesado, mas necessário de mais para vocês entenderem as futuras atitudes da personagem.

O próximo vai ser bem parecido com esse, mas na perspectiva do Ethan.

E depois, segurem-se nos seu lugares, por que vai ser o tão esperado encontro!!

VOTA, VOTA, VOTA, PLEASE!!

Não esqueçam de comentar também amores!

Beijos e fiquem com Deus!

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