Capítulo 55 - O depois

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EU ENXERGUEI duas velas negras quase completamente derretidas no bocal de um castiçal de ferro dourado e lustrado logo que abri as pálpebras. Minhas pupilas demoraram para focar o objeto atado à uma das paredes petrificadas do castelo, mas quando o fizeram, foi como se a luz do sol tivesse retinido em meu rosto. Vozes cada vez mais nítidas e próximas enchiam-me os ouvidos trazendo-me desconforto. Eu não sabia onde estava, mas tudo ali me parecia incrivelmente familiar.

Eu voltei no tempo? Eu morri e voltei para 1853?

Toquei os meus braços logo que percebi que estava viva. Levei a minha mão em direção ao meu rosto e quase não a consegui controlar. Meti um dedo bem dentro do olho. Procurei erguer o meu tronco que pesava mais que o normal, comprimindo-me contra a cama. A minha mente jazia confusa. Era difícil me orientar.

O que há comigo? Por que me sinto tão... gorda?

Eu estava sozinha dentro do quarto. As janelas pareciam cerradas a ferrolhos, impedindo que a luz natural entrasse. Senti as pernas pela primeira vez quando resvalei o dorso de uma das mãos em minha coxa esquerda. De tronco erguido, sentei-me na cama e senti a pele úmida. O quarto agora estava mais iluminado que um dia ensolarado e havia uma mancha tomando toda minha saia.

Dominando quase que totalmente a minha coordenação motora, procurei erguer o meu vestido. Foi quando me deparei com o que estava acontecendo.

— Oh, cacete!

As minhas roupas de baixo estavam cobertas da minha própria urina. Com os dedos formigando pela falta de circulação sanguínea, tateei o baixo ventre. Fui subindo o toque barriga acima. Constatei o óbvio, embora ainda me fosse inacreditável que aquilo tivesse mesmo ocorrido a mim. Uma moroi. Uma descendente de bruxa.

— Eu estou grávida... eu... eu estou realmente esperando um bebê!

Senti o meu rosto bater violentamente no chão no instante seguinte. Ainda tinha dificuldades de controlar os meus músculos e havia um gosto intenso de sangue na boca. Passei os minutos seguintes procurando reunir forças para fazer com que as sinapses do meu cérebro voltassem a funcionar normalmente, rastejando no piso rústico. O que antes era uma tarefa banal, tornou-se um trabalho complexo, me fazendo levar horas para levantar de onde havia caído.

Após um esforço muito grande, eu consegui chegar até o sanitário onde uma banheira de água morna parecia me esperar. Tudo me soava como um intenso déjà vu. Eu estava novamente dentro de um castelo medieval escuro e sem vida. Me sentia mais morta do que viva. Possuía pensamentos conflitantes dentro da cabeça. E não sabia o que realmente estava acontecendo comigo.

Eu estou mesmo esperando um bebê!

A minha pele estava fria em excesso e eu mal conseguia sentir a temperatura agradável da água. Acariciava o meu abdômen inchado como que querendo sentir a vida que crescia dentro de mim depois de tanto tempo de uma certeza infértil. De uma esterilidade que me abraçou por mais de um século.

Tem mesmo uma vida se desenvolvendo em meu corpo!

Eu fiquei sozinha por algum tempo sem calcular o quanto. Me sentia sonolenta e anestesiada, como se estivesse acabado de levantar de um coma. Apesar disso, me sentia feliz e realizada. Como há décadas não me encontrava.

Se isso é um sonho, eu não quero acordar.

A porta do aposento rangeu enquanto eu agitava a água já fria do interior da banheira. Os meus sentidos vampiros detectaram um odor de flores do campo. Ouvi os passos suaves de uma mulher pequena que pareceu se surpreender ao encontrar a cama vazia e suja de urina. Pouco depois, os seus olhos monólitos se arregalaram quando me viram no lavabo, dentro da banheira. Caihong Chen segurava um ramo de lírio-branco e agradeceu aos céus pela minha recuperação em seu idioma mandarim. Nós tínhamos muito a conversar.

Alina e a Chave do InfinitoWhere stories live. Discover now