Capítulo 19 - O mundo dos mortos

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ULURU ERA UM IMPRESSIONANTE monólito de arenito localizado no Parque Nacional Uluru-Kata Tjuta, no território do Norte da Austrália. Também conhecido como Ayers Rock, a formação rochosa era sagrada para os povos aborígenes australianos, particularmente para os Anangu, que eram os custodiantes tradicionais da área.

Situado no coração do Deserto de Simpson, Uluru proporcionava um contraste impressionante com a paisagem árida ao seu redor. Erguia-se à cerca de trezentos e quarenta e oito metros acima do solo, com uma parte significativa subterrânea, e a sua cor variava dependendo das condições de iluminação, passando por tons de vermelho, laranja e marrom.

Assim como o Stonehenge e a cidade Inca de Machu Picchu, Uluru fazia parte do grande emaranhado de locais sagrados cujas Linhas Ley atravessavam, e algumas teorias sugeriam que aquele território australiano estava intrinsecamente ligado à Terra e às energias cósmicas.

Assim que o portal do Entremundos se abriu para que passássemos por ele, eu fui engolfada por uma ressonância especial que vibrava do lugar. Eu estava cada dia mais sensitiva à magia, o que significava que, muito em breve, eu estaria apta para a minha missão de lacrar de uma vez por todas as passagens para o além-mundo.

André Nascimento era o guardião do Portão de Uluru há bem mais tempo que eu tinha de vida. Nascido e criado no Brasil, descobrira o seu dom bruxo ainda na adolescência, causando espanto nos pais com a sua telecinese espontânea. Achando que o filho abrigava dentro de si algum tipo de espírito maligno, os seus progenitores entraram em contato com o padre da cidade que, sem saber o que fazer, se reportou à Igreja Católica de Portugal. O menino, então, foi levado forçadamente à Lisboa, onde seria exorcizado erroneamente.

Atenta a cada sinal místico que vibrava pelo planeta através das Linhas Ley, Alanna Dubhghaill descobriu cedo o cruel destino do menino Nascimento, foi quando organizou uma equipe especial do seu conciliábulo para libertá-lo e levá-lo para o seio da convenção bruxa. Não demorou para que ele passasse a viver sob a proteção da mulher na Bulgária e, quando amadureceu, assumiu a posição de guardião do Portão do Infinito australiano, passando a viver naquela área quase deserta entre os aborígenes da tribo Anangu.

Tão logo desembarcamos em Uluru, sob um sol escaldante de mais de quarenta graus, André me ajudou a reforçar a aura energética que eu havia aprendido a emanar para me proteger da radiação destrutiva aos de minha espécie. Eu ainda estava em fase de aprendizado, por isso, não conseguia concentrar por muito tempo os meus dons psíquicos no intuito de não fritar feito alho na frigideira.

Alguns quilômetros depois, nós dois alcançamos o local onde a tribo Anangu vivia, em um espaço mais arborizado forrado por uma areia quase marrom. Ali, debaixo de tendas de teto alto, finalmente eu tive onde me esconder do sol. Quando ele me apresentou a um de seus fiéis amigos, um aborígene de pele quase tão escura quanto a areia que pisávamos, eu sentia como se a minha pele fosse se desprender do restante do corpo. O tal amigo atendia pelo nome de Narel e era uma figura exótica a olhos vistos.

— Muito prazer em conhecê-lo, Narel.

Não houve qualquer resposta verbal por parte do sujeito mirrado de cabelos armados que trajava única e exclusivamente uma espécie de tanga sobre os ossos do corpo raquítico.

— Narel não fala, mas ele entende muito bem o inglês — alertou-me o brasileiro. —Toda vez que quiser algo, fale pausadamente que ele irá compreender.

André deixou de lado a bagagem que havíamos trazido do castelo de Blackwood, em Salisbury, e inclinou-se junto a uma das tendas das várias instaladas ali, como que a procurar algo no chão. Foi de súbito, mas antes que eu percebesse de onde ele havia saído, um animal quadrúpede de pelos castanhos se precipitou até o bruxo para saltar com as suas patas dianteiras sobre ele, como se o quisesse arrancar um pedaço.

Alina e a Chave do InfinitoWhere stories live. Discover now