Capítulo 53 - A quarta morte

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A CHUVA CAÍA INTENSA sobre o castigado cemitério moldavo de Hîncesti quando as três figuras angelicais surgiram de dentro de um clarão luminoso às minhas costas. Thænael se rastejava de costas, ainda a segurar a metade não-amputada de seu braço à minha frente. Seus olhos se arregalaram quando avistou os três visitantes e sentiu que não havia como escapar de seu destino.

Eu me virei um segundo antes de ver Akanni se dirigir a mim. Ele empunhava uma imensa arma branca forjada de metal divino e que se mantinha fulgurante conforme era brandida no ar. Há pouco mais de uma hora, o anjo negro tinha partido em busca da sua tão preciosa espada Clemência Celestial na sala de troféus do Arcanjo Rafael, e não pretendia retornar sem ela em mãos.

Além dele, Samyaza também havia se materializado trazendo seguro por uma das mãos o corpo decapitado de seu filho, Jæziel, e na outra, a sua cabeça. Ao seu lado, jazia Uriael com sua expressão dura e olhar frio. Ele carregava a filha Sephiræd nos braços, e o tronco da mulher parecia partido em dois por sua espada.

Thænael estava encurralado entre nós e a laje de um túmulo rasteiro. Recostou-se na estrutura de granito e ficou a observar a figura imponente do pai cada vez mais perto dele. Akanni e eu trocamos um único olhar antes de ele emparelhar comigo.

— Achei que só conseguiria recuperar a Clemência Celestial se cumprisse a sua missão para com os Santos Vigias — e apontei para o rosto de Thænael. O nefilim agora parecia um filhote assustado diante de seus predadores.

— Fiz um novo acordo com Rafael. Se ele me deixasse usar a minha antiga espada, eu voltaria a ser seu fiel guerreiro tão logo a minha posição de Santo Vigia fosse restaurada.

Um minuto de silêncio seguiu-se, cortado apenas pelo sibilar de Thænael, sentado sobre a poça que o seu próprio sangue formava.

— Você sabe que depois que os Portões do Infinito estiverem fechados definitivamente, nem você e nem qualquer um de seus amigos anjos poderão descer à Terra novamente, não sabe?

Ele assentiu. Tentava se manter firme, mas titubeou ante a possibilidade de voltar ao Céu, desta vez, para sempre.

— Você fez o seu sacrifício para preservar a realidade em que vive. Eu devo fazer o meu.

A Clemência Celestial era a menor entre as três armas empunhadas pelos anjos que eu conhecia, mas parecia emanar uma energia única que chiava como o escudo protetor que envolvia a pele de seu detentor. Tão logo ele a brandiu a fim de decapitar o seu último filho na Terra, eu lhes dei as costas e me afastei para procurar Chen, que estava longe do meu campo visual há algum tempo. Eu sabia que Costel não estava mais presente na casca oca ocupada por Thænael e, embora eu mesma estivesse disposta a destruí-lo anteriormente, ainda era difícil olhar para aquele rosto em sofrimento e não me sentir incomodada.

A morte de Thænael precisava ser concretizada, no entanto, para que os anjos recolhessem as almas de seus filhos nefilins em suas espadas para o Céu e eu pudesse selar as fissuras na realidade. Fraquejei um segundo sentindo a Chave do Infinito a se alimentar de meu sangue como a um parasita. E, quando pensei que tudo havia acabado às minhas costas, vi a expressão de Samyaza e Uriael mudar quando um rugido muito familiar estrondou no espaço ecoante do cemitério.

Ah, não, merda!

Longe de estar derrotado, Thænael havia recorrido a seu elo mental com o espírito do vircolac a dominar o corpo da minha filha, e o nefilim a convocou para a batalha. De dentro de seu facho luminoso, a criatura lupina atingiu Akanni em uma velocidade espantosa, o jogando para longe, através de uma mureta que delimitava o terreno mais elevado do cemitério.

— Acabe com todos eles, Alex. Destrua a todos!

O nefilim maneta aproveitou a distração para se levantar e correr de maneira desajeitada pelos corredores em busca de salvação. Sumiu antes que eu pudesse enxergá-lo por entre a chuva que continuava caindo e me pôs a temer que aquela história não se encerrasse ali.

Alina e a Chave do InfinitoМесто, где живут истории. Откройте их для себя