Capítulo 8 - No coração da selva

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O ANO DE 1973 FICOU marcado pela assinatura do Acordo de Paz de Paris, um tratado instituído em janeiro que encerrou oficialmente a participação dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã, oito anos após a sua primeira incursão no país. Negociado na França entre os representantes dos Estados Unidos (Henry Kissinger) e do Vietnã do Norte (Le Duc Tho), com a participação do Vietnã do Sul e do governo revolucionário provisório do Vietnã do Sul, o acordo instituiu a retirada das tropas estadunidenses da nação asiática, além de um cessar fogo imediato com a troca pacífica de prisioneiros de guerra.

Para os Estados Unidos, aquela foi considerada a maior de suas derrotas militares e sociais, uma vez que o país foi obrigado a se afastar do campo de batalha sem atingir os seus objetivos primordiais — um deles, o de conter o avanço comunista no Vietnã. Além disso, o período longo do conflito ocasionou muitas perdas de vida humanas, tanto para o lado Ocidental quanto para o Oriental, e em seu próprio território, os comandantes americanos foram obrigados a lidar com a imensa polarização da sua sociedade, com boa parte das pessoas se declarando abertamente contra a participação dos EUA na guerra desde o seu início.

Embora a assinatura do Acordo de Paz de Paris tivesse encerrado a participação militar dos Estados Unidos na guerra, a questão da reunificação do Vietnã permaneceu em aberto. Mesmo após a retirada das tropas estrangeiras, o país continuou dividido entre o Vietnã do Norte e o Vietnã do Sul, com conflitos armados espalhados por todo o seu território. Aquela situação só seria resolvida dois anos mais tarde, quando as forças do Vietnã do Norte assumiram de vez o controle do Vietnã do Sul, unificando o país sob um governo comunista.

Eu estava à beira de um rio no estado do Amazonas, no Brasil, quando li a manchete de jornal a respeito do Acordo de Paz em Paris. Ali, a temperatura beirava os quarenta graus na sombra. Era quase oito horas da noite, e apenas os mosquitos me faziam companhia junto a uma mesa troncha de metal, do lado de fora de um bar. Durante o meu treinamento no Tibete, eu havia aprendido a controlar parte da minha sede por sangue, a minha libido e até conjurar o meu chi de cura, porém, ter mais paciência não estava incluso no pacote mágico.

Naquele horário, o estabelecimento que ficava a menos de um quilômetro daquela que era considerada a maior floresta tropical do planeta, estava razoavelmente bem-frequentado. Além de mim, do lado de fora, se encontravam também dois casais locais a conversar alegremente, conforme bebiam cerveja em copos de quinhentos mililitros. Na parte interna do botequim, uma vitrola atrás do balcão tocava um long play de trinta e três rotações para o entretenimento dos presentes. A música era bastante animada e, em português, falava sobre samba, senzala e o orgulho do povo preto.

O ritmo dos batuques que compunham a harmonia da canção intitulada "Ilu Ayê"[1] era bastante envolvente, e permitia que as cerca de vinte pessoas no bar sacudissem, mesmo que levemente, quadris e ombros, enquanto bebiam os seus drinques em copos baratos. A voz potente da intérprete também era admirável e impunha toda uma nacionalidade à música, algo que jamais seria percebido em qualquer outra criada fora daquele país.

Diferente dos frequentadores do "Bar da Saudade" — cuja fachada era escrita em tinta vermelha sobre uma tábua fina e velha —, no entanto, eu me encontrava em profundo tédio. Bebericava em goles contidos a cerveja amarga que me havia sido servida há quarenta minutos, mas me encontrava ansiosa para sair daquele lugar e me embrenhar logo na mata, onde jazia o artefato cujo valor me era inestimável. A busca pela Chave do Infinito não podia ser interrompida jamais. Cada minuto de ócio gasto, era um minuto a mais que dávamos para que Thænael alcançasse os seus objetivos.

Toda aquela jornada até a América do Sul havia começado há poucas semanas, quando Caihong Chen e eu atravessamos os continentes por meio da ligação direta que nos era permitida pelo Entremundos. De maneira simplificada, a minha mestra mística chinesa havia me explicado que o Entremundos era como um espaço intermediário entre os chamados "Portões do Infinito", e que funcionava como um corredor secreto de uma casa onde se podia passar livremente de um canto a outro, com acesso irrestrito a todos os seus cômodos e sem o conhecimento de seu dono.

Alina e a Chave do InfinitoNơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ