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ANGELIC...

O barulho no jardim me faz acordar. Os funcionários estão organizando a área externa após a festa de ontem. Coloco o travesseiro sobre a cabeça e tento continuar dormindo, mas é impossível. Desisto.

Mesmo contragosto, levanto da cama e visto o robe sobre a camisola. Minha cabeça está latejando, em partes por não ter dormido o suficiente, mas não posso negar que, noite passada, fiquei rolando de um lado para o outro na cama, sem conseguir dormir, pensando na conversa que tive com Bruce.

Eu sabia, desde o momento em que entrei na sala do confessionário, que o Padre Bee não estava do outro lado da tela. A respiração do Padre é suave e pesada, com espaços curtos entre as expirações. E, mesmo assim, eu me confessei. Eu queria, desesperadamente, me confessar para alguém que não fosse contar meus pecados para meu pai depois.

Após escovar os dentes e lavar o rosto, desço para o primeiro andar. A mesa já está posta com o café da manhã, porém Margot e Elliot ainda não desceram. Fecho o robe e me sento na cadeira ao lado esquerdo da cabeceira.

Começo a comer, pois tenho algumas atividades para hoje. Uma amiga da faculdade, Skyla, virá hoje para que vejamos as aulas juntas.

Pouco tempo depois, meu pai desce as escadas. Ele já está vestido com terno, gravata e sapato lustroso, mostrando que os trabalhos começaram cedo hoje.

Elliot Donneli é diferente de mim em todos os sentidos. O cabelo costumava ser castanho, hoje em dia está totalmente branco. Os olhos são escuros. Ele é alto e, antigamente, costumava ser bronzeado.

- Bom dia - ele cumprimenta - Acordou cedo.

Hora ou outra, dois seguranças fazem ronda pela casa inteira. Desde o atentado na Casa Branca, nenhum lugar é suficientemente seguro. Eu comecei a ter aulas remotas, para não correr riscos na faculdade. Margot passou a ter três seguranças pessoais. Elliot trabalha em casa desde então.

- Bom dia. O barulho no jardim me acordou - respondo.

Meu pai se senta na cabeceira da mesa e começa a escolher o que vai comer. Desde o diagnóstico de sua doença, ele tem se alimentado muito bem.

- Estava trabalhando? - pergunto.

- Sim - ele retorce os lábios, parecendo descontente - Vicenzo me ligou.

- É mesmo? - não me interesso pelo assunto. Pego algumas panquecas e coloco no prato, melando tudo com mel.

- Ele não está feliz com sua postura.

Preciso morder a língua para não insultar Vicenzo diante de seu fã número um. Ele não tem o direito de colocar as expectativas de sua felicidade na minha postura. Eu não lhe devo isso. Tomo uma longa respiração.

- Por que não? - pergunto, suavemente.

- Na festa, ontem - ele toma um gole de café - Ele disse que você estava muito próxima de Bruce Campbell.

- Conversando - afirmo.

- Perto demais - ele rebate, como se tivesse visto algo.

Me ocupo comendo as panquecas. Não quero falar sobre Vicenzo na primeira hora da manhã. Meu pai é um homem velho e doente, eu não quero o contrariar, mas suas decisões e opiniões sobre minha vida estão indo longe demais.

- Angelic - ele chama - Meu mandato está chegando ao fim, os patrocínios também. Muito em breve, as coisas serão diferentes.

- Diferentes como? - eu sei a resposta, mas quero ouvir dele.

- Tudo que temos... - Elliot pausa, procurando a melhor forma de dizer - Eu sou um homem doente. As pessoas estão começando a pensar que eu não valho o tempo e dinheiro delas, porque vou morrer em breve - suas palavras me fazem tremer - Tudo que temos é esta casa e os carros. Estamos sendo sustentados pelo meu mandato, praticamente. Em algumas semanas, quando isso acabar, eu não sei mais o que faremos.

ÚLTIMA DANÇAWhere stories live. Discover now