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Quinze anos atrás, quando Sophia e Pietra foram àquele parque de diversões, o lugar parecia uma megalópole à noite vista da cabine de um avião: cheio de luzes berrantes, com brinquedos que rodopiavam e apitavam em tons coloridos de néon, tatuando na vista borrões azuis, vermelhos, verdes, dourados e rosa.

Naquela tarde de quarta-feira todas aquelas luzes ainda se encontravam apagadas – eram acessas apenas depois do anoitecer – e, quando Miranda entrou no parque de mãos dadas com Joanna, os brinquedos passavam uma impressão ligeiramente sem graça, nada além de enormes trambolhos de metal que rangiam com o barulho de engrenagens enferrujadas girando, alguns deles ainda sendo montados. A montanha russa subia e descia, longe de estar lotada; o carrossel rodava devagar, as crianças nos cavalos coloridos rindo e acenando enquanto seus pais batiam fotos. A roda-gigante continuava em seu habitual looping infinito. Apagada. A Mansão do Terror e a Casa Maluca pareciam fechadas.

Miranda comprou outro algodão-doce para Joanna na barraquinha de lanches. Enquanto arrancava pedaços de sua pequena nuvem verde de açúcar e os enfiava na boca, Joanna apontou para a montanha-russa.

- Podemos ir ali? – perguntou.

- Eu sou velha demais para andar na montanha-russa, abobrinha – disse Miranda. Ela própria comia um algodão-doce. – E você é nova demais.

Joanna franziu a testa e projetou para frente o lábio inferior.

- Não é justo – disse. – Não quero andar no carrossel idiota com as crianças pequenas.

As crianças pequenas, no caso, tinham a mesma idade de Joanna. Isso se levássemos em conta apenas o que diz o calendário. Em todos os outros aspectos, Joanna se encontrava anos-luz à frente das garotas e garotos de sua faixa-etária. Miranda achava a neta um pequeno prodígio, e pensar assim não era exagero. Certa vez, ela entrara no quarto de Joanna no convento e deparara com a garotinha lendo George Orwell na cama. George Orwell, pelo amor de Deus. Joanna nunca se interessou muito por livros de colorir ou por aqueles brinquedos que vinham com buracos geométricos para você encaixar triângulos, círculos ou quadrados nos lugares corretos. Essas coisas a entediavam. Quase tudo a entediava. Nesse sentido, ela não era muito diferente de Sophia.

- Vamos dar uma volta – Miranda jogou em um lixo ali perto o palito onde antes o algodão-doce se enrolava e pegou a mão da neta. – Tem muitos outros brinquedos legais por aqui.

Com exceção de algumas poucas famílias e casais de namorados, Joanna e Pietra tinham o parque todinho para elas. Foram primeiro no carrinho bate-bate, e Joanna quase arrumou briga com um garoto com o dobro de sua idade e o triplo do seu tamanho por persegui-lo pela pista e atacar sem clemência a traseira de seu carrinho; depois ao Twister, cuja função parecia ser girar violentamente até que as cabeças de todos os passageiros saíssem voando de sobre seus ombros ( - Não me deixam ir na montanha-russa, mas me deixam ir nisso aí? – indagara Joanna com um sorriso satisfeito após cinco minutos ininterruptos de gira-gira-gira. Miranda não podia descordar da lógica dela); em seguida à Xícara-Maluca, tão emocionante quanto uma aula de Física em uma manhã chuvosa de segunda-feira em comparação aos rodopios inclementes do Twister; e ao Polvo Gigante, onde Miranda e Joanna se enfiaram em caixotes que ficavam pendurados nas pontas dos tentáculos roxos de um polvo que subia e descia, erguendo-as até que pudessem ver todo o parque.

Deram uma pausa nos brinquedos apenas para que Joanna pudesse comer um cachorro-quente, o que ela fez sentada em um banquinho em frente a um palco onde um mágico tirava passarinhos das mangas.

- Como ele tá fazendo isso? – perguntou Joanna, os olhos brilhando ao ver o mágico de cartola negra e capa vermelha tirar do bolso do terno um pardal de penas negras. – Como?

A Voz da Escuridão.Where stories live. Discover now