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Lou Campbell não era nenhum amador. Passara 10 dos seus 58 anos no exército, e quase 30 trabalhando em campo por todo o globo como agente da Divisão. Tampouco era um idiota – não teria chegado onde estava hoje, ocupando uma das posições mais altas dentro do Punho, se fosse um. Sabia que subestimar Sophia Manning equivalia a assinar seu atestado de morte. Não apenas por causa dos dons extraordinários da garota, mas também – e talvez principalmente – por que ela era inteligente. Para não mencionar bem treinada. Jamais esperava ser pego de surpresa, como aconteceu, e culpava a si mesmo por ter acabado no chão com uma faca encostada ao pescoço. A idade batia à porta, afinal. Nem mesmo o melhor dos homens é imune ao tempo.

Mas, velho ou não, ele não era nenhum amador. E também não planejava acabar como Aiden Harvey. O .38 não fora a única arma que trouxera consigo para aquele quarto escuro de hotel. Ele não mentira ao dizer que aquilo tinha sido apenas força do hábito – difícil voltar ao campo sem seu velho revólver de guerra. O verdadeiro trunfo de Lou Campbell, no entanto, era um taser elétrico que ele escondia no bolso do paletó. Não um daqueles brinquedos de dar choque que a polícia porta quando sai por aí em uma patrulha, não. O taser de Lou Campbell era uma belezinha que botava para quebrar com uma carga constante de cento e cinco mil volts. O suficiente para assar os sistemas de um ser humano.

Enquanto a garota arregalava aqueles grandes olhos verdes para a foto dentro da pasta, Lou Campbell tirava do bolso o taser. Mirou sem se levantar do sofá, torcendo para que sua pontaria continuasse boa como em seus tempos de juventude e não enferrujada feito suas costas doloridas.

- Que porra... – disse Sophia Manning.

E ele apertou o gatilho.

O taser disparou um fio que se desenrolou como uma serpentina pelo quarto. Sua ponta afiada, estalando em pequenos flashes de um azul elétrico, cravou-se na coxa esquerda da garota. Ela sequer gritou. Deu um tranco para frente, um movimento tão brusco que seus pés chegaram a deixar o chão, e depois desabou, caindo dura como uma boneca de gesso que é derrubada de uma estante. Começou a convulsionar, debatendo-se no piso, as botas tamborilando sem parar. Parecia dançar como um condenado à forca quando a corda abraça seu pescoço.

Devagar, Lou Campbell se levantou do sofá, o taser ainda em sua mão, o fio se enrolando novamente conforme o homem se aproximava da garota convulsionante no chão. Ela tinha ficado vermelha, muito vermelha, as veias do pescoço e das têmporas saltadas e parecendo grossos cabos de aço sob sua pele. Sua mão única espalmava espasmodicamente o chão, clap, clap, clap, quase em sincronia com seus pés que faziam aquela dança maluca. Uma mancha escura de urina se espalhou pela virilha de Sophia, manchando a calça jeans.

Lou agachou-se ao lado dela. Sentiu o cheiro do mijo e também de carne queimada. Sophia caíra de costas, e seus olhos verdes fitavam arregalados o teto do quarto, as pupilas mudando de tamanho, indecisas entre encolher ou dilatar.

- Sinto muito, Sophia – disse Lou Campbell. – Eu não queria que você tivesse que passar por isso.

Ela soltou um som gutural do fundo do peito e um jato branco partiu de sua boca, quase atingindo o rosto de Lou. A baba acumulou-se nos cantos dos lábios da garota em piscinas de espuma amarelada. Sophia continuava a se debater, a nuca chocando-se contra o chão duro, mas a convulsão ficava cada vez mais fraca conforme o corpo dela perdia a batalha para a eletricidade. Uma carga contínua de cento e cinco mil volts não é brincadeira. Qualquer um no lugar dela já estaria morto.

- Shiiiu, eu sei que dói, filha – disse Lou. – Sei que dói. Mas vai acabar logo, prometo.

E, de fato, acabou. A mão única de Sophia espalmou o chão mais duas vezes – clap, clap –, seus pés dançaram por mais alguns instantes e diminuíram o ritmo até pararem de bater contra o piso. A garota respirou uma última vez, o ar entrando em seus pulmões com um som gorgolejante de água rodopiando em um cano entupido. Seu peito subiu... desceu... e ficou imóvel. Depois, tudo nela ficou imóvel. Os olhos verdes encaravam vítreos o teto, sem nada ver.

A Voz da Escuridão.Where stories live. Discover now