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Bernard Chapman: Você já se perdeu, Sr. Pullman?

Justin Pullman: Pessoas se perdem de várias formas diferentes, diretor.

B.C: Ah, pode ter certeza. Este mundo é pavimentado com mais estradas que levam à perdição do que com estradas que levam à salvação. Não tenha dúvidas quanto a isso. Basta uma curva fora da rota, um atalho errado, um passo em falso e você se perde e nunca mais encontra o caminho de volta. Em meu trabalho, eu conheci muitas pessoas que se perderam. Alcoólatras, drogados, ladrões, assassinos. Pessoas com bússolas quebradas que apontam o norte, mas que levam direto para o estômago da fera na escuridão. A maioria dessas pessoas é solitária, sem rumo e sem lar. Nada afasta mais você de casa do que a solidão.

"Eu já me perdi uma vez, quando garoto. Eu devia ter cinco, seis anos. Vivíamos no Maine, e havia uma floresta próxima de onde morávamos. Meu irmão e eu costumávamos brincar nela quando nossos pais saíam. Nunca íamos muito longe – geralmente, mantínhamos o telhado de nossa casa sempre visível entre as árvores. Tínhamos medo de entrar fundo demais na floresta e depois não conseguir voltar".

J.C: Até que, um dia, vocês não voltaram.

B.C: Eu não voltei. Meu irmão não estava comigo daquela vez. Tinha ido até a cidade com meu pai e eu fiquei em casa com minha mãe. De repente, pensei que seria uma boa ideia dar um passeio sozinho pela floresta. E foi o que eu fiz. Coloquei meus tênis de corrida, embora mais tropeçássemos do que corrêssemos entre as raízes, e fui. Era um dia gostoso de primavera, não muito quente, mas também não muito frio. Eu não sei dizer para você o quanto andei, mas foi muito, porque, quando olhei para trás, não consegui ver o telhado de casa. O desespero não tomou conta de mim naquele momento. 'Bom, eu não posso ter ido tão longe assim', pensei. 'Consigo encontrar o caminho de volta fácil, fácil'. Bastaram dez minutos zanzando entre as árvores para eu descobrir que não conseguiria encontrar caminho de volta nenhum.

"Hoje em dia eu conseguiria sair daquela floresta num piscar de olhos. Mas, na época, eu não passava de uma criança. Não entendia nada sobre seguir trilhas ou encontrar pegadas, e a única noção de norte e sul que eu tinha vinha da porra de uma bússola de brinquedo que ficava no meu quarto. Então, fiz a única coisa que podia fazer: sentei e esperei que meu pai ou meu irmão me encontrassem. Acontece que a noite me encontrou primeiro.

"Tudo fica diferente depois que anoitece. É como se o mundo usasse uma máscara para caminhar ao sol, uma máscara que ele retira quando cai a escuridão. Isso é ainda mais verdadeiro para aqueles que sentem medo, e eu estava com medo naquela floresta. Estava aterrorizado. Abrir os olhos era o mesmo que mantê-los fechados, porque eu não conseguia enxergar nada. Embora escutasse muito bem a floresta falando comigo: estalando, uivando, rastejando. As árvores respiravam ao meu redor, como vigias esperando que o garotinho perdido morresse para enterrá-lo debaixo de suas raízes. Não sei quanto tempo fiquei sentado no escuro até meu pai me encontrar. Para mim, pareceu uma eternidade. Nunca me senti tão aliviado como no momento em que vi meu pai chegando com uma lanterna. Ele me pegou nos braços e me arrancou dali. Para fora da armadilha que a floresta montara para mim. Ela havia me chamado para seu interior, me guiado para dentro de sua boca faminta e estava prestes a fechar as mandíbulas quando meu pai me salvou.

"Anos depois, quando entrei com minha equipe nas florestas de Fallpound para capturar Abukcheech, me senti novamente como aquele garotinho perdido. Eu sabia que entrávamos em uma armadilha. Conseguia sentir isso no ar. Caminhávamos direto para o estômago da fera, como aquelas almas perdidas com bússolas quebradas. E, ainda assim, fomos em frente. Porque esse era o nosso trabalho. Porque pessoas demais haviam morrido e ainda mais morreriam se não fizéssemos algo. Então, sim, fomos em frente, e eu não me arrependo disso. Embora, até hoje, eu me pergunte se as coisas não teriam sido diferentes se tivéssemos esperado o amanhecer.

"Se tivéssemos evitado a noite, quando o mundo se desfaz da máscara que usa durante o dia e revela o seu verdadeiro rosto".

A Voz da Escuridão.Where stories live. Discover now