|Broken Wings|

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|Collins|

Depois da visita de Harry, não voltei a ver nenhum rosto conhecido. Ainda assim, recebi a visita de um advogado que não quis responder a razão pela qual estava disposto a me ajudar com os procedimentos legais. E por "procedimentos legais" entende-se pedidos formais à Justiça para que liberassem a minha volta para os Estados Unidos, além da orientação do que poderia dizer ao ser interrogada.

Eu comecei a gostar realmente do cara quando ele disse que eu não precisava revelar muita coisa durante os interrogatórios. Considerando o poder das pessoas que me denunciaram, e que continuarei presa independente da minha versão dos fatos, Bashad acredita que a melhor estratégia seja deixar meu testemunho para o dia do julgamento, e até lá tentar reunir provas que comprovem minha explicação para a história.

Minha surpresa foi enorme ao descobrir que ele já havia combinado essa estratégia com meu advogado nos Estados Unidos, porque eu nem sabia que possuía um. Isso me fez pensar em como minha vó recebeu a notícia e no tanto de dinheiro que ela deve estar precisando gastar para pagar um bom advogado.

A questão é que eu entendi rapidamente que não tinha muito direito de opinar quanto ao melhor caminho a seguir. Mas só para constar, eu concordo plenamente com eles.

Então o que eu basicamente fiz nos interrogatórios aos quais fui submetida até agora foi contar a razão pela qual entrei para o Exército e dizer que fui para os Estados Unidos por causa da minha avó.

Obviamente ninguém comprou a ideia de que essa é a única motivação, mas eu não posso dizer que estava escondendo-me com medo do que os caras poderosos poderiam fazer comigo, porque para querer me machucar eles teriam que ter uma razão, e se eu contar minha teoria sobre essa razão, ou vou apodrecer na cadeia ou amanhecer morta.

No primeiro depoimento, diante das minhas respostas curtas, o policial auxiliar deixou marcas no meu braço e fez menção de me dar um tapa por causa da minha pouca vontade de colaborar, mas o chefe da polícia impediu-lhe. No segundo, quando repeti tudo o que já havia contado e me neguei a dizer algo além, o mesmo policial me deu puxões discretos de cabelo. Dessa vez o chefe não notou, e depois de ouvir rumores de que o pelotão estava indo embora naquele dia, cheguei à conclusão de que ele estava ocupado demais pensando no fim de seus encontros com Liam.

Então ele está perdoado pela desatenção. Um coração partido deixa a gente meio alheio a tudo mesmo. Ele não notou que eu estava sendo discretamente machucada, e eu não contei porque não importava naquele momento.

Em verdade, não senti dor alguma, só conseguia pensar em como a vida é uma coisa e de repente torna-se outra completamente diferente.

Naquele dia eu voltei a jogar o jogo do "E se?", que por tanto tempo deixei esquecido. Pensei em como seria se eu tivesse deixado o Exército antes. Provavelmente nada disso estaria acontecendo. Talvez eu pudesse estar em uma faculdade legal, decorando aos poucos o meu dormitório e apenas me preocupando se vou me dar bem com minha colega de quarto. Mas ao invés disso, tudo o que eu tinha era um colchão velho e desconfortável jogado no chão de uma cela qualquer.

Definitivamente não era esse o futuro que meus pais tinham em mente para mim.

Desisti de vez do jogo quando minha mente traiçoeira lembrou que se eu tivesse deixado o Exército antes, não teria conhecido Harry. Eu simplesmente já não sei se não conhecê-lo teria sido uma maldição ou uma benção.

Ele foi a melhor coisa que eu poderia ter, eu sei. Mas todas essas boas lembranças agora só servem para me machucar. Elas vêm a todo instante como um meio pelo qual a vida debocha de mim. É como se o universo jogasse em minha cara que eu só o tive para agora ter de viver pelo resto da vida com essa sensação de vazio.

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