Capítulo 37 - Nervos Aflorados

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Jeremy Mason deixou a janela sentindo o coração apertado. A charrete havia chegado, mas apenas o frei Mamute estava nela. Sobre a escrivaninha, observou os livros espalhados, e respirando fundo, tentou controlar o desconforto no peito. Ficar trancado nunca parecera tão difícil, e aquele dia passava vagarosamente.

Enquanto ajeitava os agasalhos, Jeremy refletia sobre tudo o que passara até ali. Sobre a manhã em que vira Marlon Gayler pela primeira vez, sobre o irmão contando que a chegada do novato viera bem a calhar, pois assim, poderia obter novos objetos a fim de negociar com o velho da vila.

Recordar-se da agressão sofrida por ele ainda causava arrepios, e tudo o que o garoto mais queria era que voltasse logo para buscá-lo. Não bastasse a sensação de opressão causada por aqueles clérigos, todo o tempo Jeremy pressentia a presença maligna no ar. Não podia vê-la, mas pressentia seus olhos vigiando-o.

Sabia que o ser estava em posse de Marlon Gayler, e isto o deixava duplamente ansioso, pois nada podia fazer para ajudá-lo, e tampouco entendia o que pretendia. E assim as horas passavam, trazendo a noite a cada segundo, deixando o ambiente cada vez mais pesado, como se uma nuvem densa estivesse se formando sobre o lugar.

O coração palpitava rápido, e quando sentiu que uma crise estava a se formar, Jeremy sentou-se na cama e fez os exercícios que Marlon o ensinara tempos antes. Com os braços envoltos ao corpo, contava até dez repetindo que aquele era seu espaço, e que em seu espaço estava seguro, até sentir-se controlado.

Ele repetia isso a cada duas horas, foi em um destes exercícios que ao abrir os olhos observou mexerem na maçaneta, e ao fixá-la, percebeu a porta ceder, e então o frei da manutenção entrar trazendo consigo o prato de refeição. Ele se levantou.

— Boa noite rapaz. Está tudo bem por aqui? — o homenzinho questionou aproximando-se, e observou sua feição de espanto. Recolhendo os objetos sujos do almoço, parou um instante a fitá-lo e Jeremy gaguejou.

— Bem? Eu... acho que sim.

O frei sorriu, olhando rapidamente para a janela.

— E o almoço? Esteve bom? — ele questionou caminhando para mais próximo, e Jeremy sentiu um arrepio envolvendo o pescoço.

Aquilo não era normal, um frei querendo saber sua opinião sobre algo. Na realidade o único que ainda se importava com os internos de Saint-Michel era Beterrabas, que estava desaparecido.

An, o almoço? — Jeremy buscou manter a calma, olhando para o movimento no corredor. Então tornou a ele — Estava bom. Ou melhor, muito apetitoso.

O frei novamente sorriu, e a exemplo do rapaz, também olhou para o corredor um instante, então tornou a ele.

— Que bom, eu, fico feliz que tenha gostado. Não sei se sabe, mas quando o inverno chega sempre sou requisitado para ajudar nas cozinhas. Então, deixo de ser o frei da manutenção, para ser um dos freis cozinheiros.

Sorriu meio sem jeito, e Jeremy continuou a estranhar sua atitude. Então o homem se aproximou um pouco mais.

— Mas, não me leve a mau rapaz, eu... bem... gostaria que soubesse que me solidarizo com você em relação a seu irmão — fez uma pausa — Por mais que tivesse um gênio complicado, Dan não me parecia alguém ruim. Bem, ao menos era o que Beterrabas sempre dizia — sorriu.

Eu... obrigado frei — Jeremy gaguejou observando o prato de sopa esfumaçando sobre a escrivaninha, então tornou a ele — Meu irmão apenas não gostava de ficar preso, ele... — sentiu-se temeroso ao falar daquela forma, afinal, não sabia o que o frei pretendia. Preferiu interromper-se por ali — Bem, ele tinha formas próprias de compreender as coisas.

O Exorcismo de Marlon Gayler [Romance Gay]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora