Capítulo 10 - O zunido do vento

Começar do início
                                    

— O idiota deve ter levado um murro certeiro — Gurkievicz comentou recordando o sinal roxo que vira em seu rosto no início daquele dia — Ele sempre pensou ter muita moral, é um lunático mesmo. Até parece gostar de ser castigado. — E entregando alguns copos de alumínio a Gomes, o ouviu completar:

— E agora certamente o padre-diretor vai tomar alguma atitude mais dura — Gomes guardava os copos vagarosamente quando voltou a atenção a Gurkievicz — O que acha que vai acontecer com ele? Digo, não esteve no almoço e também foi suspenso das tarefas. Acha que ficará alguns dias preso no quarto, em jejum?

— Sei lá — Gurkievicz murmurou — Provavelmente sim. Mas se quer saber, acho que Mason deveria era tomar juízo e ir embora de vez. Cotton o odeia, todos sabem disto, e agora, certamente vai usar deste pretexto para justificar uma pena mais dura.

— Como assim? Ir embora? — Gomes o interrompeu confuso — Você quis dizer fugir?

— É claro que não Gomes — Gurkievicz desdenhou — Diferente de nós, Mason não precisa permanecer aqui. — e observando a expressão ainda confusa do colega, passou a explicar-lhe. — O monastério só pode nos segurar enquanto somos menores de idade, porque neste caso, há alguém mais velho que se responsabiliza pela internação. No caso de Dan Mason, completou a maioridade no último outono, tanto que chegou a conversar com o padre-diretor sobre deixar Saint-Michel, mas não foi como esperado.

— E o que houve? — Gomes questionou, agora ambos fizeram uma breve pausa.

— Ele exigiu levar consigo o irmão, Jeremy Mason.

Do outro lado da cozinha, Gayler trabalhava cada vez mais vagarosamente, atento às novas informações. Sentia o coração palpitar toda vez que o nome dele era mencionado.

Desde que chegara ao monastério era assim, o sobrenome Mason tinha a habilidade de deixá-lo desestabilizado.

Então Gurkievicz prosseguiu:

— Uma ideia de ameba, se quer minha opinião. Era óbvio que o padre-diretor não aceitaria a exigência. O monastério sobrevive do dinheiro pago pelas famílias dos internos, e nesse caso, Jeremy é como qualquer um de nós, um investimento do qual os freis não abririam mão. Dan pode até ter se tornado o dono do próprio nariz, mas no caso de irmão, ainda menor, continua sob a responsabilidade de seu tutor, e guarda de Saint-Michel.

Marlon parou mais um instante a pensar sobre aquilo. Se ao menos estivesse perto de acontecer com ele como ocorrera a Dan, tornar-se maior de idade e dono das próprias decisões. Sabia que isto estava bem longe de acontecer, mas quando chegasse o momento, certamente não pensaria duas vezes antes de dar o fora dali.

Interrompendo a reflexão, Gurkievicz prosseguia:

— Depois desse dia a situação deles vem apenas se complicando — respirou ajeitando os cabelos, e agora, removendo alguns pratos a fim de limpar as prateleiras, contou a Gomes sobre a tentativa frustrada de fuga que Dan empreendera tempos antes. — Vendo que não haveria outra forma, Mason resolveu ficar no monastério e tramar um plano de fuga. Deve ter sido frustrante contar os dias para deixar o lugar e na hora H, os planos irem por água abaixo.

"Foi daí em diante que Alex Cotton pareceu tomar um gosto especial em humilhá-lo, sabendo que se Dan reagisse, poderia usar a má conduta como pretexto para expulsá-lo. Então, no último inverno, cansado das perseguições, Dan colocou a trama em execução, só que semelhante a tudo o que faz, isto também deu errado. O que sei é que o padre-diretor ficou tão indignado que o trancafiou por três dias no subsolo, a pão e água".

— Ah sim. Acho que estou me recordando de algo. — Gomes o interrompeu — Eu havia chegado há poucos dias. Lembro-me de acordar certa noite com uma confusão no corredor. Curioso, deixei a cama para ouvir os cochichos, foi quando um dos freis falou sobre uma tentativa de fuga que quase feriu a um dos alunos.

O Exorcismo de Marlon Gayler [Romance Gay]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora