octogésimo segundo

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20 de dezembro de 2003 – Columbus, Ohio

Ontem foi tipo o melhor dia da minha vida.

Foi o dia em que eu dormi na casa do Josh. Também foi o dia do meu primeiro beijo, mas acho que devo contar como as coisas aconteceram por partes.

Começou na aula de Química, quando (do nada), o Josh falou que tinha uma casa na árvore. Até achei estranho ele falar de uma casa na árvore no meio da aula de Química, mas o que aconteceu depois de tudo isso me fez agradecer por não ter questionado por que ele tinha falado disso.

“Sério?”, eu falei. “Sempre quis uma, mas meu pai nunca fez uma pra mim.”

“Quer ir lá depois da escola?”, ele perguntou. Eu nem sabia se minha mãe deixaria, mas aceitei na hora.

Só falei que tinha que falar com a minha mãe primeiro. Então, assim que a aula terminou, eu liguei pra minha mãe e pedi pra eu ir à casa do Josh. Eu até falei que voltaria às oito. Ela deixou. Eu poderia soltar fogos na hora.

Quando a gente chegou na casa dos Dun, a mãe do Josh perguntou se eu ia dormir lá. A ideia nem tinha passado pela minha cabeça, mas já que ela tinha sugerido...

O Josh olhou pra mim, parecendo meio nervoso. Ele queria que eu dormisse lá, e eu também queria. Aí eu falei: “Você pode pedir pra minha mãe, tia Laura?”.

Ela ligou pra minha mãe e o Josh segurou minha mão. Eu quase chorei de tão nervoso que o Josh parecia estar. Quando a mãe dele disse que minha mãe tinha deixado eu dormir lá, eu juro que fui à Lua e voltei.

O paraíso só pode ser assim. Se não for assim, é algo melhor.

Eu e Josh fomos para a casa da árvore. Levamos um monte de coisas: cobertores, travesseiros, uma lanterna e também HQs. O Josh também levou um jogo de tabuleiro, daqueles estilo RPG. Eu não gosto muito de RPG, mas se isso faz o Josh feliz, claro que eu jogo RPG com ele.

A gente ficou lendo HQs até tarde. O Josh tinha levado algumas do Homem-Formiga, e pareceu bem surpreso quando falei que não tinha lido nada dele ainda. Aí ele meio que me obrigou a ler as HQs do Homem-Formiga.

Quando chegou a hora de dormir, eu tive que pedir um pijama emprestado ao Josh. Ele não se incomodou de emprestar, e aí eu tive que trocar de roupa na frente dele. Foi engraçado. Eu nunca tinha trocado de roupa na frente de ninguém. Era estranho porque Josh é só meu amigo, mas... Sei lá. O que tem trocar de roupa na frente dele?

A gente se deitou pra dormir nos colchões que tínhamos levado. Eu estava bem ao lado de Josh, cada um com um cobertor. Estava bem frio e a casinha estava toda fechada. Eu não fazia ideia de que horas eram. Eu estava quase dormindo quando senti Josh me abraçar. Meu coração até bateu mais forte. A gente estava muito perto um do outro.

“Você se incomoda de dormir me abraçando, Ty?”, ele perguntou. Eu respondi dizendo que não, tentando não parecer que estava nervoso. Até agradeci a ele por ter me abraçado.

Fiquei deitado com o Josh por vários minutos. Eu estava de olhos fechados, mas não conseguia dormir. Minha cabeça estava sobre o peito dele e eu conseguia ouvir o coração dele bater. Eu queria chorar.

Destinatário hipotético, eu só tenho 15 anos e nunca tive certeza de absolutamente nada na minha vida, mas eu nunca irei retirar o que irei escrever agora.

Eu amo o Josh.

Se estar apaixonado por alguém é pensar nela assim que acorda e logo antes de adormecer, então é óbvio que estou apaixonado por ele. Se amar alguém é estar disposto a colocar as necessidades desse alguém acima das suas, então eu amo o Josh.

Alguém mais velho riria de mim se eu dissesse que amo o Josh, provavelmente diria que isso vai passar bem rápido. Mas eu sinto que não. Josh é bem mais do que uma pessoa pra mim. Ele é o motivo de eu continuar indo à escola. Se ele não existisse ali, provavelmente eu pediria pra minha mãe pra voltar a ter aulas em casa. Só por causa dele a minha vida tem um pouco mais de cor.

O Josh se tornou mais do que um amigo pra mim. É uma pena que a gente não seja mais do que isso, mas isso já basta. Eu o amo de qualquer jeito. O amor não é egoísta. Querer o Josh só pra mim a todo custo é egoísmo, e o amor não é egoísta. Ele é paciente. Eu amo o Josh e sei esperar até o dia que ele finalmente me ame também.

Destinatário hipotético, enquanto eu ouvia o coração do Josh bater eu percebi isso. Eu soube que ele é a famosa alma gêmea que tantas pessoas querem encontrar.

Eu olhei pra ele, e ele estava dormindo. Estávamos sozinhos. Eu queria ficar olhando para ele até adormecer. Nada era mais bonito do que o Josh dormindo. Parecia um anjo.

Não sei por quanto tempo fiquei olhando o Josh. Nossos corpos estavam praticamente colados um ao outro, e toda vez que eu me dava conta disso, eu me arrepiava. Aí teve uma hora que a mão do Josh acabou saindo do meu ombro e desceu até minha cintura.

Eu fiquei com medo de ele ter acordado, mas ele ainda estava dormindo. Me aproximei um pouco dele, da boca dele. Eu não sei por que, mas eu queria beijá-lo. Ele nem iria saber disso, e até parecia meio errado, mas naquela hora eu não pensei em nenhuma consequência.

Aí eu fechei meus olhos e beijei ele bem rápido. Quer dizer, não tão rápido. Durou o suficiente para que eu conseguisse me lembrar de tudo. Os lábios dele estavam um pouco rachados por causa do frio, mas ainda assim estavam macios. Foi bom, apesar de ele não ter respondido. Aliás, eu posso jurar que ele tinha devolvido o beijo, de alguma forma, mas na hora que eu abri meus olhos, o Josh ainda estava dormindo.

Eu sorri tanto. Meu Deus, minhas bochechas doeram de tanto sorrir. Eu tinha beijado o Josh. Eu queria fazer de novo, mas não consegui. Se o Josh acordasse, eu estava ferrado.

Mesmo assim, eu continuei muito feliz. Puxa, eu beijei o Josh! Eu fui dormir, até pensei que não ia dormir tão cedo, mas acabei adormecendo bem rápido.

Quando a gente acordou, no dia seguinte, eu queria contar ao Josh o que tinha acontecido. Na minha cabeça, ele me beijaria de novo. Mas depois achei melhor não. Ele me acharia um esquisito por ter beijado ele enquanto ele dormia. Não foi muito certo beijar ele assim, mas não me arrependo de ter feito isso.

Mas não sai da minha cabeça o jeito que ele “retribuiu” o beijo. Eu juro por Deus que ele abriu um pouco a boca. Eu juro! Mas como posso ter certeza disso? Já se passaram doze horas desde que isso aconteceu e ainda estou pensando nisso.

A minha mãe foi me buscar às oito. Eu não queria ir embora de lá, mas... é melhor que eu tenha vindo pra casa. Acho que, se hoje fosse um dia normal de aula, eu ficaria com muita vergonha do Josh. Talvez até o Ano Novo eu consiga encarar ele normalmente.

Goner (the one I'm not)حيث تعيش القصص. اكتشف الآن