Capítulo 24

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Joseph Eliot Clark

Zunduri me chamou. Ela era ainda mais parecida com a irmã pessoalmente. Os cabelos pretos e em dreads estavam enrolados em um coque frouxo.

Shaira trouxe um brownie para a irmã e eu fiquei apenas conversando com ela.

— Eliot, que brownie divino! Quem faz isso aqui? Que mãos de fada, deus ou deusa da culinária... – Ela falava com a boca cheia. – Até o bebê gostou, está chutando. – Ela esboçou um sorriso.
— Posso tocar sua barriga? – Ela assentiu com um aceno de cabeça e eu coloquei a mão acima do umbigo. Aquela criança estava realmente agitada. – Eu nunca tinha sentido um bebê mexer antes. – Eu ri e ela me acompanhou.
— Eu não tenho um nome para ele ainda. Pedi que Shaira escolhesse, e quero te fazer um convite também. – Fiz uma expressão indagativa e Zunduri prosseguiu. – Eliot, você quer ser padrinho do bebê?
— Eu... Eu ia adorar. Obrigado, Zun. – Sorri e ela continuou comendo seu brownie.

Ouvi murmúrios da mesa ao lado e Shaira estava parada escutando, pronta para discutir com os clientes, mas eu a puxei e indiquei o caminho para a sala do gerente.

Após a discussão entre os dois rapazes racistas, eles foram embora, mas eu percebi que Shaira ficou mexida com isso. Zunduri se sentou na parte de dentro e eu continuei a trabalhar. Próximo da hora do almoço, Shaira guardou seu avental na parte debaixo do balcão e se dirigiu até a cozinha. Eu fui atrás dela.

— Shaira, por que você não faz queixa para a polícia? – Segurei de forma sutil em seu braço.
— Joseph, sei que um racista sempre vai estar errado, mas, aqui, na terra de gente branca, eu sou a intrusa. Eu me aceito assim e não me preocupa o que os outros acham. – Ela deu um sorriso triste.
— Eu achava isso no começo, Shai, mas parece que agora as coisas mudaram. Você não deveria sentir vergonha de ser como é.
— Eu não sinto, Joseph. As coisas só ficam difíceis as vezes, mas é passageiro. Eu não preciso ser branca para ser feliz, e ser negra não me faz inferior a ninguém. – Ela se desvencilhou de mim, ou pelo menos tentou. Eu só a fiz ficar mais próxima, mas fui interrompido pelo toque do meu celular.

— Alô? – Bufei em um misto de preocupação e decepção.

Quando se tem alguém doente na família, qualquer ligação referente a essa pessoa causa grandes emoções. Nunca se sabe se a notícia vai te deixar mais animado ou te colocar de vez no fundo do poço. Com minha mãe e o câncer em estágio metastático, eu sempre me deixava apto a receber o pior.
A ligação era do hospital, uma das enfermeiras contava que minha mãe estava se sentindo com falta de ar e conseguiu ligar para a ambulância, ela foi levada ao Hospital de Urgências e permanecia em observação. Eu deveria ir visitá-la assim que possível.
Senti minhas pernas fraquejarem e ouvi a voz da minha colega ao longe, se ela não tivesse corrido até mim, estaria quebrado no chão a esse momento.

— Joseph, você precisa beber um pouco de água. Me escute, você está pálido... – Depois de um tempo que me pareceu uma eternidade, Shaira voltou a falar comigo. Minha língua parecia pesar toneladas dentro da boca e eu não conseguia articular as palavras. – Joseph, o que aconteceu?
— Eu preciso ir ao hospital, agora. – Me dei conta de que estava sentado e levantei de sobressalto.
— Eu vou com você! – Ela pegou a bolsa amarela no armário aberto a sua frente.
— Você precisa trabalhar, Shaira. Eu vou agora e te trago as notícias mais tarde. – Os olhos escuros me encaravam atônitos. – Shaira, está tudo bem. – Beijei sua testa e sai antes que ela falasse alguma coisa.

***

Eu odiava dirigir, mas com a minha pressa, teria infartado antes mesmo de chegar no ponto de ônibus ou na estação do metrô, e, além disso, minha mãe precisava de mim.
E

ntrei na ala de emergências e me dirigi até a recepcionista do hospital:

— Nora Clark, por gentileza. – A moça trabalhou agilmente com os dedos no teclado antes de me dar uma resposta.
— Quarto 27, siga nesse corredor reto e vire na segunda a esquerda. É próximo aos sanitários. – Ela sorriu e me entregou um crachá de visitante.

Ela estava deitada e quase parecia fazer parte do lençol de tao pálida que estava. Em seu nariz, o catéter levava o oxigênio necessário para seus pulmões afetados pelo câncer. Ela respirava com dificuldade mesmo usando os aparelhos. Acariciei sua testa e sorri ao ver sua ruguinha de preocupação.

— Eliot... – Meu nome saiu arrastado pelos seus lábios. Ela tentou sorrir.
— Shh. Não precisa falar nada, mamãe. Está tudo bem agora. – Apertei sua mão carinhosamente.

O médico não demorou a me chamar e repetiu as mesmas coisas que eu já estava farto de saber. Ela não ia melhorar nem por milagre, eu já sabia disso, só queria que ela tivesse ao menos a dignidade de ser tratada bem no seu estágio final de vida. Eu iria cuidar para que isso acontecesse.
O rapaz que atendeu minha mãe disse que precisaria instalar uma UTI móvel em nossa casa, para urgências como essa e eu assenti de prontidão. Minha mãe teria as melhores condições até o seu último momento, que, pelo que eu entendi, não estava tão longe assim.

Além da Cor - CompletoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora