Capítulo 15 - Maratona 1K, 4 de 5.

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O sinal foi cortado e eu guardei o celular no bolso novamente.
Aproximei mais a cadeira da cama e acariciei a testa de minha mãe, a sua ruga de preocupação estava acentuada hoje. O medicamento caia em pingos lentos pelo catéter inserido em seu braço esquerdo.
O dreno estava colocado no pulmão do lado oposto ao catéter, o líquido saia aos poucos em uma coloração amarelada e estranha, mas típica de pneumonias avançadas, como a dela. Enfermeiras entravam e saiam de a cada duas horas para verificar o soro e os remédios intravenosos, a partir das cinco horas da manhã, trariam comida de três em três horas para ela e para mim.

Meu telefone vibrou no bolso do casaco. Número desconhecido.

— Alô?
— Joseph, é Shaira aqui. Estou ligando do telefone de minha avó. Já está no café?
— Eu não posso ir hoje. Minha mãe está internada. – A linha ficou em silêncio.
— Eu... Entendo. Mas, veja, eu tenho a entrevista a tarde... Como iremos fazer? – Senti a preocupação em sua voz trêmula.
— A tarde eu irei enquanto você é entrevistada, não se preocupe. Tem algum problema?
— Não, eu só queria saber de você. Falei com Zunduri e... Ela comentou sobre sua mãe. Desejo melhoras a ela, até mais tarde. – Ela desligou.

Eu estou perdido com tudo.

***

Shaira Tutu

Tentei mentalizar boas energias para a minha entrevista amanhã. Só consegui pensar que não seria aprovada e teria de voltar para Zâmbia. Droga, preciso de um chá.

Fui até a cozinha e fiz um chá de camomila, o único dos meus costumes britânicos já que pontualidade nunca foi meu forte.

Me sentei na sala e havia mensagens de Zunduri no meu celular, novamente ela tentava me contatar.

"[6/30 9:24 PM] Zunduri: A mãe de Joseph está doente. Ele me ligou e conversamos, talvez você devesse se aproximar dele."

Visualizei mas não respondi, estava com uma alta carga de ansiedade percorrendo meu corpo. Liguei a TV para tentar esvaziar minha cabeça de todos os meus problemas.

***

— Shaira, já passam das sete horas. Você não vai trabalhar hoje? – Minha avó me sacudiu. Abri os olhos com dificuldade e senti um arrepio muito forte.
— Sim, eu já estou indo.

Troquei minha roupa, escovei os dentes e então liguei para Joseph.

— Alô? – A voz dele estava cansada.
— Joseph, é Shaira aqui. Estou ligando do telefone de minha avó. Já está no café?
Eu não posso ir hoje. Minha mãe está internada. – Sua respiração era arrastada, num ato automático.
— Eu... Entendo. Mas, veja, eu tenho a entrevista a tarde... Como iremos fazer? – Tentei não parecer muito insensível com ele.
A tarde eu irei enquanto você é entrevistada, não se preocupe. Tem algum problema?
— Não, eu só queria saber de você. Falei com Zunduri e... Ela comentou sobre sua mãe. Desejo melhoras a ela, até mais tarde. – Esperei alguns segundos e, como ele ficou mudo, desliguei. Deixei o celular sobre a mesa da cozinha e sai. Fui caminhando para o trabalho.
Fiquei sentada nas escadas até que meu gerente chegasse.

— Por que está de fora? – Ele perguntou, visivelmente irritado.
— Bom dia. A mãe de Joseph está doente e ele não pode vir agora na parte da manhã. Só ele tem a chave. – Dei de ombros.
— A mãe dele? – Ele pareceu hesitar. – Tudo bem, vamos entrar.

Peguei o pano e limpei as mesas antes que os clientes chegassem. A primeira pessoa a adentrar foi a senhora de ontem. Ela acenou com a mão me chamando.

— Senhorita, peço perdão por ontem. Eu prometo não agir de novo da mesma maneira. Você poderia me atender? – Pela primeira vez, ela me deu um sorriso simpático de verdade.
— Claro, não tem problemas. – Me coloquei a sua frente. – O que vai querer?

No horário de almoço, vi Joseph entrar no café e eu guardei meu avental na parte de baixo do armário. Observei meu colega e ele tinha grandes bolsas arroxeadas em volta do olho, ainda mais acentuadas que no dia anterior.

— Boa tarde, Shaira. Eu tenho certeza que você vai passar nessa entrevista e vai conseguir muito sucesso na universidade. – Senti um frio na espinha. –  Vai dar tudo certo. – Ele sorriu.
— Obrigada, Joseph. E, como está sua mãe?
— Vai melhorar. Olha, preciso trabalhar. E mais uma vez, boa sorte na entrevista. – Ele apertou minha mão por cima do balcão e sorriu outra vez.

***

Entrei no edifício da universidade maravilhada. Podia sentir que qualquer pessoa que me visse, diria que meus olhos brilhavam mesmo a uma distância de quilômetros. Era um espaço amplo e eu precisei me sentar duas vezes até encontrar a sala onde seria entrevistada.

— Sente-se, senhorita Shaira Tutu Zummach. – O homem grisalho leu em um papel a sua frente. – Seja bem-vinda ao nosso Campus. Espero que tenha gostado. Eu sou Carl Thompson, reitor dessa universidade. – Ele sorriu.
— Obrigada, eu me senti maravilhada ao entrar aqui, senhor Thompson. É muito melhor do que nas fotos. – Eu me sentei.
— Sempre foi um sonho estudar aqui, senhorita?
— Desde sempre. Oxford é minha meta de vida, e eu acredito firmemente que posso alcançar essa meta. – Ele concordava com a cabeça.

Pelos próximos 30 minutos, discutimos a respeito de minhas ideias de estudo, profissão, falamos sobre bolsas de estudo, sobre as aulas e, enfim, sobre uma possível aprovação.

— Senhorita, nossa equipe entrará em contato a partir da próxima semana e iremos informá-la sobre o resultado de sua entrevista. Desejo uma boa sorte. – Ele sorriu calorosamente, se levantou e apertou minha mão.
— Muito obrigada, senhor Thompson. – Sorri de volta e me dirigi a porta.

Mentalize energias positivas, bons pensamentos, não fique se martirizando, você consegue, Shaira; eu dizia para mim mesma durante todos os 15 minutos de caminhada entre a universidade e o meu trabalho.
Joseph estava sentado na parte de trás do balcão.

— Joseph, o que tem sua mãe? – Perguntei ao ver que ele checava o seu celular a cada 20 segundos.
Meu colega me encarou e deu um longo suspiro. Abriu a boca para falar, mas ouvimos o sino indicando que a porta havia sido aberta por um novo cliente. Ele me olhou e eu fui atender.

***

Além da Cor - CompletoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora