Capitulo 42

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My heart is broke

But I have some glue

Help me inhale

And mend it with you

We'll flow around

• Nirvana - Dumb


DORIAN

Encostei a testa na porta e fechei os olhos, tentando controlar as minhas emoções. As lágrimas deslizavam pelo meu rosto enquanto a rejeição da Angel me desolava a alma. Foi isso o que ela sentiu quando eu a afastei? A dimensão da dor era insuportável.

A chuva caiu. "Claro", pensei. O que seria mais perfeito para um momento trágico, hum?

— ANGEL, POR FAVOR! EU TE AMO!

Sentindo raiva de mim mesmo, esmurrei o muro força. O arrependimento veio logo depois. Prendi o ar e abracei a mão recém machucada contra meu peito, ciente da possibilidade de ter quebrado alguma coisa. Será que tinha como piorar?

Flexionei os dedos, olhando através da janela na expectativa tola de encontrar qualquer sombra da minha garota. Então a esperança foi se esvaindo e o desespero aumentando... Era a Angel. Conhecia o seu temperamento, e depois que a chuva começou apertar, não tive outra alternativa a não ser correr de volta para o carro do Roger e me refugiar por lá.

Com as mãos trêmulas, acendi um cigarro e encostei a cabeça no banco. O sentimento deprimente de arrependimento me torturando a cada segundo. Foi tão estúpido abafar o amor que sentia por ela. Não a deixar saber foi mais estúpido ainda. Era tudo tão óbvio o tempo todo...

Eu podia lembrar perfeitamente do dia em que Angel apareceu na cidade, exibindo aquele ar impassível com seus coturnos surrados. O cabelo liso e comprido até a cintura, negro como um veludo, esvoaçando atrás de suas costas enquanto andava... Os lábios sempre vermelhos, abrigando um cigarro entre os dentes enquanto seus olhos analisavam tudo e todos de um jeito acanhado e indiferente. Não demorou um dia para descobrir que de "anjo" só tinha o nome.

Eu deveria ter dito que a amava em todas as oportunidades. Angel sempre foi tão direta no que dizia seus sentimentos, e em vez de retribuir, eu só conseguia me fechar. Eu sabia que ela queria ouvir, mas não cobrava e permanecia ali, satisfeita com o pouco que eu podia dar. E aquela garota merecia tudo.

   Gritei com ela quando a mesma tentou oferecer apoio e agi como um louco irracional, porque era muito mais fácil lidar com a raiva. Poderia apenas ter dito o quanto ela me magoou, o que não seria mentira, e poderia ter assumido o meu medo. Eu fiz tudo errado.

E a culpa que eu disse ser dela era totalmente minha.

Decidi então acampar no carro. Se Angel queria distância, tudo bem. Mas eu não iria embora até ter certeza de que estava bem.

Joguei o filtro para fora da janela. Àquela altura o frio castigava os meus ossos e agarrar as lembranças era o meu único consolo.

Será que ela ainda dorme rente a parede e ocupa metade da cama? Será que ela ainda veste a minha camisa para dormir sentindo o meu cheiro? Será que ela ainda gosta do frio e liga o ar no mais gelado só para se camuflar por baixo das cobertas?

Ri sozinho. Angel adorava encostar os seus pés gelados na minha pele, só para provocar. Eu me queixava por isso, mas secretamente adorava o choque gostoso que o contato das peles proporcionava. Adorável a forma como de menina sapeca que provocava como uma criança logo se transformava em mulher. Minha mulher...

1994 - A canção Memória oculta LIVRO 1 (Privilegiados)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora