Happy birthday

Começar do início
                                    

     Passou as mãos pelos cabelos, presos em um coque, controlando alguns fios mais rebeldes das mechas que Camila sempre gostara de deixar soltas.

     Tomou sua carteira em mãos, as chaves de seu carro e sua casa, colocou o celular no bolso de trás e saiu. Camila saiu como se estivesse indo embora e deixando tudo para trás. Mas ela não estava. Na verdade, ela estava voltando atrás. Voltando para o passado.

     05 de julho. Era o quinto dia do mês de julho. E isso significava tudo para ela.

     Ligou seu carro, fazendo o caminho que pouco repetira em sua vida, não esquecendo-se de passar em uma floricultura antes de chegar ao seu destino.

     — Seis rosas brancas, por favor. — pediu para a simpática senhora detrás do balcão.

     — Alguma ocasião especial? — a senhora perguntou, com o intuito de arrumar de maneira mais adequada as rosas selecionadas.

     — Não. — sua voz estava baixa, para quem viesse a prestar atenção, estava triste. — Nenhuma ocasião especial. — a senhora assentiu, encarando-a por alguns segundos antes de lhe entregar o que fora pedido.

     — Moça. — a senhora chamou antes que a jornalista deixasse a loja. — Se valeu alguns minutos do seu tempo sempre será especial. — acenou com a cabeça e andou para qualquer lugar mais a dentro da loja.

     Ela não poderia estar errada, não é?!

     O caminho voltou a ser feito, sendo concluído em alguns bons minutos. Camila estacionou o automóvel, encarando a entrada do lugar. Seus olhos caíram para suas mãos no volante, apertando o objeto, controlando o nó que fazia questão em se formar ali.

     Pegou o pequeno arranjo de rosas em suas mãos, descendo do carro em um súbito momento de coragem. Seus passos eram pesados e lentos, quando Camila passou ao lado de uma placa que indicava o nome do lugar.

     "Cemitério Forest, Los Angeles".

     O lugar era bem cuidado. As lápides sempre limpas e organizadas, facilitando a localização dos seus entes pelo grande espaço dividido em setores. Camila estava indo ao setor B.

     Quanto mais perto chegava, mais difícil ficava para respirar. Ela sentia as pernas pesadas, muito embora não estivessem. Sentia os pulmões ardendo, muito embora não estivessem. Sentia uma segunda atmosfera sobre as costas, muito embora isso se chamasse culpa.

     Ela se sentia culpada, no final das contas.

      Os dedos finos deslizaram pela pedra de granito, contornando as letras desenhadas ali.

   Sinuhe Cabello Estrabao
1966-2009
Mãe e esposa amorosa, guerreira e dedicada. Amante da boa música e literatura.

     — Oi, mãe. — sussurrou, dobrando os joelhos e ficando frente a frente com a lápide. Seus olhos castanhos correram pela imagem de sua mãe, logo abaixo dos escritos. — Hoje fazem seis anos. — comentou casualmente. — E eu ainda me pergunto porque eu não estava com você naquela noite. Porque eu não estava em casa para impedir que você me deixasse. — suas bochechas estavam começando a ficar avermelhadas. — Eu me pergunto todos os dias o motivo pelo qual não escutei você. — negou com a cabeça. — Você não queria que eu fosse logo para a faculdade por um motivo, e agora eu compreendo. — deu de ombros. — Compreendo quando você sentou e disse que por você eu só iria aos vinte anos, mas eu sempre fui teimosa, não é?! Eu sempre quis que as coisas continuassem em seu fluxo, e obedecer ao seu pedido era interromper. — fez uma carícia na imagem gravada ali, como se acariciasse a própria mãe. — Você precisava que eu ficasse, que eu ficasse com você. Eu era tão jovem. — as lágrimas começaram a rolar por suas bochechas. — Eu era tão fraca, mãe. Eu era tão perdida, e a senhora sempre esteve lá por mim. Por que eu não estive quando os papéis se inverteram? — seu soluço cortou o, quase vazio, cemitério. Os joelhos tocando a grama, os olhos focados e ardendo. — Por que eu não estive quando você estava fraca e perdida? Mãe, eu sinto muito. — seus dedos tremiam contra o granito, seu rosto banhado em lágrimas grossas. — Eu deixei você sozinha. — a dor em seu peito a fazia ter dificuldades para falar, mas Camila não pararia. Ela não podia parar. — Eu deixei a mulher que me tomou nos braços quando eu tive medo. Por que eu não tomei você nos meus? — os soluços eram fortes e frequentes.

      Com dificuldade, Camila arrumou as rosas brancas, as favoritas de sua mãe, perto da lápide. As pernas fracas demais para se sustentarem. As mãos espalmadas nas coxas e os ombros chacoalhando como se precisassem de apoio. E ela precisava, no fim das contas. 

     O celular em seu bolso tocou, e por alguma razão, diferente dos dias anteriores, ela se dispôs a ver quem estava ligando. O nome de Lauren piscava na tela, e a jornalista não raciocinou quando deslizou o dedo da esquerda para a direita e atendeu.

     — Camila? — chamou afobada. — Você está aí? Camila, por favor. — os labios da jornalista tremeram, deixando um soluço escapar. — Camila? Você está chorando? Pelo amor de Deus, me responda. — ela realmente queria responder. A voz preocupada e angustiada de Lauren a deixavam ainda pior, mas ela não conseguia falar. — Amor, por favor. — suplicou.

     Uma mão feminina e macia tomou o aparelho das mãos de Camila, atraindo sua atenção. Sofia levou o telefone ao ouvido e se ajoelhou diante a irmã, acariciando sua bochecha.

     — Lauren? É Sofia, irmã de Camila. — respondeu à escritora incrivelmente angustiada do outro lado da linha.

     — Camila está bem? Por favor.

     — Fisicamente sim, psicologicamente não. — fora sincera. — Hoje faz seis anos desde o dia em que nossa mãe morreu. — a mais jovem contou, e Lauren sentia o ar escapar das suas narinas. Era esse então o motivo da tristeza e da necessidade de Camila para que Lauren não viajasse. Era essa a grande questão.

     — Eu não sabia... — confessou. — Há uma semana Camila passou o dia ao telefone comigo, era o meu aniversário e ela estava bem... E então ela parou de me ligar ou responder, diga-me que ela não está machucada. Ela se alimentou e dormiu? Por favor! — Camila agora estava sentada com as pernas dobradas. Os soluços haviam cessado, mas ela continuava chorando.

     — Eu não sei dizer. Todos os anos são assim, ela não deixa que eu me aproxime para cuidar dela. — Camila a encarou e Sofia sentiu vontade de chorar. A mais nova podia ver o coração despedaçado de sua irmã através de suas íris. — Eu acho que ela já consegue conversar com você. — esticou o telefone para Camila, que, mesmo relutante, o pegou e levou ao ouvido.

     — Amor? — murmurou baixinho.

     — Oi, amor. — sussurrou, coçando a garganta em seguida.

     — Lucy está dando alguns telefonemas, estarei aí em algumas horas. — Camila negou com a cabeça, suspirando.

     — Não. — tentou soar firme. — Você vai cumprir a sua agenda e voltar para cá no tempo previsto.

     — Não quer que eu volte logo? Eu preciso cuidar de você. — Lauren se sentia mal como há muito tempo não sentia.

     — Não dessa vez. — suspirou. — Você já faz o bastante por mim, eu preciso fazer isso sozinha. — a jornalista foi firme em sua decisão. — Quando você estiver de volta você pode fazer o que quiser, mas não vai largar seus compromissos por mim. Eu preciso fazer isso sozinha. — Lauren suspirou pesado, falando algo baixinho com Lucy do outro lado da linha.

     — Eu juro, eu não vou largar você quando eu estiver aí. — Camila podia perceber por sua voz o quanto ela estava triste. — Você é especial, e eu também vou ficar aqui até quando você precisar.

     — E se eu sempre precisar, Lauren?

     — Então eu sempre estarei aqui, Camila.

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Se é pra tombar, tombei. N

Feliz natal viu, mores. ❤

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