Camila - Camren

LII

Um mero descuido. Era assim que nomeavam a noite de sexo que costumavam ter.

Camila estava na suíte de seu quarto dos tempos de St. Mary e todos haviam ido embora muitas horas antes, inclusive Charlize, que muito timidamente confessou querer dormir com Lauren naquela noite. Karla compreendia o apego e a confiança que a filha sentia pela mulher de olhos verdes, era algo normal e esperado. Cresceu até ali somente com Lauren participando ativamente de todos os seus dias, para todas as instâncias, Camila era mãe, mas também era uma completa desconhecida que aguçava a curiosidade infantil com força.

Já era de manhã, aproximadamente dez horas, e a chuva assolava a janela com pingos furiosos. Abrindo a caixinha com o teste de gravidez, encarou o pequeno copo descartável preenchido pelo líquido num tom amarelo claro e não tardou a mergulhar a ponta do aparelho urina a dentro, abandonando-o lá por muitos minutos. Muito mais controlada do que durante a noite — qual passou chorando copiosamente — compreendeu que não era o momento de se desesperar e precisava ser metódica.

Não adiantava mais chorar pelo leite derramado e agradecia muito por finalmente ter entendido aquela lição.

De braços cruzados e com a cabeça encostada no azulejo caro atrás de si, escutou o apito do teste ecooar banheiro a fora e não precisou de muito para observar o "positivo - 12 semanas" . Seus olhos arderam outra vez, mas não ousou chorar, somente engoliu o medo a seco e sorriu irônica ao compreender que seu presente de aniversário havia chegado atrasado e bem caótico.

Havia completado o ano um pouco antes do natal, e não esperava que aos vinte e cinco anos de idade pudesse ter a proeza — e a falta de sorte — de engravidar outra vez por uma bobeira. Sempre transaram com camisinha quando aquele acontecimento vinha a tona, lotado de desejos reprimidos e quase sempre acompanhados de alcool's devido ao pós-encontro com amigos. Uma noite, somente uma noite de erro foi o suficiente para fecunda-la e gostaria de estapear Lauren Jauregui ao julgar que sua fertilidade era baixa, porque, porra...

Que fertilidade baixa é essa que a engravidou mesmo tomando anticoncepcionais há seis anos atrás e, agora, em uma única noite qual não usaram proteção?

— Ok, respira... Seja breve e direta, você sabe muito bem o que fazer. — Conversava com si mesma, olhando para a tela do celular.

Camila: Bom dia. Está ocupada? Nós precisamos conversar, é urgente. Me encontre no Hard Rock Cafe em uma hora.

Sem esperar por respostas, higienizou o teste de gravidez com cuidado e gardou-o novamente na embalagem, para logo em seguida tirar a roupa e permitir-se tomar banho. Chorou, obviamente, bem lá no fundo sabia estar perdida e confusa, no entanto com a certeza de que não teria a criança e que precisava com muita dor no coração avisar a Lauren Jauregui de que pretendia abortar.

A Ingleterra tinha leis muito liberais acerca de interromper a gravidez de forma consciente e clinicas especializadas estavam espalhadas por todo o país, embora obviamente o assunto fosse debatido entre pessoas que concordavam e discordavam. Era profundo falar sobre um problema tão grande como aquele que englobava tantas coisas a mais como, dignidade, oportunidade, classe social, poder aquisitivo, religião e claro:

A ignorância.

Poderia simplesmente interromper a gravidez e não avisar a outra mãe, mas não era babaca o suficiente e tampouco a mesma adolescente obcecada em blindar o ser que sempre amou. Lauren era uma mulher adulta e tinha que agir como tal ao sentar junto dela para escutar seus desejos acerca do futuro — que não teriam — com aquela criança ainda em fase de formação. Seria doloroso, talvez fosse massacrada pela de olhos verdes e dirigiu pelas ruas nebulosas e frias de Newcastle upon Tyne já preparada para tal. Entrou em ruas, trocou a marca do Volvo luxuoso tantas outras vezes e quando enfim estacionou em frente ao café já conhecido e degustado por todos os seus amigos, respirou profundamente, desatando o cinto de segurança para colocar a bolsa no ombro e sair correndo em cima dos saltos, buscando fugir da chuva ao ver-se acolhida no estabelecimento quente e aconchegante.