<Cap 76 - The Midnight Flower>

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(...CAPITULO NÃO REVISADO...)

À meia-luz, as enormes salas vazias que atravessaram a caminho do telhado pareciam tão desertas quanto palcos vazios, os móveis cobertos de branco erguendo-se à luz como icebergs através da fumaça.

Quando Mew abriu a porta da estufa, o cheiro atingiu Gulf, suave como o toque da patinha de um gato: algo escuro e carregado de terra, e o cheiro mais forte de flores noturnas brotando daturas, trombeteiros, maravilhas e algumas que ele não reconhecia, como uma planta que trazia um botão amarelo em forma de estrela cujas pétalas eram cheias de pólen dourado. Através das paredes de vidro do recinto, ele podia ver as luzes de Manhattan queimando como joias.

- Uau. - Ele virou lentamente, absorvendo aquilo tudo. - É muito lindo à noite!

Mew sorriu.

-E temos o lugar só para nós. Boat e Mild detestam vir aqui. Eles são alérgicos.

Gulf tremeu, embora não estivesse com frio.

- Que espécie de flor é esta?

Mew deu de ombros e sentou, cuidadosamente, ao lado de um arbusto verde lustroso cheio de botões de flores.

- Não faço ideia. Você acha que eu presto atenção à aula de botânica? Não vou ser arquivista. Não preciso saber nada disso.

- Você só precisa saber como matar coisas?

Ele olhou para Gulf e sorriu.

Mew parecia um anjo prateado de um quadro de Rembrandt, exceto por aquela boca diabólica.

- Isso mesmo. - Ele pegou um pacote embrulhado em um guardanapo do saco de papel e ofereceu a Gulf. - Além disso - ele acrescentou - Faço um sanduíche de queijo delicioso. Prove um.

Gulf sorriu com certa relutância e sentou-se na frente dele. O chão de pedra da estufa estava frio contra suas pernas nuas, mas era agradável, depois de ter passado por tanto calor.

Do saco de papel, Mew tirou algumas maçãs, uma barra de chocolate com frutas e amêndoa, e uma garrafa de água.

- Até que não foi um saque qualquer - ele disse, admirando o próprio piquenique.

O sanduíche de queijo estava morno e um pouco mole, mas o gosto era bom. De um dos incontáveis bolsos da jaqueta, Mew pegou uma faca com cabo de osso que parecia capaz de cortar um urso pardo. Ele começou a partir as maçãs em oito pedaços.

- Bem, não é um bolo de aniversário - ele disse, dando um pedaço a Gulf - Mas espero que seja melhor do que nada.

-"Nada" era exatamente o que eu estava esperando, então, obrigado. – Gulf mordeu um pedaço. A maçã tinha gosto verde e fresco.

- Ninguém deveria ficar sem nada no aniversário. - Mew estava descascando a segunda maçã, a casca saía em tiras curvilíneas. - Aniversários têm que ser especiais. Meu aniversário sempre era o dia que meu pai dizia que eu podia fazer o que eu quisesse.

- Qualquer coisa? – Gulf riu. - E que tipo de coisa você queria fazer?

- Bem, quando fiz 5 anos, quis tomar banho com espaguete.

-Mas ele não deixou, certo?

-Não, aí é que está. Ele deixou. Disse que não era caro, e por que não, se era o que eu queria? Ele mandou os empregados encherem uma banheira com água fervendo e macarrão, e quando esfriou... Eu tomei banho.

Empregados? Pensou Gulf. Em voz alta, ele disse:

- Como foi?

- Escorregadio.

- Aposto que sim. — Gulf tentou imaginá-lo como um garotinho, gargalhando, com macarrão até os ouvidos. A imagem não se formava. Certamente ele nunca gargalhara, nem aos 5 anos. — O que mais você pedia?

-Armas, na maioria das vezes - ele disse - Tenho certeza de que isso não o surpreende. Livros. Eu lia muito, sozinho.

- Você não ia para a escola?

- Não - ele disse, e agora falava lentamente, quase como se estives sem se aproximando de um tópico que ele não quisesse discutir.

- Mas os seus amigos...

-Eu não tinha amigos que eu precisava.

Gulf olhou fixamente para ele.

- Nenhum amigo?

Ele encontrou o olhar de Gulf.

-Na primeira vez em que encontrei o Boat - ele disse – Foi quando tinha 10 anos, foi a primeira vez que encontrei outra criança da minha idade. A primeira vez que tive um amigo.

Gulf abaixou o olhar. Agora uma imagem estava se formando, nem um pouco bem-vinda, na cabeça dele: ele pensou em Boat, no jeito que ele olhara para ele. Ele não diria isso.

- Não sinta pena de mim - disse Mew, como se estivesse adivinhando os pensamentos de Gulf, embora não fosse dele que Gulf estava sentindo pena. - Ele me deu a melhor educação, o melhor treinamento. Ele me levou por todo o mundo, Londres, São Petersburgo, Egito. Adorávamos viajar. -Os olhos dele estavam sombrios. - Não fui a lugar algum desde que ele morreu. Nenhum lugar além de Nova York.

- Você tem sorte - disse Gulf. - Nunca saí deste estado na vida. Minha mãe não me deixava nem ir a passeios da escola em Washington. Acho que agora sei porquê – Gulf acrescentou.

- Ela tinha medo de que você pirasse? Começasse a ver demônios na casa Branca?

Gulf mordeu um pedaço do chocolate.

- Tem demônios na Casa Branca?

-Eu estava brincando - disse Mew. — Eu acho. - Ele deu de ombros filosoficamente. - Com certeza alguém teria dito alguma coisa.

- Acho que só não queria que eu ficasse muito longe dela. Minha mãe, quero dizer. Depois que o meu pai morreu, ela mudou muito. - A voz de Luke ecoou em sua mente: Você nunca mais foi a mesma desde que aconteceu. Mas Gulf não é Jonathan.

Mew ergueu a sobrancelha para ele. - Você se lembra do seu pai?

Ele balançou a cabeça. -Não. Ele morreu antes de eu nascer.

- Sorte sua - ele disse. - Assim você não sente falta dele. - Se fosse qualquer outra pessoa, teria sido horrível dizer isso, mas pela primeira vez não havia qualquer amargura em seu tom de voz, só a dor da solidão pela ausência do próprio pai.

- Alguma hora desaparece? - Gulf perguntou. - A falta dele, quero dizer.

Ele olhou para Gulf de forma oblíqua, mas não respondeu.

- Você está com saudades da sua mãe?

Não. Ela não ia pensar na mãe desse jeito.

- Do Luke para falar a verdade.

- Não que esse seja o nome dele. - Mew mordeu a maçã pensativa mente e disse: - Tenho pensado nele. Alguma coisa a respeito de seu comportamento não faz sentido.

- Ele é um covarde. - A voz de Gulf era amarga. - Você o ouviu. Não vai se posicionar contra Valentim. Nem pela minha mãe.

- Mas é exatamente isso...

Uma longa reverberação metálica o interrompeu. Em algum lugar, um sino soava. – Meia noite – disse Mew...

!¿Where it all began?!Onde histórias criam vida. Descubra agora