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Deixo a escova de cabelos sobre a bancada, da pia do banheiro, para passar minha mão no espelho retirando o embaçado do mesmo.

Apesar de ter tomado um banho rápido e morno após minha corrida matinal, foi o suficiente para que o vapor se espalhasse pelo pequeno cômodo. O que me ajudou, de certa forma, a ouvir as leves batidas que foram deixadas contra a porta do dormitório, pois mesmo estando no banheiro a porta do local estava aberta.

Acomodo a escova de cabelos, que havia pego novamente meio segundo atrás, sobre a bancada. Minhas sobrancelhas estavam suave e inconscientemente franzidas, não era comum que alguém viesse aqui. Não mais.

Giro a chave e abro a porta sem grande demora logo encarando quem quer que estivesse do outro lado, querendo resolver o que pudesse estar errado naquela manhã fria de uma quarta-feira o mais rápido possível.

Imediatamente sinto como se todo o oxigênio fosse arrancado de mim, sugados diretamente dos meus pulmões e por isso minha boca se abriu de forma considerável na busca de ar.

— Oi, eu... — Billie diz em tom um baixo, extremamente baixo, rouco.

Tão rouca que a mesma interrompeu sua fala para pigarrear. 

— Eu deixei algumas coisas 'pra buscar, ia vir no começo da semana mas fiquei enrolando só que estou realmente precisando das minhas coisas. — Explica nervosa já que seus olhos não se focavam em meu rosto por mais de dois segundos.

Durante todas essas inúmeras, incontáveis e arrastadas semanas que se passaram fantasiei muitas vezes em como seria a sensação de a ver de novo, de perto, não de longe e nos evitando como nós acostumamos à fazer.

Estava perdida admirando seu rosto bonito; A pele alva e avermelhada pelo vento cortante que soava lá fora, olhos azuis claros e inexpressivos mas diria que confusos.

Confusos porque a estava encarando de modo estático mesmo após ela ter terminado de falar, baixo minha cabeça em rápido movimento encarando às meias em meus pés antes de apertar meus olhos tomando coragem para a encarar novamente.

— Desculpa, só estava... Estava... — Suspiro parando de falar começando a bater a ponta do meu pé esquerdo contra o chão. — Estava pensando. Pode entrar, 'pra... 'Pra pegar suas coisas. — Minha voz foi perdendo intensidade a medida que terminava a frase e me afastava da entrada, a dando o devido espaço.

Billie passa por mim após fazer um educado e contido movimento com a cabeça. O rastro do cheiro de seu shampoo e alvejante de roupas ficaram presos em meu olfato.

Estava paralizada, nenhum pensamento claro passava pela minha mente. Pisco rapidamente saindo daquela posição idiota ainda de frente para porta aberta e fecho a mesma. Não podia me atrasar, era a primeira semana que começara no novo turno na lanchonete.

Vou ao meu closet pegando meu par de All Star e os calçando cautelosamente sem fazer nenhum barulho.

— Por acaso sabe se deixei com você uma das minhas camisetas? Não achei na casa do meu irmão, nem aqui. Acho que a perdi. — Pergunta baixo.

Sabia que camiseta era, estava no meu closet, bem na minha frente, dobrada e deixada na prateleira onde colocava as roupas que usava para dormir.

— Não a vi por aqui. — Minto fechando o meu closet. — Quem sabe a perdeu quando deixou roupas 'pra lavar na lavandaria pela última vez. — Invento uma desculpa enquanto seguia para o banheiro voltando a arrumar os meus cabelos.

— Tem razão. — A escuto concordar seguido de um custoso suspiro. — Vou passar lá depois. Merda, eu gostava daquela blusa. — Foi um baixo resmungo, mas estava atenta a qualquer barulho que ela fizesse.

Cuidava o horário no relógio em meu pulso calculando o quanto mais poderia ficar inventando coisas para fazer na frente do espelho, no banheiro, antes de ficar totalmente atrasada.

— Então... — Ouço Eilish dizer e a encaro imediatamente, estava em frente a porta com a mão estendida rente a maçaneta, como no dia em que foi embora. — Vou indo. Obrigada por me deixar buscar o resto das coisas. — Agradece e movo minha cabeça minimamente.

E quando ouvi o barulho da porta sendo aberta foi como se o choque tivesse acabado, eu estava reagindo, meu coração começou a bater forte e rápido, o sangue era bombeado furiosamente pelas minhas veias me fazendo sentir calor. E quando Billie pôs os dois pés para fora do dormitório não consegui segurar o impulso que me atingiu de modo desprevenido.

— BILLIE! — A chamo em um tom claro e alto refazendo seus passos de maneira rápida, me choquei levemente com suas costas logo na saída.

Ela apenas parou e se virou, me olhando, esperando com que eu explicasse o que queria ou então o porquê de ter agido assim.

Mas não tinha resposta para isso. Nenhuma. Só que precisava inventar uma.

— Eu menti. — Digo baixo e sua expressão não mudou, menti sobre tantas coisas que nem deve mais fazer diferença para ela, uma a mais ou a menos. — A camiseta. — Esclareço. — Vou buscar, se me der um segundo. — Falo e me viro porém sua mão livre é mais rápida e agarra delicadamente meu pulso, me impedindo.

— Não tem problema, pode ficar com ela. — Fala baixo, entretanto, seus dedos não me soltam, ficamos paradas, lá.

Perdi o controle da minha respiração ficando ofegante e nesse desespero meus olhos se inundaram de lágrimas.

— Estou tão cansada. — Murmuro deixando com que os rastros quentes escorregassem pelas minhas bochechas. —Tão cansada de viver sem você. Esse quarto é tão vazio e frio à noite. Cansada de torcer 'pra não te encontrar nos corredores ao mesmo tempo que torcer 'pra encontrá-la e, quando isso acontece, cansada de me esgueirar e fugir sabendo que o que mais quero é estar perto. Cansada de reviver nosso último abraço, porque sei que a cada vez que revivo já esqueci de mais uma das sensações que sentia ao fazê-lo. Faz tanto tempo. — Minha garganta se apertava me causando dor a cada palavra que dizia.

Meus pulso foi bruscamente puxado ao mesmo tempo que o barulho da caixa de papelão, entre o braço esquerdo de Billie, ia de encontro ao chão.

Suas mãos frias foram posicionadas uma de cada lado de meu rosto e um cauteloso selar foi deixado em minha testa.

Sentindo seus lábios quentes e macios contra a minha pele em um ato de afeto tão genuíno, eu desabei. Os sons do meu choro e soluços tomaram conta do corredor que começava, lentamente, a ficar movimentado.

— Você vai melhorar, Lotte. — Fecho os olhos diante do meu apelido em sua voz. — Vai passar e tudo vai ficar bem. — Sussurra e sela minha testa mais uma vez de forma demorada antes de se afastar e pegar suas coisas jogadas no chão.

Billie foi embora pelo corredor extenso sem olhar para trás.

{···}
Notas da autora:

Hey,
Quem é vivo sempre aparece...

E então, gostaram?

Bom final de semana.

Amo vocês ❤

Cuidem-se.

Call 666 • Billie EilishOnde as histórias ganham vida. Descobre agora