Capítulo 27 - Aonde o Diabo Não Irá

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O penúltimo dia de 1935 começara de modo peculiar.

Às dez da manhã, cercados por café quente e torradas, Jack Johnson, Oz Ward e Thelma James preparavam-se para conversar. O dia nublado ensaiava raios de sol, embora a branquidão fosse insolente aos olhos de Jack, que optara por sentar-se à frente da janela. Estava exausto, a ponto de buscar no céu chamuscando seus olhos uma forma de despertar.

— Obrigada pelo café da manhã — Thelma quebrou o silêncio.

Oz coçou a garganta, atenuando seu desconforto.

— Disponha, senhorita.

Os dois, então, dirigiram o olhar a Jack. Havia sido o detetive quem evocara aquele encontro.

— Tenho uma notícia — suspirou ele portanto, dando um gole no café quente; o líquido descendo rascante por sua garganta e atiçando seus neurônios. — Eu vou me mudar para San Diego. No dia quinze de janeiro. Fui chamado para comandar a delegacia deles.

— Isso é gozação? — foi Oz quem se pronunciou primeiro.

Jack deu risada, colocando sua xícara no pires. Ele espiou a ilustração de margaridas escolhida por Oz para a louça do apartamento; a inquietude em suas emoções aumentando conforme o detetive se deparava com a brusca mudança que se aproximava.

— Não — disse, simplesmente. — Mas o que eu direi agora vai soar ainda mais engraçado. Eu fui ameaçado por Randall Waters, creio que a mando do prefeito. O delegado, solícito como de costume, disse que caso eu não saia da cidade, você será o próximo alvo. O primeiro, aparentemente, foi a Cassandra.

Oz permaneceu atônito por alguns instantes, seus olhos escapando às próprias mãos que apoiavam-se na mesa.

— Ele sabe de mim? — Thelma indagou, temerosa.

— Não tenho certeza... é possível. Ele comentou sobre meus "conhecidos" no Times - Picayune.

— E sua solução mirabolante será fugir? — Oz interveio, apreensivo. — Abandonar a sua própria guerra?

O detetive levou o café aos lábios outra vez. Ele sorria; um sorriso diabólico que ostentava tudo que ele tinha de melhor. íris azuis saltavam à luz fria, misteriosas e perversas.

— Não, Ozzy. Minha solução é seguir o conselho que o próprio Randall me deu... conquistar poder. Eu vou tirar o imperador do trono e o bobo da corte da delegacia — o vapor do café sobrevoava a frente do rosto de Jack, o aroma forte ativando ainda mais sua consciência. — Estarei em San Diego, ele sabe disso. Mas ele não sabe que vocês continuarão aqui... agindo.

Thelma estava taciturna, ouvindo-o com atenção, embora sua garganta ameaçasse fechar a qualquer instante.

— Jack... — ousou chamá-lo pelo primeiro nome. — Para ele chegar até mim... — Sua voz travou. Ela fechou os olhos, respirando fundo. — Eu não tenho o apelo da população... esse poder é só seu. Se eu desaparecer, ninguém vai saber.

— Eu vou saber. — Oz intercedeu; rendendo-se ao ímpeto de repousar sua mão sobre a dela. Thelma não o afastou. — Lhe garanto que não há nada que precise temer.

Thelma encarou-o, buscando qualquer nervosismo, tão frequente no comportamento dele, mas não encontrou nenhum. Sobre Oz pairava uma seriedade até então desconhecida pela mulher. Os olhos castanhos do policial brilhavam, refletindo os dela.

— Tudo bem — assentiu. — Eu confio em você.

— Também dou a minha palavra que a senhorita estará segura — acrescentou Jack. — Agora, vamos ao plano.

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