— Jungkook! — Áurea chutou a porta trancada, do outro lado. Gritando e berrando.
Dei um olhar incisivo para James, que tentou cobrir o corpo de meu precioso Jimin. Estaria mentindo caso dissesse que chorei no banho. E, droga, estava mais que evidente que estou péssimo, acabado. Chegar ao nível de chorar é desespero e colapso, ainda mais para um demônio. Estou com todas as minhas estruturas abaladas, mas ainda posso aguentar. Só mais um pouquinho e Jimin pode retornar de novo. Sei que pode.
Ao girar a maçaneta, Áurea a empurrou e apontou com os dedos magricelas em meu peito.
— Você destruiu minha vida.
Os olhos estavam inchados e mesmo assim a garota continuava bonita.
— Você destruiu a vida do Jimin, também.
— O quê? — Travando o maxilar ela respirou fundo, contentando-se em apenas respirar ao invés de surtar como costumava fazer. — Pode até ter sido, mas foi legal pra ele depois. E, olha isso. — Me olhou de cima a baixo, com desprezo. — Acabou te conquistando. Aposto que aquele serzinho irritante acabou dando pra você.
Áurea fez uma pausa e lentamente percebeu a presença de Carter.
— Quem é esse? — Ela arqueou a sobrancelha, levantando o leve biquinho que utilizava para seduzir alguém.
— James. — Ele se esforçou para não gaguejar. Até quando sorria era notável que nas laterais dos lábios tremiam.
— Você parece nervoso. — Ela sorriu, obviamente pensando que se referia a ela. Porque, para Áurea, o mundo girava em torno de si. Ela gostava quando os meninos a desejavam tanto ao ponto de não serem confiantes, ato que ocorria quase com a maioria deles. Talvez eu a tenha cativado por não ter isso e sim ter sabido como agradar ela, sem inseguranças. — Gosto disso. — Jogou os cabelos louros e ondulados para os ombros, onde o rosto se tornava ainda mais saliente ao fazê-lo. — Nunca te vi por aqui.
— E nunca vai ver. — Fechei a porta, suspirando. Meus dedos transpassaram entre meus fios, ato o qual fazia sempre que estava exausto ou desconfortável.
Áurea virou para mim, fazendo uma careta.
— Qual é, quer o fazer ter nojo de mim, também?
Dei de ombros e coloquei minhas respectivas mãos em cada bolso da calça moletom. Era bom estar de volta, porém seria melhor ainda com Jimin.
— Precisamos de você. — James comentou.
— Ou seu pai morre, você quem sabe. — Completei, porque pela forma como Carter era jamais ressaltaria que os ralés estariam com Crowler, o aprisionando.
O executaria de qualquer jeito.
— Pegar a espada de arcanjo já não foi suficiente, amor?
— Nunca é suficiente, Áurea.
Ela piscou rapidamente duas vezes, mantendo o autocontrole. Bem melhor que prender a respiração.
— O que você fez? — Ela relutou, provavelmente percebendo que se eu a ameaçava é porque tinha algo importante para ela em mãos. Áurea havia perdido a mãe quando escalavam o monte Everest e a mulher caíra do topo, por isso valorizava ainda mais o pai. Crowler certamente poderia ter feito algo utilizado seus poderes. Acho que, no fim de tudo, ele queria ter o amor da filha somente para ele.
— O seu pai fez.
— Foi culpa sua, Jungkook. — Carter comentou, friamente.
— Alguém pode me explicar? — Tentou parecer autoritária, porém perdeu a postura assim que roera a unha do dedo indicador. Ela ficava linda dessa forma.
— De uma forma bem resumida o seu pai queria o Jimin em troca da informação de onde e como poderia atrair a atenção do anjo que Jeon queria matar lá. É meio confuso, mas seu pai acabou torturando o Jimin e agora ele está...
— Morto? — Ela sorriu, totalmente orgulhosa e Carter assentiu vagarosamente.
Minha vontade era de esganá-la até que morresse, porque estava aliviada sem a presença de Park. Até parecia que era o plano dela, também. Mas querendo ou não ela possui o dom do pai, mesmo que seja diferente dele. Apenas ela e o próprio Crowler pode ressuscitar Jimin e a segunda opção é a menos viável.
— Ele o quê? — A porta escancarou e Taehyung deu um passo para frente, totalmente aturdido e pálido.
Áurea virou e comentou um ''ops'' sem precisar utilizar a sonoridade do tom de voz.
— Morto, sabe? Acho que foi pro inferno.
— Eu saberia caso ele estivesse lá. — Murmurei, notando, pela primeira vez, que fez todo sentido. Serafim poderia ter o pegado para me torturar e presumido tudo muito antes de eu voltar para resgatá-lo. Talvez estivesse se referindo a isso sobre quando disse que iria lembrar-me dele e conhecer a dor... Muito filho da puta.
Mas vai dar certo. Tem que dar...
— Me diz que isso não é verdade. — A voz de Kim embargou-se de tristeza e raiva, mesclando-se totalmente.
Áurea sentou na cama que Jimin estava coberto e gritou repulsivamente.
— Aí, merda, ele não está mesmo mentindo. — Passou as próprias palmas da mão por todo o corpo na tentativa de evitar bactérias invisíveis.
Taehyung olhara no mesmo ínterim e mordeu os lábios. Podia ver sua alma rasgando-se, sendo esfaqueada em dores indesejáveis.
— O que — Ele suspirou, proferindo pausadamente. — você fez com ele?
Os prantos começaram a escorrer e Taehyung saltou, transformando-se em lobisomem no ar, as roupas voando para todos os lados ao serem rasgadas, pousando perfeitamente no chão. Ele rosnou, emanando os dentes totalmente afiados e organizados, firmando as patas sobre o chão do quarto logo em seguida.
Os olhos vermelhos encararam os meus e notei que em uma semana fora Kim havia conseguido se transformar em alfa da alcateia de lobos da Strong.
Aproximando-se velozmente, Taehyung pulou em cima de mim, as patas de garras potentes rasgando minha camisa. A marca de suas unhas horrendas havia ficado ali, penetrando minha pele. Balbuciei baixinho, porém logo em seguida pinicou e formigou, curando rapidamente.
— Droga, vou ter que tomar outro banho.
Segurei as patas da frente com habilidade, utilizando as pernas para empurrá-lo para trás. Kim caíra na escrivaninha, destruindo absolutamente tudo com seu peso.
— Ei, não é assim que vamos resolver as coisas. Temos que ressuscitar Park, é muito mais importante que brigar. — Carter pôs-se na distância entre mim e Kim, porém de nada resolveu. Taehyung o empurrou com seu corpo firme, ainda mais irritado do que outrora.
A sensação de fogo retornou na palma de minhas mãos e o circulo em chamas formou-se rapidamente. Mirei em seu dorso, atirando incessantemente. Ele gemia, mas claramente não eram chamas que poderia detê-lo. Ainda mais com raiva.
Me joguei para a outra extremidade do quarto quando ele pulou novamente, batendo as costas na parede. Havia uma faca de prata sobre a cadeira há muito, desde a última vez que tinha estado ali. O peguei de forma hábil e nesse instante Kim estava em meu encalço. Ele rosnou, mas desta vez, de forma estridente. Reverberou por toda a Strong.
Assim que o corpo peludo e monstruoso se aproximou, enfiei a faca em seu abdômen. Ele grunhiu, porém ainda rosnava. Cambaleou para trás alguns míseros passos e tombou no chão, transformando-se em homem outra vez. Estava nu.
Levantei, suspirando. Já estava exausto o suficiente, não tinha animo em brigas. Apesar de que com Kim sempre tive a vontade de fazê-lo apenas para prova-lo que ele não era tudo isso. Mas não importava. Jimin está morto, porra. Morto.
Andei até o guarda-roupa ao ouvir os gritinhos hormonais de Áurea pirando e peguei uma calça qualquer e uma das mil camisas pretas largas.
A garota abaixou diante dele e retirou a faca, que a expressão deprimente de Kim pedia em um grito silencioso para fazer. Tentando não parecer fraco, gemeu de dor apenas uma única fez, embora soubéssemos que prata era sua fraqueza. Uma faquinha também não seria grande coisa.
— Quero ver ele. — Suspirou, a voz cansada.
Joguei as roupas para ele, que as agarrou em uma vertigem rápida.
— É melhor não, quando eu vi chorei bastante. — Carter comentou, os olhos lacrimejando.
— E toda a atenção volta para Jimin de novo. — Ela revirou os olhos, apesar de não querer tirá-los do corpo atlético de Kim.
— Áurea, caralho. — Caminhei até ela, segurando um pouco forte demais em seus ombros. — Dá pra parar de pensar em você por um único momento? Ele está morto, porra.
Kim direcionou-se para o banheiro, entre tropeços.
— Então meu pai fez um ótimo trabalho.
Fixei meus olhos nela, tão profunda e intensamente que a garota começara a tremer. Havia começado a ver a aura preta, podre de tanto pecados e egocentrismo. Podia, em um simples toque, acabar com ela, que era muito vulnerável a mim há bastante tempo.
— Você não vai corroer minha mente. — Ela tentou se afastar, totalmente apavorada.
Coloquei lembranças terríveis no consciente que ela lutava para esquecer. Um deles fora a morte da mãe, detalhadamente, caindo desesperada e despreparada do monte, berrando, gritando por ajuda e o próprio pai sem saber o que fazer ou atuando bem demais capaz de enganá-la.
— Não, você não pode. — Ela colocou as mãos no cabelo e puxou fortemente cada fio. As lágrimas haviam retornado de formas aflitas, rápidas, torturando-a psicologicamente. — Não, Jungkook. — Ela gritou e caiu de joelhos no chão. A última lembrança que tinha de mim fora todas as vezes que me vira com Jimin, conversando e o tocando. Até mesmo imaginações férteis e convenhamos, verdadeiras, apareciam. Áurea nunca tinha superado o que sentia por mim e jamais conseguiria fazê-lo. Ela havia caído em um dos encantos sem fim.
— Vai matar ela também? — Taehyung me empurrou, extraindo toda a concentração que havia tido à proporção que segurava levemente o local lesionado. Áurea ainda gemia, gritava, berrava para que todos ouvissem, na esperança de ser socorrida dos piores traumas e amores de sua vida ridícula.
— Que se foda. Eu quero que Jimin fique bem.
Falei pela primeira vez em voz alta, que parecia me atormentar mais do que quando pensava comigo mesmo. Era uma realidade horrível que tento evitar, mas quando proferida para todos me consome como o pior peso de fardo que já carreguei.
— Nem era pra você estar aqui.
— É mesmo. — James concordou, acariciando cuidadosamente o ombro de Áurea.
— Nem você devia. — Taehyung respondera.
— Por um lado é verdade. — Ele deu de ombros, rindo. — Quanto mais pessoas souberem disso aqui — Apontou para Jimin. — mais rápido as que não sabem irão suspeitar.
— Parabéns, pela primeira vez na sua vida você disse algo coerente. — Olhei para a escrivaninha, que era irrelevante no momento. — Vai me pagar outra. — Taehyung fez uma careta automaticamente ao ver que Carter fazia também. — E, não se refira a Jimin como se ele fosse algo ruim.
— Ele com certeza não, mas a situação é. — Firmou a voz, repelindo todo desespero de outrora. — Vai que outra pessoa passe pelo quarto e ouça igual esse maluco aí.
— Primeiro que eu não sou maluco. — Se defendeu. — Quis vir me resolver com Jungkook.
— Ah, pelo o que eu disse? — A risada ecoou repentinamente e minha barriga se contraiu. — Sim, ele estava bastante triste por sua causa, mas também ansioso. Só que eu o ajudei. De nada.
— Estou vendo. — A mandíbula semicerrou e os olhos dele estreitaram ao encarar Park. — Sabe, eu poderia quebrar seu pescoço agora mesmo. — Ele coçou atrás da nuca, os olhos oscilando rapidamente como se tentasse não pensar que fosse verdade. — Mas se você está fazendo tudo isso é porque, inacreditavelmente, se importa com ele. — Apontou para o corpo sem vida, acima da cama, coberto por lençóis escuros. — Você merece passar por tudo que está sentindo, mas ele não merecia. Se conseguirmos fazer mesmo essa merda de ressureição quero que fique longe dele. — Ordenou, o tom de voz ríspido.
— Isso ele quem vai decidir. — Murmurei, embora fosse o que iria fazer desde o início, por escolha própria devido às circunstancias.
— Espero que se contorça por dentro e morra de tanta tristeza. — Cuspiu as palavras na minha cara e normalmente falaria algo irônico, porém nisso ele tem toda a razão. Minha alma não descansará, porque, que porra, Jimin é o amor da minha vida, e ele está morto. Morto.
Sabe como pesa isso?
E, pelo visto, a de Taehyung também. Por essa razão me entendia completamente.