63. Detetives

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4 DIAS DEPOIS DOS CRIMES

25/02/17 – sábado, 17h30

A notificação do IML era o plot twist que o detetive estava esperando. O suposto suicídio, agora comprovado como um homicídio, mudava tudo, inclusive a posição de May nesta história toda. No entanto, antes de abordar a editora-chefe da Hora de Ler com um mandado de prisão preventiva por ter se tornado a suspeita principal na morte de seu marido, a dupla de detetives já sabia aonde ir para apurar mais, e não poderiam mais perder tempo.

Depois das apresentações formais, os dois investigadores se encontravam dentro da sala de monitoramento e controle do supermercado Carrefour, com o chefe da segurança operando os computadores que passavam vários vídeos captados pelas câmeras obsoletas em termos de inovações tecnológicas.

O detetive já tinha emaranhado todo o seu cabelo com a impaciência que lhe corroia ao ver a destreza de merda com a qual o operador manuseava o mouse e o teclado.

Olhou pela janela o grande estacionamento arborizado (e apinhado de carros, diga-se de passagem, por causa dos foliões atrasados abastecendo seus carrinhos de compras como se houvesse um apocalipse zumbi iminente, no feriadão) e percebeu que a escuridão já havia engolido Sorocaba.

— Aqui — disse o segurança apontando para a tela com um vídeo pausado. — Arquivos de vídeo do dia 21 de fevereiro.

— Vá para às 19h00, por favor. Quero ver a partir daí. — A detetive se aproximou.

O segurança, catando milho no teclado, deu um jeito de acelerar dois vídeos, das duas entradas de veículos do supermercado. Quando o visor no monitor foi para 18h59, ele deu play e o vídeo começou a rodar normalmente.

— Procuramos por uma Tucson, na cor prata. A placa eu tenho aqui no relatório. — E o detetive buscou um documento em sua pasta.

A detetive apenas observava atenta aos dois vídeos, que mostrava o entra-e-sai de vários carros.

Depois de sete minutos sem localizarem o carro de May, o detetive, passou as mãos no rosto como se estivesse limpando a oleosidade da pele, pediu:

— Avance de novo — e se aproximou mais ainda do monitor. Em 19h24, a câmera do acesso pela Avenida Ipanema, mostrou uma Tucson entrando. A placa batia. — É ela. Volte um pouco e dê play.

Viram May entrar no estacionamento assim como as dezenas de pessoas que haviam visto naquele curto espaço de tempo.

— Ok, ela esteve aqui — A detetive se manifestou.

— Nos mostre agora onde ela estacionou o carro, por favor — pediu ele, depois de dez segundos de silêncio, vendo os outros carros chegarem à cancela e as pessoas apertando o botão para abri-la.

— Bom, nessa tela aqui — apontou o segurança, massageando com a outra mão, a sua pança protuberante — dá para vermos o automóvel indo para a "ala A" do estacionamento. Não temos câmeras filmando todo o estacionamento, pois nossos guardinhas ficam circulando para garantir a ordem — falou, orgulhoso — mas vejam, ela deve estacionado entre o "A1" e o "A10", certeza.

— E tem alguma câmera que pegue a imagem panoramicamente?

— Tem uma central, mas como viram, existem muitas árvores para aquele lado perto da pista de caminhada, então, não dá pra ver.

Mesmo não gostando tanto da ideia de não poder ver May chorando por horas dentro de seu carro estacionado, ele sentou-se ao lado do segurança e disse:

— Bom, então nos resta vigiar todas as câmeras para ver se o veículo deu saída antes do horário que temos.

Os três vigiaram. Todo e qualquer carro que aparecia se movendo lhes chamavam a atenção.

O detetive mantinha-se atento até às pessoas que apareciam circulando no estacionamento pelo monitor da tela que mostrava a vista panorâmica do estacionamento arborizado. Seu desconforto foi aumentando conforme o tempo nas telas iam correndo. Seu coração disparou quando os monitores mostraram o horário que, teoricamente, o detetive esperava flagrar o carro de May saindo do supermercado rumo à Editora Hora de Ler. Sentiu suas costas retesadas. Precisava relaxar, mas estava muito concentrado.

— O homicídio deve ter ocorrido por volta dessa hora — informou a detetive.

— É — devolveu ele, carrancudo.

Nada de nenhuma câmera mostrar o carro saindo.

O tédio estava prestes a explodir a pequena sala de monitoramento do supermercado. De repente, uma mulher magra de cabelo curto, cortado no estilo capacete, e de óculos escuros, apareceu numa das telas indo em direção a entrada do supermercado. O monitor mostrava exatamente 20:15.

— É ela, aqui, vejam — informou a detetive, que foi a primeira a notar May no vídeo.

O detetive deu um murro involuntário na mesa, fazendo o teclado e o mouse e outros itens de escritório trepidar. Merda! Mas que droga!

A cara de espanto do segurança poderia ser o alívio cômico de uma cena tensa.

— Coloque o vídeo que capturou a entrada dela, quero ver essa mulher. Quero saber para onde ela está indo.

O segurança obedeceu. A tela agora mostrava May entrando às 20:17 na farmácia próxima aos caixas.

Alguns minutos depois, os três viram ela sair da loja com uma sacolinha e uma garrafa de água na mão, cobrindo seus olhos com as lentes dos óculos escuros. A câmera mudou. Agora ela transitava pelo estacionamento em direção ao local onde estava o seu carro.

A Tucson prata finalmente entrou no campo de visão da câmera e foi vista indo até a saída. Passou pela cancela às 20:27 conforme o mostrador.

O rosto do detetive estava vermelho.

A detetive olhou para ele e disse:

— Precisamos ir até o Chamonix Plaza Hotel.

— Com certeza, vamos! — disse ele. — Quero uma cópia desses vídeos — falou ao segurança, entregando seu cartão.

Depois de agradecer pela colaboração à gerência do departamento de segurança, eles rumaram para o Chamonix.

Lá, depararam-se com as informações que batiam com o depoimento de May. Foi um balde de água fria.

Com a carranca de pensativo e preocupado, o detetive confessou para a parceira:

— Mesmo assim, alguma coisa não cheira bem... A editora está escondendo alguma coisa da gente. Pode até ser inocente, mas ela sabe mais do que está nos contando. — Ele sentiu a mão leve dela em suas costas, dando tapinhas confortantes e disse:

— Está tudo bem. Seguiremos com as investigações e iremos resolver toda essa bagunça, como sempre fazemos.

Engolindo a raiva, a frustração e o ego, ele agradeceu com um gesto positivo de cabeça e ela sorriu para ele.

Neste momento o telefone dela tocou.

— Detetive Olívia falando. — Olívia ergueu as sobrancelhas ao ouvir. Havia uma expressão curiosa em seu rosto. — Ok. Entendido. Estamos indo para aí agora mesmo.

— O que foi? — perguntou ele, voltando ao seu estado ansioso quando ela desligou.

— Era ela, May. E ela disse que precisa nos mostrar um vídeo — Depois da reação dele, ela continuou: — Realmente ela tinha algo a mais para nos revelar, porque acabou de afirmar que possui um vídeo muito importante para as investigações e que, inclusive, vai solucionar todo o caso.

Como escrever, matar e publicar [Vencedor do Wattys2020]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora