18. May

342 101 36
                                    

15 DIAS ANTES DOS CRIMES

06/02/17 – segunda-feira, 7h15

Norberto chegara de São Paulo na noite anterior e não a procurou. Desvencilhou-se facilmente com algumas desculpas rasas envolvendo "cansaço" e foi se deitar. O quarto espaçoso já deixara de ser o ninho de amor dos dois há tempos, e ela, sem nem se preocupar, dormiu também, ansiosa pelo dia seguinte.

Ela rolou na cama quando Norberto veio acordá-la. Ela gemeu em protesto.

— O que foi, meu bem? — quis saber ele.

— Não sei, estou me sentindo... — A palavra era "maliciosa" — zonza.

— Está com tontura, é isso?

— Parece que sim. — Ela se ajeitou na cama, ficando sentada e cobrindo os olhos como se eles estivessem sensíveis. — Mal-estar.

Silêncio e suspiros.

— Desculpe não ter dado tanta atenção à você ontem à noite, quando cheguei, mas eu estava realmente cansado.

Ela fez sinal com a mão: "Deixa pra lá".

— Teve pesadelos, amor? Acordei umas três vezes. Senti você se mexendo bastante enquanto dormia.

— Ultimamente ando tendo sonhos ruins — disse ela, recordando-se da emoção que sentiu quando decifrou o sentido da foto do Drive. — Saudade de quando acordava e não me lembrava de nada.

— Quer contar o que anda sonhando?

— Ah, bobagem, não se preocupe.

Eles estão mesmo te fazendo bem? — Norberto quis saber, referindo-se aos medicamentos.

— Estão. Estão, sim. Mas às vezes eles me derrubam.

— Realmente você aparenta estar um pouco mais fraca — concordou Norberto, falando do pé da cama, enrolado numa toalha grande na cintura, a qual destacava seu volume. — Já que está fazendo uso desses remédios, que tal dar um basta nessas dietas doidas? Você deveria comer mais, e melhor. Tudo isso que toma é forte, você precisa forrar bem o estômago.

May olhou para ele, o volume, e, pela primeira vez, sentiu enjoo. Quando pensou que estava dividindo aquele pênis com alguém, fez careta, meio enojada. E isso foi bom, pois, desta vez, sua feição foi convincente no quesito "Não 'tô legal hoje".

— Sente alguma dor? — perguntou ele, notando a expressão dela.

— Nada, só enjoo. — Ela decidiu pela sinceridade. — E não, não estou grávida. — Riu sem vontade. — Estou com dor de cabeça também. — Ela exagerou no drama barato na voz, tentando convencê-lo da indisposição de trabalhar naquele dia.

— Meu amor, se quiser, fico aqui cuidando de você.

— Não! — respondeu ela, rápido demais, forte demais. Precipitada! Tentou se justificar: — Imagina! Não quero atrapalhar você. É só um resfriado, acho — disse ela, afrouxando a voz. — Uma dorzinha de cabeça e um pouco de tontura não poderão atrapalhar o seu dia. Pensei, é melhor eu ficar em casa mesmo, vou me alimentar direitinho, prometo, do jeitinho que você sempre me cobra. Acredite, em algumas horas á estarei melhor.

Sorria, May. Sorria!

E ela sorriu, desejando livrar-se do marido o mais rápido possível.

Ele a fitou. O receio veio quando aqueles olhos verdes, incrédulos, pousaram nela.

— É sério. Pode ir. Ficarei bem — insistiu ela.

Como escrever, matar e publicar [Vencedor do Wattys2020]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora