Capítulo 2

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II

No começo, ambos os Ainur viveram ao relento. Mas logo com seus poderes mágicos eles puderam construir rapidamente uma casa de pedras no meio de um bosque - uma casa simples, rústica como a dos Edain, nem se comparando a todos os suntuosos salões de Angband onde outrora residiram.

Após o final do período de luto, Mairon simplesmente levantou a cabeça e seguiu em frente. Começou a pensar num plano para reconstruir o reinado da escuridão, e isso não era trabalho para alguns dias ou anos. Era trabalho para eras. Os homens e elfos ainda tinham Angband como uma memória muito fresca em suas mentes, e fazer algo agora só ia estragar tudo.

- Temos de esperar várias gerações de homens passar - disse ele a Moriel - os elfos ao final de longos períodos de tempo também esquecem o que acontece, embora não com tanta facilidade. Mas o espírito deles arrefece; mais rápido que o dos ainur pelo menos.

Moriel assentia com a cabeça. Realmente ele era da opinião de que um trabalho mais longo porém seguro e certeiro era melhor do que pura e simples ação apressada sem resultado.

- O que pretende fazer portanto, meu pai?

- Vamos viver aqui no meio do bosque, observando aos Edain. Os Eldar não, ainda não. Os Edain são mais ignorantes e nos tolerarão com mais facilidade. Temos de ver como eles são... para usar isso contra eles mais tarde.

- Mas nós não passaremos por Edain. Nós somos mais altos, mais belos...

- Sim, meu filho. Mas não precisamos passar por Edain, e sim tão-somente por... seres que estão aqui vivendo na floresta. E pronto. É só não provocá-los e eles não virão contra nós.

No entanto, os planos de Mairon sofreram um revés logo no começo. As hostes de Valinor ainda não haviam todas partido, e um grande ajuntamento bélico, liderado por Eonwe, ainda se encontrava nos arredores, como que procurando por antigos servidores de Morgoth. Ora, da primeira vez, em que arrasaram Utumno, eles deixaram escapar muitos - Mairon incluso - e a fortaleza fora reerguida. Se desta vez deixassem passar alguns mais fortes, poderia haver desastrosas consequências.

Mairon observou aquele grupo do meio da mata fechada e praguejou baixo, por entre os dentes:

- Estes filhos da puta...! Ainda estão aqui! Ah, mas eles vão ver...!

Imediatamente chamou a Moriel, o qual fazia alguma coisa dentro de casa, e o fez vir a si.

- Meu filho, tomemos formas sofridas e cansadas. Tiremos estas joias e fiquemos apenas com uma simples túnica. Está na hora de falar algumas coisinhas com o embaixador de Manwe... mas deixe que eu faço! Você fica quieto, só me escutando. Finja ser meu criado.

Ao ouvir aquilo, Moriel sequer se surpreendeu. Era quase pura razão, então apenas pensava em resolver a situação e não se lamentar ou se deixar chocar por ela.

Como Moriel tinha hroa encarnado e não podia mudar de forma, apenas mudou a roupa e bagunçou os cabelos. Já Mairon tomou a um rosto com fundas olheiras, aparência inocente no semblante e colocou roupas que eram quase andrajos.

- Não vamos até eles. Deixemos que eles nos encontrem. Vamos ficar aqui nesta clareira, fingindo estar profundamente pesarosos.

E assim foi. Mairon fingiu lágrimas e Moriel, o qual sequer chorara quando tivera de fugir de Angband, simulou um pesar que não sentia. Não muito tempo depois, Eonwe apareceu na clareira com sua hoste. Mairon agiu como se estivesse surpreso; como se não soubesse que se acercavam dali.

- Oh...! Meus senhores, estão aqui?

- Você se não me engano é Sauron Gorthaur, aquele que é ninguém menos do que o segundo em comando de Morgoth.

O filho da escuridãoWhere stories live. Discover now