8. A ave ladina

29 2 0
                                    

Depois de alguns coelhos, bem maiores do que Flippo havia visto, e aves de rapina, a maioria com cores em tons de marrom, encaçapados na carroça os meninos prosseguiram com a viagem.

- Grunny – disse Flippo com o corpo estrebuchado no banco de madeira – parece que vai chover.

O mago pulou de onde estava sentado e ficou procurando as rédeas do cavalo, começando a resmungar repetitivamente:

- O QUE? Chuva não, chuva não, chuva não...

- O que foi? Você não gosta de chuva?

- Eu odeio! Ainda mais quando tem trovão!

- Ah. Mas, olha que estranho, tem uma nuvem encobrindo a carroça, enquanto mais adiante o sol ainda está refletindo no chão.

- Deve ser só uma nuvem, por sorte chegaremos antes que comece a chover, por favor... por favor... chuva não, chuva não!

Flippo ergueu a cabeça para cima da carroça identificando o que estava causando essa sombra repentina. Asas enormes cobertas de penas acompanhavam o movimento do transporte guiado pelos dois cavalos.

- Gru...Grun..ny acho melhor você ver isso aqui. - dessa vez Flippo se aproximou do mago e começou a gaguejar puxando a túnica do outro garoto.

- O que é?

- Olhe pra cima... tem... tem... algo sobrevoando por cima da gente..

- Oh! Não acredito! Parece ser um grifo montanhês! - respondeu o mago ao elevar seus olhos para o alto.

- Ele é p..pe..perigoso? - perguntou Flippo tentando se esconder embaixo do banco de madeira.

- Ah, sim, principalmente quando está com fome ou caçando jóias preciosas, Grifos adoram jóias.

O veículo continuava sendo puxado pelos cavalos, sem o controle dos meninos. Flippo estava encoberto pelo banco de madeira e o animal que os sobrevoavam ganhou velocidade fazendo um looping no céu para o lado. A sombra que os encobria se desfez.

- Ele foi embora? - perguntou Flippo deixando o esconderijo.

- Ainda não, voltou para trás. E... está ... mergulhando! CUIDADO!!

O enorme animal, com a parte da frente de seu corpo como águia e a parte de trás como felino, estava com as asas entreabertas investindo num mergulho rasante sobre a carroça.

- Vamos caiiiiiirr! - gritou Flippo em desespero.

O animal atingiu a parte de trás da carroça fazendo-a chacoalhar, o que fez os cavalos aumentaram a velocidade. Os dois meninos apoiaram-se nos cantos se segurando para não caírem.

Flippo pegou uma de suas bestas de mão e foi armando-a com uma seta.

- Onde ele está? - gritou Flippo.

- Não sei! - respondeu Grunny fazendo esforço para se segurar.

Os cavalos relincharam e viraram com enorme velocidade desviando da imensa ave que pairou no ar em frente deles, de asas abertas.

- Grunny você está bem? - Flippo foi até o outro lado da carroça onde o mago tentava se segurar, quando abaixou sua cabeça não viu mais o outro garoto.

- Sim... sim... aqui atrás! - Grunny ergueu-se por entre as sacolas, encoberto na carroceria.

- Faça alguma magia! Ele está voltando! - berrou Flippo tentando se equilibrar e manter a mira na criatura.

- Não atire! Vai ser pior! - Grunny não conseguia se levantar, ficava se revirando por entre os embrulhos – jogue a caça para ele! Ele deve ter sentido o cheiro.

Flippo procurou o cesto com os animais mortos e vendo o Grifo retornar pelos céus na direção onde estavam, arremessou duas caças pequenas que haviam juntado.

A ave parou cheirando os animais no solo e os engoliu de uma vez. A carroça se distanciou por um instante.

- Ele foi embora? - perguntou Grunny enquanto Flippo o ajudava a se levantar.

- Ficou para trás.

- Se você machucar um grifo, que é uma criatura muito orgulhosa, ela não vai descansar até matar quem a feriu, não vamos conseguir derrotá-la com nossos recursos, embora ele pareça ser jovem, pelo seu tamanho, é muito forte!

O grunhido atordoante vindo atrás deles alertou os garotos de que a ave felina estava de volta. Dessa vez o voo foi rasante em direção aos dois, quase os acertando com suas garras.

Ao se levantarem do assalto, perceberam que a criatura havia se equilibrado entre os cavalos e a parte da frente da carroça, ficando com o bico bem acima deles.

Imediatamente, os dois congelaram, os olhos arredondados e selvagens da criatura estava sobre eles.

- Não se mexa, não se mexa – sussurrou Grunny enquanto se encolhia em suas vestes.

O olhar da ave pareceu medir os garotos e então, quando viu que estava no controle, seguiu para o interior da carroça, onde passou a vasculhar com seu bico. Ela jogou para fora o alçapão com os animais caçados, enquanto os meninos se espreitavam entre suas asas, não conseguindo ver o que a criatura estava fazendo.

Quando seu bico voltou por entre eles a ave estava com uma pele amordaçada. Flippo identificou sua manta de urso onde havia escondido uma das gemas que havia ganhado junto com o baú de sua mãe.

- Hey! Isso é meu! - o garoto elevou seus joelhos, mas voltou a sentar quando a ave o encarou com a boca amordaçando sua manta.

A ave piou rude para Flippo e foi se elevando da carroça abrindo suas asas. O garoto magricelo ficou entristecido ao ver uma parte de seu tesouro estar sendo levado tão estupidamente de si. Seu coração disparou em seu peito e sua cabeça ficou pesada, a ave estava flutuando sobre a carroça e sem pensar em nada mais, Flippo impulsionou-se da base em que estava apoiado e se jogou para o bico da grande criatura agarrando a manta que o animal estava mordendo.

O jovem Grifo começou a piar elevando-se ainda mais do chão e Flippo enfurecido respondia aos ataques.

- Isso é meu! Foi minha mãe quem me deixou!

- FLIPPOOOO! - Grunny gritava vendo o amigo se distanciar.

Enquanto os dois se chacoalhavam no ar a pedra que estava enrolada na manta se soltou, um brilho transparente aterrissou no chão abaixo deles. A ave mirou o brilho e se atirou nele, ainda segurando a manta em seu bico, onde Flippo se apoiava.

Os gritos do menino aumentavam enquanto a ave parecia colidir no chão. Duas mãos pequenas e desajeitadas envolveram o garoto o agarrando firmemente, logo ele foi puxado para a carroça a contragosto.

- Devolva minha pedra! - gritou distante da ave.

Com os olhos enfurecidos Flippo arremessou uma sacola ao chão que pegara sem ver, da parte traseira da carroça. Grunny lançou os braços da pedra circular, com que salvara o garoto e pegou o item arremessado, antes que caísse ao chão.

- Que droga! Essa fera ladra! - vociferou.

As Aventuras de Flippo e o Trinustempus Where stories live. Discover now