A verdade sobre a "Verdade"

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       O caminho para a verdade é "estreito" -no sentido de que é puro, não no sentido de que suas opções são limitadas.

  De vez em quando, nos deparamos com situações potencialmente desagradáveis ou mesmo perigosas. O exemplo clássico éconvidar um alcoólatra em recuperação a se juntar com pessoas  que bebem muito. Naturalmente, às vezes somos obrigados afreqüentar reuniões de colegas de trabalho, mas uma boa desculpa pode nos tirar de praticamente qualquer situação. Mesmoassim, muita gente não se permite utilizar essa opção porquetem uma definição radical de honestidade.

  Qual seria a resposta "honesta" a um convite desse tipo: "Não,não irei porque você e seus amigos se embebedam e se tornamtão chatos que eu poderia voltar a beber de novo. Caso vocêsnão saibam, sou um alcoólatra em recuperação." Será que essetipo de sinceridade aumenta a consciência de alguém? A franqueza total pode ser considerada uma qualidade nos dias de hoje,mas, na verdade, quando as pessoas dizem "Preciso ser honestocom você", em geral prosseguem com um discurso de ataque,abandono ou traição. 

 Os defensores da "honestidade" não deixam nada intocado.Muitos relacionamentos naufragam antes mesmo de começarporque os dois parceiros pensam que devem confessar todos osatos sexuais que tiveram ou pensaram ter na vida. Observe queessas confissões levam a um desentendimento maior. Elas iludem, não esclarecem.

  A honestidade que vale a pena cultivar diz respeito ao quedizemos, não ao que comunicamos — e, como tal, é mais umaversão da idéia de que a aparência é tudo o que importa. É melhor sermos verdadeiros em relação ao nosso coração do que honestos em relação à nossa disposição. Não passa pela cabeça dospais serem "honestos" quando o filhinho de três anos traz umafolha de papel e diz: 

 — Olha o que eu desenhei!!!

  Eles consultam seu coração, seus sentimentos mais profundos, e dizem: 

 — Ah! Que lindo! Que desenho maravilhoso! Vamos pendurarna parede!

  Esta é a verdade. Os pais estão sendo verdadeiros em relação aoque a criança está realmente pedindo. Não devemos nos prendera um uso muito estreito das palavras. A língua pode espalhar odesentendimento e não a compreensão. Ela fornece o calor, masnão dá a luz.  

  Tenho o hábito de fazer uma caminhada ao anoitecer que meleva até a beira de um riacho onde vive há muitos anos um semteto. Se ele estiver por ali, costuma caminhar ao meu lado. Nossas conversas não fazem muito sentido, mas há uma troca decalor humano, interesse e preocupação que faz com que sejamtão satisfatórias quanto qualquer conversa "inteligente": 

  — Está vendo aquele coelho? Ele está perto de nós porque háum coiote por aí... Terei de me mudar daqui a pouco... Os professores descobriram onde moro, o que significa que a máfiatambém descobriu...!

  Os pais que se concentram no conteúdo literal da comunicaçãoque têm nos dois ou três primeiros anos da vida de seus filhos acabamtendo "conversas" maravilhosas, cheias de guinchos, gemidos, gargarejos, tartamudeios, respirações ofegantes e bolhas de cuspe. Idempara dois jovens apaixonados que se abraçam e olham para as estrelas: o tema de sua conversa pode girar ao redor de qualquer coisa, maseles sabem que toda a comunicação se resume em: "Eu te amo! Eu teadoro! Estou muito feliz porque você faz parte da minha vida!" 

 Quando conversamos com alguém, há o tema das palavras quesão ditas — mas raramente este consiste na verdadeira importância da conversa para quaisquer das partes.


Não Leve a Vida Tão a sérioWhere stories live. Discover now