Eu nao quero me lembrar

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(narrado por Jeon WonWoo)

Respirava pesadamente, não conseguia conter o medo dentro de mim, com certeza meu rosto era um espelho de medo e pavor. Eu não fazia ideia de como meu pai reagiria quando contasse a ele que iria fazer um trabalho de escola e teria de levar dois colegas para casa. Eu sabia bem de suas exigências, havia repetido as mesmas durante todo o processo de mudança. Mas o que eu poderia fazer se tinha que tirar boas notas? Eu não tinha culpa, certo?

Entrei em casa e tratei de ir diretamente falar com ele, não correria o risco de esperar e depois não ter coragem de tocar no assunto. Ele desviou o olhar do jornal e me olhou com desinteresse quando parei a sua frente. Engoli em seco antes de falar, não muito alto.

_Vai ter um trabalho de escola em grupo, e vou ter que fazer em casa com dois colegas, eu posso trazê-los aqui? – falei hesitante, com medo de receber um berro de volta em forma de um belo "não". Mas ele apenas ficou calado por um tempo. O silencio da casa me dando a oportunidade de escutar até os sons externos da mesma.

_Colegas...? – pronunciou a palavra com certo descaso – Da ultima vez que levou "colegas" para dentro de minha casa não deu exatamente certo, não é mesmo? – Engoli em seco ao lembrar, eu não queria lembrar. Não queria lembrar daquilo, quando tudo deu errado por minha culpa – Para um trabalho, e se vierem aqui além de uma vez para este trabalho, eu vou adorar quebrar um osso seu. Não quero mais nenhum tipo de verme por aqui.

Voltou sua atenção ao jornal me ignorando ali, fui em direção ao meu quarto sentindo um pedaço de mim se desintegrando a cada passo. Cada passo era uma lembrança escondida, uma palavra esquecida e pisada por velhos tênis pretos. Joguei minha mochila de qualquer forma no chão ao lado da cama e me joguei na mesma encarando o teto. Eu só queria esquecer, mas por que é tão difícil? Por que é tão difícil esquecer amizades de escola numa cidadezinha pequena? Por que é tão difícil esquecer? Qual a dificuldade de esquecer um rosto, um sorriso?

Eu não conseguia. Mesmo se fosse fácil esquecer eu não iria fazê-lo tão facilmente, afinal quando JeongHan soube de minha decisão quis vir junto comigo, mesmo que isso significasse não vê-los todo dia, significasse deixar JiSoo para trás. Eu não entendia porque ele os abandonara para vir comigo, não entendia porque continuou ali e não voltou mesmo quando tentava afastá-lo diariamente, mesmo me doendo ao tentar fazê-lo. Porque lembrar era doloroso, e olhando para ele eu não conseguia deixar de pensar em cada palavra, olhar, desprezo, sorrisos, tristeza e felicidade.

Eu não queria que ele ficasse aqui para receber a noticia de quando eu finalmente fosse embora de vez. Não queria ser responsável por lagrimas que não as minhas, só queria o tão esperado momento em que as cortinas se fechavam. Levantei-me e segurei meu celular, meu antigo celular. Havia o ligado apenas uma vez desde que fora embora deixando uma vida para trás, quando ainda estava devastado com a mudança, e mal conseguia sair da cama pela falta de motivação que eles me davam todo dia para levantar.

Lembrava-me como se tivesse sido no dia anterior, eu não havia os avisado que iria me mudar. Que iria ter que ir embora, que iria deixar de vê-los. E durante a semana toda eles haviam me mandado mensagens preocupadas. Mas eu não respondi, nem cheguei a ver a grande maioria. Mas das poucas que vi, notei que JeongHan ainda mantinha contato com todos, e tinha contado que não me vira naquela semana. Eu apenas desliguei o celular e não o liguei desde então. Provavelmente nem se lembravam da minha existência atualmente, não adiantaria pensar neles atoa. Eu tinha que esquecer, mesmo que isso não fosse uma tarefa fácil.

Soltei o celular e o guardei novamente, talvez quando terminasse os deveres o ligaria para jogar um joguinho qualquer que eu costumava jogar antigamente. Era bom para passar o tempo, atualmente eu usava apenas um mp3 antigo para não passar o tempo sem nada para fazer. Peguei minha mochila e separei os cadernos das matérias que tinham dever de casa, que por sorte eram poucos. Até ouvir a porta de meu quarto ranger devagar, olhei na direção dela e vi minha mãe com um sorriso singelo.

_WonWoo, meu filho... – Veio ate mim e se sentou ao meu lado passando uma mão em meu rosto carinhosamente – Não dê atenção para o que seu pai diz, ok? Sabe que ele não tem agido muito afetuosamente nesses últimos tempos, mas ele não quis dizer que ninguém era um verme ok? – Assenti para não magoa-la, ela sorriu fraco fazendo com que seus olhos se tornassem fendas. Ao menos posso dormir sabendo que pude fazer alguém sorrir – Então quer dizer que você fez amigos?

_Eu... São apenas colegas mãe – Tentei dizer mais alguma coisa, mas tudo parecia extremamente depressivo ou antissocial, não que eu não fosse. Mas não queria magoar minha mãe. Ela assentiu fraca e se levantou.

_Entendi, mas quando arrumar um amiguinho eu vou querer conhece-lo, tudo bem? – Assenti sabendo que este momento nunca chegaria e ela saiu do quarto me deixando sozinho com os cadernos e os deveres novamente.

Passei a tarde tentando me distrair de todo e qualquer pensamento envolvendo o passado enquanto fazia os deveres, fazia algum outro rabisco ou desenho e escutava musicas. Ate que me cansei de ficar segurando lápis e canetas e me levantei da escrivaninha me esticando no meio do quarto. Resolvi então tomar um banho e dormir pelo resto do dia. Passei uns cinco minutos sentindo a agua quente escorrendo por minha pele, sentindo os músculos se relaxando, ou tentando. E somente quando terminei de me secar que percebi que me esquecera de separar uma roupa, saí do banheiro e fui ate o guarda-roupa vendo ali um conjunto de roupas pretas. Abri a outra parte do guarda roupa e pisquei para afastar as lagrimas ao contemplar o velho suéter amarelo junto de outros suéteres e moletons cinza, brancos e azuis claros. Tantas cores...

Fechei aquela parte rapidamente tomando cuidado para não fazer muito barulho, respirei fundo e peguei um conjunto de moletom preto. Vesti-me e me deitei, ainda eram por volta das seis da tarde, mas eu não tinha porque ficar acordado. E eu já tinha o costume de madrugar mesmo.

Não faria a mínima diferença.

O garoto estranho que usava pretoUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum