TRINTA

52 11 0
                                    

Tadeu faz uma cara feia quando passo o remédio que pegamos sobre sua ferida. É um tipo de pomada em gel transparente e brilhosa, não sei se é o remédio mais indicado para o seu tipo de machucado, mas em sua descrição dizia tudo o que estamos precisando então acredito que funcione. Assim que aplico o líquido cremoso em cima do ferimento ele se contorce em uma posição engraçada e reclama que está ardendo. Só consigo dar risada das caretas que ele faz enquanto tenta se afastar e abana os ombros com as mãos.

— Fica quieto, isso é para te ajudar.

— É mas parece estar só atrapalhando, está ardendo muito. — Ele reclama resmungão e eu só consigo rir de suas caretas.

— Assim você parece até aquela criança danada que mamãe costumava cuidar.

E assim que toco no nome de nossa mãe os sorrisos de segundos atrás se desfazem como fumaça no céu e são acompanhados por um silêncio amargo que se estende por um longo tempo, até que eu já tenha passado o remédio e fechado a ferida com tecidos limpos e macios.

— Pronto, agora é só esperar fazer efeito. — Digo, meio sem graça.

E ele responde apenas com um aceno de cabeça. Me certifiquei de lavar as mãos e ter tudo limpo ao redor para mexer no seu machucado, não queria que a ferida infeccionasse ou algo pior acontecesse, não podemos vacilar. Um simples problema de saúde grave pode causar a nossa morte, dou graças a deus que não fiquei doente enquanto estive aqui.

É tão bom estar limpa, de banho tomado e vestir roupas novas. Nunca passou pela minha cabeça que um banho descente iria fazer tanta falta em minha vida, mesmo tendo vivido em uma família simples, sempre tivemos o necessário e nunca nos faltou nada. Nossos... pais trabalhavam duro para nos dar o melhor que eles poderiam dar, e eu nunca critiquei nada, nunca fui uma criança mimada que reclamava das coisas que tinha, até porque eu não tive esse privilégio nem se quisesse. Sempre fui consciente e me orgulho disso. Fecho os olhos quando Tadeu fecha um curativo sobre minhas duas mãos, a última luta me rendeu grandes machucados. Meu quadril ainda dói do soco que levei e há uma mancha roxa ao redor do lugar afetado, olho para cada uma dessas manchas de roxo e vermelho com orgulho. Os machucados significam vitória, futuramente olharei para todos eles e me orgulharei de todas as lutas que venci, agradecendo por estarem aqui, principalmente os machucados internos, pois esses são as mais difíceis de cicatrizar.

Após contar minha ideia para Tadeu, ele concordou cem por cento com ela. Eu expliquei o que poderia acontecer, que por causa de um plano que tive os guardas foram pega-lo e ele só está aqui por minha causa. Quando disse isso, ele colocou sua mão sobre a minha e tentou me convencer do contrário, eu fingi que concordei, mesmo sabendo que eu estava certa sobre o ocorrido. Minhas escolhas foram responsáveis por todas as consequências, principalmente aquelas que machucaram a mim e aqueles que amo, e nada vai me convencer do contrário.

...

Envolvo meu irmão em um abraço antes da breve despedida. Não há ninguém procurando por ele agora, ele não está ameaçado de morte e não há motivo para jogador algum machuca-lo. Posso até dizer que é mais seguro que fique longe de mim, mas isso é por pouco tempo, somente até que meu plano seja concluído. E eu sinto que esse pode dar certo. Deslizo minhas mãos de seus ombros até as costas de suas mãos quando o solto.

— Você vai ficar bem, não vai? — Ele pergunta, preocupado.

Concordo com a cabeça.

— Tome cuidado.

— Você também — Ele diz.

E partimos para lados diferentes.

A CAÇA - OS ESCOLHIDOSWhere stories live. Discover now