27 ¶ Visita

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Vida.

Sempre uma tarefa árdua pensar sobre ela.

Às vezes, abrir os olhos era o ato mais doloroso que eu fazia. Entende o quão difícil é isso?

Abri os olhos como quem não esperava nada além de avistar o conforto do lugar onde por tanto tempo dividi recordações. Mas o que encontrei foi um teto branco e mórbido. O silêncio que me sondou era quase ensurdecedor. A paz, tranquilidade, tudo me abraçou de forma prazerosa, confortando o buraco profundo no meu peito. Me permiti ficar — aonde quer que eu estivesse — em silêncio. Não queria que nada fosse capaz de interromper aquela paz que me abrangeu. Estava bom.

Levantei-me da cama ao notar os aparelhos hospitalares. Caminhei até à porta, tirando os fios que me conectavam a eles, os bip bip bip ecoaram alto. Abri à porta, ignorando meu subconsciente que me aconselhava a continuar deitada. Encontrei um corredor cheio de portas, macas vazias escoradas nas paredes, bancos lotados de pessoas, enfermeiras andando de um lado para o outro, e médicos conversando um pouco distante.

Tentei recordar dos últimos momentos antes de fechar os olhos, não por querer, e sim por precisar. A linha tênue que separava o desespero da sanidade era um paradoxo com o qual obriguei-me a conviver. Eu precisava me recuperar de toda a bagunça que Connor tinha causado aqui dentro e do caos que havia deixado em mim. Honestamente, nunca nem foi totalmente apenas culpa dele, mas pensar em culpar outro alguém... seria mais cansativo.

Chorei, aliviada por me sentir menos sobrecarregada. Alívio de quem por tanto tempo se fez refém de projeções em que o centro sempre foi Connor. Alívio por saber que as rédeas haviam voltado a mim e de onde, na verdade, nunca deviam ter saído.

Voltei para cama, me deitei sobre ela e deixei que minha mente vagasse pelas últimas lembranças. Olhei para o que vestia, pela primeira vez, percebendo que não era minha calça jeans ou minha camisa cinza de mangas compridas. Usava apenas uma camisola azul hospitalar. Automaticamente meus olhos fixaram-se em meus pulsos. Minhas mãos com curativos recentes.

Não. Não. Não. Não.

A porta do quarto se abriu, me surpreendi por ver Sofia, imediatamente escondi meus pulsos ao cruzar os braços. Não por querer, mas por instintos.

— Você acordou. — constatou o óbvio.

Ela usava uma de suas calças jeans coloridas e uma blusa de mangas compridas floridas cheio de vida. O cabelo solto caído para trás. Uma presilha de flor prendia sua recém franja. Encantadora.

— O que aconteceu? — indaguei com a voz ainda falha. Apesar de lembrar de tudo me sentia confusa.

Sofia se aproximou e sentou ao meu lado na cama. As olheiras abaixo dos olhos denunciaram as noites mal dormidas, e a vermelhidão o choro. Ela sorriu, parecendo contente por me encontrar acordada.

— Você sofreu uma parada cardíaca. — contou. — Mas não tenho permissão para falar disso com você. É melhor deixar que o médico explique.

— Médico? — olhei ao redor, sem mover o corpo. — Desde quando estou aqui?

— Aconteceu muitas coisas, Ame... é melhor você descansar antes de saber tudo. — seu pedido soou mais como uma ordem. — Precisa repousar um pouco mais.

Suspirei, estranhamente exausta. Encarei o teto.

— Tudo aconteceu mesmo? — perguntei, fazendo uma oração interna para que tudo não tivesse passado de um pesadelo.

Sofia encolheu os ombros. Ela não tinha mais aquele ar determinado e cativante. O sorriso que forçava me dava a certeza que estava tentando soar forte quando, na verdade, queria desmoronar. Foi ai que me dei conta de que eu era tão tóxica quanto Connor. Nós dois destruíamos tudo, mesmo sem querer.

Como Não Te Amar? (REPOSTANDO)Where stories live. Discover now